P
e. J O S É M A R I A
J A K O B S
1º Vigário de Blumenau
(1876-1892)
Pe.
Eloy Dorvalino Koch scj
Tradutor
([1])
Um missionário e pastor de almas, já
falecido, e que muito havia trabalhado no Brasil Meridional, em certa ocasião,
assim falou: “Felizes os colonos católicos de Santa Catarina. Porquanto, desde
o início, puderam contar com sacerdotes zelosos e virtuosos".
Os leitores do Wegweiser
(Indicador de Rumo) já tomaram conhecimento de Guilherme Roer: o padre
sempre disponível; de Carlos Boegershausen, o valoroso padre e
professor; de Alberto Gattone, o padre piedoso e mortificado. Pois agora
chegou a vez do Pe. José Maria Jakobs. Por 16 anos, ele serviu a
Paróquia de Blumenau. E justo à época de numerosa imigração de tiroleses,
italianos e poloneses. Com eles, alterava-se a paisagem colonial; e a pastoral
se acumulava de novos, de muitos e pesados encargos.
É como se a Divina Providência tivesse
tido o propósito especial de, em 4º lugar, enviar o Pe. José a Santa Catarina.
Porque ele reunia, em sua pessoa, essenciais prerrogativas dos acima referidos
sacerdotes: era de pastoreio bom e prático; habilidoso como professor e diretor
escolar; e uma pessoa devotada a Deus com alma simples e piedosa.
A origem do Pe. José está na Renânia.
Nasceu em Aachen, no ano de 1831. Eram três irmãos sacerdotes. Pe. José foi
ordenado em 1854. Assim que concluiu os estudos, foi escolhido para Capelão de
um Castelo e educador dos filhos do Duque de Montpensier. Nessas condições, em
companhia de seus educandos, esteve em quase todas as cidades maiores da
Europa, notadamente nos países mais ao Sul. Oportunidades que lhe valeram bons
conhecimentos em vários idiomas.
Foi provavelmente em 1860, que Pe. José,
na qualidade de Missionário e Cura d'Almas, se dirigiu para a América do Norte,
onde permaneceu 16 anos. Em fevereiro de 1876, encontrava-se em Roma.O Santo
Padre, o Papa Pio IX, concedeu-lhe
uma audiência, na qual lhe deu a missão de pastorear os abandonados católicos
da Colônia de Blumenau.
Ora, o desejo do Pastor Supremo da
Igreja era-lhe uma ordem. Logo concordou, e animado da melhor boa vontade. O
Santo Padre lhe deu de presente uma fotografia
sua. Pe. José anotou, em baixo, o pedido de uma bênção ao Papa: pelo bem-estar
de si mesmo e de sua futura Comunidade. Pio IX apôs a sua assinatura. Para o Missionário, uma grata lembrança, que o acompanhou
para Blumenau. Um pouco envelhecida e amarelada pelo tempo, a foto continua
afixada com esmero na sacristia da Igreja. Eis o texto em português:
Santíssimo Padre,
O Sacerdote José Maria Jakobs,
ao preparar a sua viagem para o Brasil,
com o fim de evangelizar os pobres, pede,
aos pés de Vossa Santidade,
a Bênção
Apostólica, para que,
como bom pastor, possa congregar,
com zêlo incansável, as ovelhas errantes;
e para que, com caridade paternal,
possa apascentá-las e, com elas, um dia,
chegar feliz aos prados celestes.
Pe. José Maria Jakobs, 1º
Vigário de Blumenau.
Cópia fiel e recente da foto original. Cf.
nota nº 5.
O Papa concluiu:
A 1º de fevereiro de
1876.
Deus vos abençoe.
Pe. José fez uma visita à
sua terra natal Aachen, onde encontrou-se com sua irmã, agora Senhora Gülpen, e
os seus dois irmãos sacerdotes, que haviam voltado
das missões.
A seguir, o enviado do
Papa viajou para o Rio de Janeiro, onde travou amizade com o padre lazarista
Hehn: o protetor de todos os alemães que lá chegavam. Esse Padre também era o
amigo fiel e, por algum tempo, o pastor de almas dos colonos alemães de
Petrópolis que, em seus lares, guardavam, com muito carinho, a sua fotografia;
e que, a seu respeito, muito de bom tinham para contar.
Em companhia do Pe. Hehn,
Pe. José fez uma visita às Autoridades Eclesiásticas e aos altos Funcionários
do Ministério. Até chegou a conhecer membros da Família Imperial. Em toda parte
deixava a melhor das impressões. Porquanto, com a sua dignidade sacerdotal
emparelhava a sua fina cultura no relacionamento. Também a sua destreza no
domínio de várias línguas lhe dava condições de comunicar-se, com facilidade e
agrado, com toda pessoa culta.
Por várias vezes ouviu, a
seu respeito, a proposta de permanecer na Capital do País, e aqui exercer a
missão sacerdotal. Ao que era invariável a sua resposta: “O Santo Padre me
designou para a Colônia de Blumenau; é lá que irei trabalhar, enquanto as
minhas forças o permitirem”.
Pe. Hehn acompanhou o
confrade até o navio que o levaria a São Francisco do Sul, e insistia que lhe
enviasse mais vezes notícias com relação às suas atividades. Também se colocava
a seu dispor para quanto necessitasse da Capital
do País. E foi assim que se firmou entre ambos um belo relacionamento
sacerdotal. Não se tratava somente do útil e do necessário. Pois fluíam entre
eles edificantes e consoladores pensamentos, a brotarem do belo ideal
sacerdotal plantado em seus corações.
Lá para o final de julho,
Pe. José chegava a Joinville, na casa do Pe. Carlos Boegershausen -, aliás,
segundo a determinação do Senhor Bispo. O Vigário de Joinville, com sua larga
experiência, devia dar-lhe bons conselhos, prestar-lhe ajuda ao novo Vigário
de Blumenau.
Pe. Carlos vinha de ser,
por dois anos, o Pastor de Blumenau. Tendo, pois, condições de passar boas
informações ao seu sucessor, e protelou-lhe a viagem até o dia 15 de setembro.
Porque antes dessa data, a casa paroquial não poderia estar concluída.
Enquanto isso, Pe. Jakobs
aperfeiçoava os seus conhecimentos da língua portuguesa; e passadas três
semanas, ele substituiu o Pe. Carlos na direção da Paróquia. E o Vigário
aproveitou fazer uma viagem mais longa, até a região da mata de Guaratuba.
No dia 15 de setembro,
Pe. Jakobs partiu de Joinville. Via fluvial, chegou a São Francisco, e dali a
Itajaí. No dia 16, chegava a seu destino: a Paróquia de Blumenau.
1. O
Assentamento Colonial de Católicos em Blumenau
Dr. Hermann Blumenau: eis o Fundador da
belamente desenvolvida Colônia. Era o Doutor um homem valoroso, organizado e empenhado
sem medir sacrifícios. Merecedor, portanto, da mais elevada consideração.
Católicos, segundo parece, ele
conheceu poucos; e sacerdotes, somente através de jornais e caricaturas.
Quando, nos primeiros anos de suas atividades no Itajaí, ele voltava do Rio de
Janeiro para o Sul, um padre católico era seu companheiro de viagem. O que lhe
significou uma circunstância importante. A ponto de comentar largamente em
carta a Tschudi (fins de 1858), e em termos nada amáveis.
Nos primeiros dez anos (1850-60),
poucos católicos entraram na região colonial. Não foram distinguidos por
assentamentos que agrupassem os católicos. Faltava-lhes toda e qualquer direção
espiritual. A estatística de 1863 acusa 1925 protestantes e 326 católicos.
Na altura de 1870, moravam no
Centro Urbano, incluindo Bom Retiro, 539 protestantes e 61 católicos. Entre
eles já se contavam 6 casamentos mistos.
Em Garcia e
Jordão: 95 católicos e 376 protestantes.
No Rio Itajaí:
nas duas margens, 347 católicos e 1091 protestantes.
No Rio Testo:
nas duas margens, 160 católicos e 935 protestantes.
Na Itoupava: nas
duas margens, 99 católicos e 570 protestantes.
No Encano: nas
duas margens, 45 católicos e 210 protestantes.
Em outros vales:
nas duas margens, 17 católicos e 1035 protestantes.
Ao Todo: 832 católicos e 4756 protestantes.
Ao depois, o aumento da
população foi êste:
Em 1870: 8 católicos e
25 protestantes.
Em 1871: 0 católico e 23
protestantes.
Em
1872: 14 católicos e 193 protestantes.
Em 1873: 29 católicos e 397 protestantes.
Em 1874: 92 católicos e 270 protestantes.
Em 1875: 859 católicos e 270 protestantes.
Em 1876: 817 católicos e 261 protestantes.
Em 1877: 208 católicos e 162 protestantes.
Facilmente se explica o repentino crescimento numérico de imigrantes
católicos de 1875 a 1876. É que chegaram, em grande quantidade: tiroleses,
italianos e poloneses -, todos eles católicos. E foram instalados com
critérios sensatos: recebendo regiões distantes, cobertas de mata virgem, e
retiradas da estrada principal. De sorte que moravam em assentametos fechados.
Os católicos de língua alemã foram, assim antes como depois, assentados
dispersamente. Várias dessas famílias deixaram Blumenau, porque não tinham como
conseguir doutrina católica para os seus filhos, e porque a capela ou a igreja
ficava muito distante. Tais "emigrantes" agora se estabeleceram na
estrada principal entre Teresópolis e Lages; outros adquiriram propriedades de
terra no Planalto; outros ainda foram de muda para Braço do Norte (Tubarão).
Quando Pe. Jakobs estava para vir a Blumenau, a igreja paroquial ainda se
achava em construção. Aos 20 de setembro de 1868, já se havia lançado a pedra
fundamental. O Vigário de Gaspar, Antônio Zielinski, celebrou a missa festiva.
Na ocasião, foram nomeados membros da Diretoria da Igreja os Senhores: 1º Francisco
Bader, de Weihen, no Grão Ducado da Badênia. 2º João Fellhauer, de Malsch, de
lá mesmo; 3º João Wloch, de Zettewitz, Distrito de Grau, no Reino da Prússia.
Alguns dos imigrantes tiroleses
trabalhavam como serventes de pedreiro, ou pedreiros, na construção da
igreja. Mestre-de-obras era Gustavo Kriek; arquiteto autor do projeto, era João
Krohberger. O econômico Dr. Blumenau riscou-lhe, na planta, a bonita e esguia
torre, e mandou erigir uma torre menor. Em 1929, esta foi demolida e substituída
por uma torre mais alta, com seu relógio e campanário de sinos novos, cuja
inauguração teve lugar aos 16 de fevereiro de 1930.
A casa paroquial situava-se junto à Rua principal, e separada por um jardim.
O terreno da Igreja continuava, do outro lado da Rua, até próximo ao rio.
Terreno que media 150 m de largura por 250 m de fundo. O rio e a Rua formavam,
na frente, uma curva. De sorte que a linha limítrofe leste era mais curta que a
oposta.
Foi muito bem escolhido o local para a igreja. Uma escadaria de 44 degraus
largos conduz da Rua à praça da igreja; e a 5 m afastados do degrau superior,
ergue-se a construção que, na época, media 11 m de largura por 20 m de
comprimento. Ainda assim, domina a cidade. A nave da igreja só media 14 m até o
banco da comunhão. Todos os trabalhos foram executados muito bem e com solidez.
A pouca distância da nova igreja paroquial, situava-se a capela de madeira,
construída em 1866. Daqui seguia uma vereda por duas pequenas colinas até a
casa paroquial.
Em 1876, a região habitada da Paróquia tinha, de leste a oeste, 40 a 50 km,
com uma estrada mais ou menos bem trafegável. Daqui seguiam para o Sul vários
caminhos coloniais de 10 a 20 kms; para o Norte, havia os caminhos na direção
dos vales do Itoupava e do Testo; e dos vales do Benedito e do Cedro que, em
parte, eram carroçáveis; e alguns, tal como o caminho do Testo, tinham mais de
20 km.
Enfrentando estreitas e sofridas veredas, tiroleses, italianos e poloneses
penetravam nas matas virgens a eles destinadas. De sorte que a região paroquial
se dividia em dois Distritos consideravelmente diversos. Isto é, na
Colônia Antiga: o progresso no atinente a comércio, estradas, pontes e
propriedades agrícolas com suas construções e cultivos -, tudo habitado por
camponeses e artífices de língua alemã.
E a infeliz distribuição dos católicos no Distrito de assentamentos
distantes e dispersos, com muitos casamentos mistos, e na impossibilidade de
fundarem associações escolares. A despovoada colônia para tiroleses, italianos
e poloneses ainda era mata inacessível. Nada obstante isso, a atuação do Pastor
era aqui mais fácil e gratificante, porquanto, graças à cerrada convivência,
estavam garantidas a escola e a igreja. Só que o trabalho exigia mais
sacrifício físico e atenção.
Os católicos de língua alemã suportaram, por muito tempo, orfandade espiritual.
O casamento misto levou alguns a esfriar na Fé; ou os levou, aos poucos, mas
seguramente, à perda completa da Fé. Em seus costumes, foram distanciados de
sua Religião. Ainda hoje persistem modos de falar que não têm fundamento católico.
Assim, alguns católicos que vivem em meio protestante e em lugares isolados,
falam assim: “nosso filho foi confirmado", isto é, fez a primeira
comunhão.
2. Sua 1ª Atividade em Blumenau.
Aos 16 de setembro de 1876, deu-se a chegada do Pe. Jakobs em Blumenau.
Dirigiu-se à casa paroquial, mas ainda inacabada. Até 7 de outubro, teve que
morar no hotel.
Sua nova residência (casa paroquial) era uma construção pequena: media 7 m
de comprimento; tinha 2 janelas para o lado da Rua na parte interna, dois quartos,
uma sala e um quarto de dormir; depois vinha a cozinha: de 7 m de comprimento
por 3 m de largura, e nesta, uma escada que conduzia à dispensa; no lado voltado
para a igreja, havia um bem pequeno alpendre com dois assentos.
Daqui, por um caminho com degraus, chegava-se ao alto da colina junto à antiga
capela de madeira; com mais uma subida, alcançava-se o alto de uma 2ª colina,
com a sua igreja paroquial.
Entre a Rua Principal e a casa paroquial abriu-se uma valeta, que muito se
aprofundava na altura da encosta da igreja. Nessa valeta cresciam goiabeiras. E
quando os garotos lá subiam para apanhar frutas, podiam avistar a Rua.
Dentro em breve, Pe. Jakobs fez uma visita ao Diretor da Colônia: o Dr.
Blumenau. Defrontaram-se dois caracteres bem marcantes, mas radicalmente
diversos.
É difícil dizer quem deles teria maior força de vontade. Também eram iguais
em termos de cultura e conhecimentos da vida.
Pe. Jakobs, de sangue renano, era mais impulsivo e resoluto em suas ações,
mas sincero na comunicação; ao passo que Dr. Blumenau era mais reservado e
ponderado, e cuja determinação se convertia em teimosia. Era impossível esses
dois Senhores concordarem em tudo. Mas sempre guardaram o respeito mútuo.
Logo entraram em assunto comercial. Pe. Jakobs pedia indenização pelo tempo
que passara no hotel. Também desejava se construísse uma sacristia em anexo à
igreja paroquial. Proposta que ao Diretor da Colônia não lhe parecia plausível.
Para a igreja protestante, alegou, não se previa uma sacristia. Daí por que
também a igreja paroquial deveria abrir mão dessa exigência. Da troca de
correspondência entre ambos, deduzia-se que Dr. Blumenau pouco entendia do que
seria importante para a igreja católica. Pe. Jakobs então mandou construir a
sacristia sem autorização.
Aos 11 de maio de 1876, o antigo Vigário Pe. Carlos Boegershausen esteve
pela última vez em Blumenau. Já no dia seguinte à chegada do Pe. Jakobs, os
tiroleses, em parte ainda residentes no rancho de imigração, bem como os poucos
moradores católicos do Centro Urbano - vieram para assistir à santa missa. E foram
batizadas sete crianças tirolesas aqui nascidas.
De 24 para 27 de setembro, Pe. Jakobs esteve na Capela São Bonifácio do
Encano. De distantes arredores, os fiéis acorreram para conhecer o seu novo Pastor.
E Pe. Jakobs resolveu pregar a sua primeira missão nesta localidade, porque
aqui, num espaço não demasiado grande, os moradores católicos eram um pouco
mais numerosos que em outros lugares. E pondo mãos à obra, fazia, desde já, o
convite para os dias 4 a 11 de novembro.
Nos dias 28, 29, 30 de setembro e 1º de outubro, o Vigário visitou a Capela
de S.Francisco Xavier, no Rio Morto, onde Maneca Salvador era sacristão e
capelão. Depois disso, passou três dias em Rodeio. Na mata virgem desta
colônia, na casa de Antônio Moser, Pe. Carlos Boegershausen havia celebrado a
1ª missa no dia 7 de maio do referido ano, pois ainda não havia capela. A
partir de Timbó, o caminho anterior seguia Benedito acima, passando pela
colônia alemã, que não era católica.
Do nº 12 em diante, começavam os lotes tiroleses, comunicados mediante
picadas pelo mato. Os vizinhos tinham construído os seus ranchos bem próximos
entre si, para defesa contra onças, que apareciam numerosas. No lote nº 100,
uma onça penetrou no rancho de palmitos, pegou o cachorro e o devorou debaixo
da cama de estacas, sobre a qual dormia a filha. Nos lotes 43 e 97, as feras
vieram até aos ranchos, mas foram mortas.
Pe. Jakobs apeou no lote 74, de Manfrini. Houve grande assistência à santa
missa, porque as 120 famílias católicas, por sinal de prole numerosa, enviaram
seus representantes. O Vigário concordou em visitá-los regularmente a cada três
meses. Também entrou em acordo com eles no sentido de se preparar, mais acima,
um local apropriado para uma futura Capela. De sorte que os colonos erigiram,
no nº 84, uma cruz, e abaixo dela, um oratório com altar. O confessionário foi
instalado debaixo de uma figueira grande. Aqui Pe. Jakobs celebrou as missas de
suas visitas, desde novembro de 1877 até o final de 1878.
No dia 5 de outubro estava de volta na sede paroquial. Dois dias após,
inaugurava o seu pastoreio oficial, e podia instalar-se domiciliarmente. A
seguir, foi tomar conhecimento dos católicos moradores ao longo do Rio Garcia.
Eram ao todo 120. Residiam eles 8 a 15 km distantes do centro urbano, e
bastante dispersos nas duas margens do rio, e no Jordão e no Caeté.
A Capela de Maria Auxiliadora, no Badenfurt, o Vigário a visitou nos dias
15 e 16 de outubro.
Na Capela de São Ludgério, no Testo Alto, a 35 km da Igreja Paroquial -,
ele esteve no dia 17 de outubro. A todos convidava a participarem das missões
que haveria no Encano.
Nos dias 24 e 25 de outubro, o Pe. Vigário esteve com os tiroleses na Estrada
da Pomerânea, também ainda sem Capela. Todos os tiroleses, anteriormente
mencionados, falavam italiano, embora em seu dialeto. Os italianos quase que
chegaram simultaneamente com os tiroleses, e se estabeleceram no Rio dos Cedros,
em São Pedrinho, Ascurra e São Paulo.
A Estrada da Areia, a Estrada do Barão e a do Ipiranga foram ocupadas por
famílias polonesas.
Partindo de Blumenau, Pe. Jakobs também procurava contatar as famílias
católicas que moravam isoladas ao longo das duas margens do grande rio. Durante
conversas com as famílias, o Padre procurava descobrir a razão de os católicos,
de modo tão estranho, se haverem domiciliado de modo tão disperso. A resposta
foi fácil: as pessoas não tinham quem as orientasse. Devido à longa viagem,
estavam cansados; e com a chegada a Blumenau, estavam muito felizes, por terem
alcançado a meta. De modo que, docilmente, foram aceitando as propostas do
Diretor da Colônia: a eles apresentado como um homem sério e benevolente.
Alguns dos imigrantes católicos haviam-lhe pedido que os lotes a eles
vizinhos fossem reservados para seus futuros parentes imigrantes. Mas quando
estes chegavam, a terra já havia sido distribuída a outros.
José Wamser, ainda vivo em 1931, conta-nos o seguinte: Seis famílias
católicas- Kratz, Geissler, Schwartz, Plodeck, Wartha e eu- procedentes da
Bahia com nossos familiares, chegamos ao mesmo tempo a Blumenau, e requeremos
terra. O Diretor encaminhou as famílias Geissler, Wartha e Plodeck para a
Estrada da Areia; a Kratz, Wansen e Schwartz para Rio dos Cedros. Quando os
três últimos chegaram ao Fundão Paus, no Encano, João Tillmann, morador de lá,
pediu que parassem, e perguntou: “Vocês são católicos?” Sim, responderam.
"Para onde vão?" Ao Rio do Cedro. "Não façam isso" disse
Tillmann. "Busquem terra aqui mesmo, neste Fundão, onde quase tudo ainda
continua desocupado. Assim, poderemos ter mais famílias católicas reunidas, e
pensar na construção de uma Capela".
O pessoal deixou a sua bagagem na casa do Sr. Tillmann, e voltaram a Blumenau.
Apresentaram à Direção o seu plano. Dr. Blumenau negou-se a concordar. Mas os
imigrantes, por sua vez, não se deram por vencidos. Finalmente, interveio o
guarda-livros Wendenburg, e falou: “Uma vez que as pessoas querem assim, o
Senhor deveria fazer-lhes a vontade". Foi quando Dr. Blumenau cedeu. E foi
assim que pôde surgir uma Capela no Encano.
3. Missão na Capela São Bonifácio do Encano
(de 4 a 11 de novembro de 1876)
É a missão um meio muito eficaz para reavivar a Fé Cristã. As verdades
eternas vão apresentadas em sequência lógica, e muitas vezes de modo magistral.
Ao que se acrescenta a graça do Espírito Santo, que se une à boa vontade dos
ouvintes e produz valiosos frutos.
De toda parte, os católicos afluíam para o encontro no Encano. Procuravam e
achavam hospedagem nas proximidades junto
a conhecidos, ou alugavam alguma casa dos moradores de lá. Até havia os que se
contentavam com abrigar-se nalgum rancho. O negociante Francisco Schröder, de
Indaial, improvisou no pátio da igreja modesto restaurante.
Pe. Jakobs hospedou-se na casa de João Tillmann, a uns 800 m distantes da
Capela. Pela manhã, após a santa missa, fazia a primeira pregação; pouco após o
meio dia, à sombra de uma figueira grande, fazia às crianças uma catequese
sobre a Santa Comunhão; à tarde, e pela manhã cedo, permanecia no confessionário;
ou ficava disponível ao povo. À noite, tinha lugar uma segunda e prolongada
pregação.
Na sua conferência introdutória, procurou motivar os fiéis para a importância
da missão e para a paz com Deus e o próximo. Bom orador, sabia cativar os
ouvintes. De início, também pessoas de outras confissões gostavam de ouvi-lo.
Tratava por extenso o tema: a Verdade da Igreja Católica, daí deduzindo as
obrigações do fiel católico. Censurava com rigor as fraquezas de certos
católicos que, devido a algumas vantagens temporais, renegavam a sua Fé.
Pregações que despertavam os católicos indiferentes, levando-os a corrigir
as falhas, a contrair matrimônio perante o Vigário autorizado. Crianças já
batizadas em outra Confissão, eram trazidas para a catequese e batizadas na
Igreja Católica.
Pessoas de outras crenças queriam repreender o Vigário. Mas deu-se um
resultado positivo. Porque o Padre aduziu provas, mostrando onde se encontra a
Igreja fundada por Cristo, e como a Igreja Católica tem sua origem nos
Apóstolos. Com isso surgiram reações hostis, que vieram para ficar. Toda vez
que Pe. Jakobs viajava pelo Encano, os irritados tentavam fazer-lhe zombaria e
dirigir-lhe ofensas.
Com os católicos, o Vigário falava seriamente sobre a educação das crianças
e sobre o ensino. Em lugar algum havia escola católica de língua alemã. Por
enquanto, nem era possível fundá-la, porque as famílias moravam demasiado
dispersas. Razão pela qual o Vigário comunicou ao povo católico um plano educacional,
explicando: “Após madura reflexão, concebi o plano de, junto à Igreja
Paroquial, fundar uma escola para os seus filhos. Quero empenhar-me no sentido
de proporcionar aos alunos um alojamento a preço bastante módico. Também não
serão excluídas as crianças pobres. Quero admiti-las e, na medida do possível,
dar-lhes ajuda. Mas vocês, pais, terão de ajudar-me segundo suas
possibilidades. Sobretudo, rezando comigo a Deus, o Doador de todo bem,
porquanto tudo depende da Bênção de Deus: ”Se o Senhor não edificar a casa, em
vão trabalham os que a constroem”.
No dia 11 de novembro deu-se o encerramento festivo da missão. De coração
em festa, os seus participantes voltavam para casa. O Padre voltou a Blumenau,
e em breve teve uma longa entrevista com o Diretor. Abordou os seguintes problemas:
o infeliz e disperso assentamento dos colonos católicos, dele resultando o
difícil atendimento pastoral; e a facilitação dos casamentos mistos: situação
que não favorecia a ninguém.
Os novos inimigos do Vigário também estavam em plena atividade.
Dirigiram-se ao professor O.B.,do Encano, e encomendaram dois libelos, que
foram remetidos ao Presidente da Província: o Visconde
Escragnolle Taunay. O 1º libelo estava assinado por Albert Sch., Andreas M.,
Karl G., Friedrich H., Johann G. e Luise G. O 2º libelo tinha a assinatura de
Johann B., que assegurou aos companheiros: “Iremos amarrar-lhe as mãos e os
pés, e o mandaremos de volta para a Alemanha".
Terminada a missão popular na Capela de São Bonifácio, a Pe. Jakobs cabia
empenhar-se na conclusão das obras da Igreja Paroquial. Pe. Boegershausen, de
Joinville, fôra encarregado pelo Sr. Bispo da inauguração da Igreja, e chegou a
Blumenau no dia 19 de dezembro de 1876. Já no dia seguinte, duas senhoras, que
haviam participado da referida missão no Encano,
foram por ele admitidas na Igreja Católica. Fato que provocou nova animosidade
contra o Vigário.
No dia 24 de dezembro, realizou-se a mui solene inauguração da Igreja. Com a presença do Pe. Henrique Matz, que viera
de Gaspar, foi possível, e pela primeira vez em Blumenau, uma solene missa
cantada, isto é, com três sacerdotes. Também a Festa do Natal revestiu-se de
raro brilho. Até o início do Ano Novo, Pe. Jakobs tratou de por em dia os
Livros Paroquiais.
1ª Igreja-Matriz de Blumenau
inaugurada
a 24 de dezembro de 1876
|
Dos apontamentos constantes do mais antigo Livro-Caixa, pode-se anotar o
seguinte: o 1º Caixa foi Francisco Bader. Aos 16 de dezembro, este entregou o
seu cargo a Xavier Bugmann. Isso ocorreu com a vinda do Pe. Guilherme Römer,
que aqui exerceu as funções de Vigário, de 11 de dezembro de 1869 até o fim de
maio de 1872.
No dia 7 de fevereiro de 1870, Gaspar Braun depositava no Caixa da Igreja
56$000. Dinheiro que ele havia coletado junto aos colonos alemães, desde Gaspar
até Barra do Itajaí. Até 30 de junho de 1879, a Capela rendeu 145$640; as
despesas foram de 109$820, de maneira que restou um saldo de 35$760. Xavier
Bugmann fez o tabernáculo por 7$000; Drechler Zimmermann fez a pia batismal por
30$000; o ferreiro Richter, a cruz sobre a Capela, por 5$860. Como sacristão,
vem citado H. Blasias; que trabalhou de 20 de maio até 31 de dezembro,
recebendo em pagamento 33$500. Da lavação das alfaias estava encarregada Maria
Gamper.
No começo de 1881, João Miguel Schmitz era o Caixa; Augusto Sutter e Xavier
Bugmann, juntamente com o Vigário Guilherme Römer, constituíam a Diretoria da
Igreja. Pouco antes da partida do Padre, Francisco Bader reassumiu a Caixa com
um saldo de 6$220. De Pentecostes de 1872 a julho de 1874, Blumenau esteve,
eclesiasticamente, abandonado. Até setembro de 1876, Pe. Boegershausen visitara
Blumenau por seis vezes. Em tal situação, o Livro-Caixa não podia apresentar
resultados animadores.
Quando Pe. Jakobs, aos 10 de dezembro de 1876, fez o acerto das contas referente
aos últimos 4 anos: só pôde constatar um total de 136$540 de entrada, 118$980
de despesas e 17$780 em Caixa. Augusto Sutter agora assumiu a Caixa por longos
anos.
4. A Pastoral em 1877
Para a futura atividade pastoral, foi de fundamental importância. A imigração
de italianos, tiroleses e poloneses prosseguia pouco numerosa. A maioria das
pessoas já haviam tomado posse de seus lotes, e nos vales dos rios e nos
interiores das matas desenvolviam-se, aos poucos, as comunidades. Pe. Jakobs
visitou onze vezes a Capela do Encano; quatro vezes os novos assentamentos na
Estrada da Pomerânea, do Rio dos Cedros e do Caminho
Tirolez; duas vezes Rodeio; e algumas vezes as Capelas do Rio Morto, Badenfurt
e Rio do Testo (vesfalianos).
Durante esse ano (1877), registrou 169 batizados. Dentre os quais, somente
20 na Igreja Paroquial. Na pequena Capela do Rio dos Cedros, ainda em mata
virgem, fez 39 batizados; e no Encano, 34. Por onde se vê que o "centro de
gravidade" de sua pastoral começava a 20 km a oeste da sede pastoral, e se
estendia em direção a oeste e noroeste. Geralmente, atendia a Igreja Paroquial
em dois ou três domingos por mês; num domingo, a Capela do Encano; e em alguns
dias da semana, as demais Capelas.
Para cada uma das novas Capelas da Mata, o Padre nomeou dois homens de boa
doutrina e de fiel sintonia com a Igreja. Era sua função, dirigir a liturgia
leiga aos domingos e dias santos. Sempre às 9.30 hs, para coincidir com o
horário da missa que o Vigário celebrava na Igreja Paroquial.
Dentre os colonos, também nomeava catequistas. Cabia-lhes, aos domingos,
ensinar a doutrina cristã a crianças de 8 ou mais anos. Em cada visita à
Capela, o Padre examinava os conhecimentos, observava a lista de presença, e
indicava novas tarefas para as semanas seguintes.
O próprio Padre era um mestre em Catequese. Eis um depoimento, a seu
respeito, dado em 1931 por Valentim Frunt, que morreu aos 80 anos: “O nosso
Vigário José era um padre competente. Em suas determinações era claro e curto.
Na pregação, sempre tinha alguma repreensão a fazer. Suas catequeses eram
excelentes”.
Em dado momento, a liturgia leiga não estava satisfatória. Em razão disso,
certo colono, de formação escolar melhor, mais animado e mais hábil no falar,
apresentou-se como pregador em dias de festa. De modo que foi aceitando convites
para, em troca de pagamento, pregar a "sua" palavra de Deus. Foi
assim que fez uma viagem a Rodeio, onde, num dia santo, fez a pregação,
exigindo em pagamento 12$OO rs. Mas Pe. Jakobs proibiu-lho terminantemente. Os
bem intencionados se conformaram; um grupo de descontentes uniu-se mais ainda.
5. O Colégio São Paulo
Em janeiro de 1877, a antiga Capela de madeira, construída no pátio da
igreja, foi transformada em Escola. 0s objetos de culto já tinham sido
guardados na nova igreja e na sacristia. Os novos bancos escolares denotavam a
riqueza de madeira da época: de estrutura sólida, e exageradamente compridos e
largos.
Não se podia contar com muitos alunos do Centro Urbano, porque eram poucas
as famílias católicas aí residentes. Pe. Jakobs tinha em mente desenvolver o
seu Colégio como escola primária e instituição preparatória de 1ª Comunhão.
Sabe-se que, no atinente à Religião, o quanto eram abandonadas as crianças da
Colônia de descendência alemã. Pois agora deveriam ter, pelo menos durante um
ano, uma experiência da Fé Católica; bem como progredirem nas disciplinas
escolares.
Já no 1º ano, a organização dessa instituição e a manutenção de algumas crianças
pobres somaram uma despesa de 1:892$130 em dinheiro.
O 16 de janeiro de 1877 marcou o início do ano letivo. Eram 16 alunos e
alunas. Seu professor: José Wamser, seguidor consciencioso das determinações de
seu Vigário e Diretor. Quando Pe. Jakobs voltava da Colônia, a sua maior e
preferida preocupação era com a Escola. Assumia pessoalmente disciplinas
importantes. Muito insistia no sentido de as crianças, muito em breve, tivessem
bons conhecimentos do culto religioso, e que, com alegria, participassem da
santa missa e das rezas comunitárias aos domingos.
O número de alunos crescia lento, mas de contínuo. No final do ano, apresentaram-se
35 alunos para o exame escolar. Ao Vigário incumbia, pois, tomar providências
no sentido de ampliar o seu internato. Já planejava um novo prédio, porque o
antigo estava mal situado. E incumbiu o professor de sondar um terreno
apropriado na mata vizinha. Armado de espingarda e facão, o professor pôs mãos
à obra. Escalou as colinas próximas, examinou os estreitos vales, e chegou à
conclusão de que o local a oeste do morro do cemitério seria o mais apropriado
para um novo prédio.
A pouco e pouco, Pe. Jakobs mandou derrubar o mato, e foi preparando o terreno
de um futuro colégio maior.
6. A Crescente Labuta Pastoral
Em 1877, os imigrantes chegados nesta Colônia somavam 208 católicos e 162
protestantes. Em 1878, vieram 540 católicos e 354 protestantes. A população brasileira
havia, sobretudo, ocupado terras rio-acima, na fronteira da Colônia e, em
geral, sem aquisição de propriedade. Imigrantes havia que lhes pagavam uma
indenização pelos seus trabalhos preparatórios, e assim adquiriam o título de
propriedade. Os primitivos moradores tratavam de, novamente, prosseguir mata
adentro.
Nos assentamentos povoados, já haviam surgido, nesse meio tempo, capelas e
cemitérios. E aos 29 de maio de 1877, a Autoridade Episcopal havia separado
esta Colônia do Território Paroquial de Gaspar. Aos 29 maio de 1877, Pe. Jakobs
havia benzido o Cemitério junto à Capela de São Ludgero. Aos 4 de Junho de
1878, houve a inauguração da Capela de Santo Estanislau, na Estrada da Areia.
Depois disso, seguiram-se: S. Ambrósio, em Ascurra (17 de abril de 1879); Santo
Antônio, na Estrada da Pomerânea (7 de junho de 1879); Nossa Senhora das Dores,
em Rodeio I (3 de junho de 1879); São Vigílio, em Rodeio II (17 de setembro de
1879); Sagrado Coração de Jesus, na Estrada dos Tiroleses (22 de junho de
1882); Santa Madalena, na Pomerânea (23 de julho de 1884); São José, em
Guaricanas (4 de setembro de 1888); e Sant’Ana, em Aquidaban (28 de julho de
1886).
Na Estrada da Areia predominava a língua polonesa; em Aquidaban e Rio
Morto, o português; nas demais, o italiano. Não se multiplicava muito o número
de famílias católicas de descendência alemã. Algumas famílias católicas se
perdiam devido a casamento misto. Outras abandonavam Blumenau, e procuravam fixar-se
alhures, em regiões de população católica mais numerosa.
Para apoio na sua pastoral, Pe. Jakobs procurava os missionários de Nova
Trento. Assim que, em 1878, vieram os padres jesuítas: João M. Cybéo e José
Andreassi. Nos meses de março e abril, eles visitaram Rio Morto, Rodeio, Rio
dos Cedros e Encano. No ano seguinte, Pe. Cybéo trouxe os Padres Angusto
Cervanzi e Pietro. Este avançou até Salto Pilão. O ano todo deu à Paróquia de
Blumenau 366 batizados. Dos quais somente 57 foram administrados na Igreja
Paroquial.
Visita a Doente. Para Blumenau, setembro e outubro são meses críticos, porque, em geral,
portadores de inundações. Foi o que ocorreu em outubro de 1877. Chuvas fortes
enlamearam as ruas e engrossaram os rios. Muito apressado, um mensageiro veio
correndo à casa paroquial: vinha ele buscar um Padre para a visita a um doente
em Passo Manso. A cavalgada até lá seria bem umas três horas.
À margem do rio, a um km. acima de
Passo Manso, Pe. Jakobs encontrou-se com os irmãos João e Rainoldo Kluga. Sabiam
eles que o gravemente enfermo, Guilherme Meffert, mandara chamar o Padre. E
agora se dispunham a ajudá-lo na perigosa travessia. Conduziram o Vigário até
a canoa, e remaram bom trecho rio-acima, contra a corrente. Soprava um vento
rígido e a chuva caía torrencial. A seguir, remaram para o outro lado, já perto
da casa. Após o religioso atendimento, a difícil viagem de regresso. Era
novamente enfrentar fortes aguaceiros e emaranhados de paus e vegetais na forte
correnteza do rio. Todos encharcados, mas de corações felizes, os três homens
voltaram ao ponto de partida. Subiram a encosta. Lá de cima, ainda lançaram um
olhar sobre o rumorejante Rio Itajaí.
A seguir, partindo da margem oposta, um sinal comunicava que o enfermo
visitado havia morrido.
7. Criação da Paróquia de São Paulo Apóstolo
Sobre o evento, o Livro de Tombo guarda o seguinte registro:
“Aos 2 de junho de 1878, na Colônia de Blumenau, da Província de Santa Catarina, da Comarca de
Itajaí, na Paróquia de São Paulo, em
Blumenau, na presença do Revmo. Vigário Pe. José Maria Jakobs, do Juiz de Paz
em exercício: Dr. Frederico Müller, do Subdelegado da Polícia: Julio
Baumgarten, do Diretor
da Colônia, Dr. Hermann Blumenau, dos Funcionários da Direção Colonial: Germano
Wendenburg, Teodoro Kleine, Ave Ballemant, Henrique Krohberger, e dos demais
assinados cidadãos e moradores da Paróquia -, o Revmo. Vigário leu o Documento
Episcopal sobre a instalação da Paróquia e a nomeação do Pe. José Maria Jakobs
como seu Vigário; a seguir, o Juiz de Paz, o Vigário, o Delegado de Polícia e
os demais representantes das Autoridades declararam instalada a Paróquia, e o
Vigário empossado, e que a Paróquia usufrui todos os privilégios civis e religiosos segundo a Constituição e
as Leis do Império e os Direitos Eclesiásticos. Sobre isso foi elaborado este
Ato Oficial, que será por mim, Augusto Goeden Jun., Escrivão de Justiça de Paz,
e por todos -, assinado neste Livro de Tombo da Paróquia, a fim de enviar
cópias suas à Câmara Municipal, ao Revmo. Bispo Diocesano, ao Presidente da
Província e à Diretoria da Colônia:
José Maria Jakobs,
Vigário,
Fritz Muller, Doutor em
Filosofia,
Medicina e Ciências
Naturais pelas Universidades de Berlim, Bonn e Tubinga,
Juiz de Paz em Exercício
Julius Baumgarten, Juiz
de Paz e Delegado de Polícia,
Dr. Hermann Blumenau,
Diretor,
H. Wendenburg, Guarda
Livros.
Theodor Klein, Escrivão.
Heinrich Krohberger,
Arquiteto.
Heinrich Avé Ballemant,
Escrivão.
Viktor Gärtner, Cônsul
do Império Alemão.
Franz Valloton, Dr. em
Medicina.
Otto Stutzer, Fiscal.
Karl Wilhelm
Friedenreich, Juiz de Paz.
Karl Friedenreich,
Representante do Delegado de
Polícia.
Apollonia von Büttner
Scheeffer, Professora.
João Maria de Almeida
Portugal, Engenheiro-Chefe.
Johann Breithaupt,
Agrônomo.
Julio Cezar dos Reis
Cardoso, Agrônomo.
Carl Kütjös, Inspetor de
Quarteirão.
Franz Faust, Inspetar de
Quarteirão.
A. Keunecke - Xaver
Bugmann - August Sutter - Johann Wloch.
Sebastian Treis- Augusto
Heppmann - Paul Zoz.
Jakob Theis - August
Goeden Jun.
8. A
Escola na Sede Paroquial
Nos recém-ocupados Assentamentos do Interior da Colônia, em breve foram
surgindo pequenas e modestas Capelas. De sorte que Pe. Jakobs, além da
Igreja-Matriz, tinha a seus cuidados 14 Capelas.
Mas não arrefecia o seu zelo pela Escola. Logo a seguir, convocou da
Colônia um grupo de crianças para a Catequese da Primeira Comunhão.
Providenciou-lhes moradia, alimento e doutrina. Os pais entravam com módica
retribuição mensal ou com o fornecimento de produtos agrícolas. Algumas
crianças eram admitidas gratuitamente.
Sua Escola e o Instituto de Neocomungantes exigiam espaços
maiores. Já em 1879, ele havia anexado um curso complementar dirigido pelo
competente professor João Pies.
Entrementes, mandou elaborar um projeto para uma nova construção, incluindo
a derrubada de mato para o local da construção, e a utilização da madeira
aproveitável. A pouco e pouco, juntava-se o material para a nova construção.
Despesas que ele, geralmente, custeava com os seus proventos pessoais de
Vigário. Mas para as despesas da construção, necessitava de ajuda pecuniária
maior.
Seu amigo Pe. Höhn, do Rio de Janeiro, era por ele bem informado sobre o
andamento das coisas, e o convidou para uma viagem à Capital, onde poderia
fazer uma boa coleta para a sua obra.
Aos 15 de outubro de 1884, Pe. Jakobs empreendeu a planejada viagem. Deixou
a Paróquia aos cuidados do Pe. Matz, da Paróquia vizinha. No dia 7 de dezembro,
estava de volta.
Na Capital, encontrou benfeitores disponíveis que lhe fizeram doações, e
prometeram-lhe ulterior ajuda. Também os membros da Família Imperial deram-lhe,
de bom grado, a sua contribuição. Por diversas vezes, receberam cordialmente o
Vigário de Blumenau, e com ele gostavam de conversar sobre o Sul do País.
O Conde d'Eu, esposo da Princesa, prometeu-lhe vir em breve a Blumenau, e
fazer uma visita à Colônia. Até Paranaguá, ambos viajaram no mesmo navio a
vapor.
9. Visita
Importante
Pe. Jakobs trouxe a notícia de que, em breve, Blumenau teria a visita de
sua Alteza Imperial, o Conde d’Eu. De sorte que pôs tudo em alegre movimento. O
Eminente Hóspede seria recepcionado com grande festa. Viajando com o navio a
vapor "Progresso", a sua chegada ocorreu aos 15 de dezembro de 1884.
E encontrou tudo festivamente ornamentado.
O navio "Progresso" aportou, e Pe. Jakobs, na qualidade de
primeiro representante de Blumenau, foi a bordo afim de, em nome da Colônia, dar as boas vindas ao Nobre Hóspede. A seguir, vieram os Senhores da
Administração Municipal e Líderes do Centro Urbano, e que eram apresentados
pelo Pe. Jakobs. Graças à sua natural gentileza, o Conde d’Eu logo soube
entabular uma boa conversa.
Primeiramente, todos se dirigiram ao Templo Católico, onde ocorreu uma Ação
de Graças a Deus. Logo em seguida, o Vigário dirigiu uma saudação, em português
e alemão, ao Representante do Imperador. No final, ressoou vibrante o canto de
louvor, em alemão, "Grosser Gott wir loben Dich” (Deus Eterno, a Vós Louvor".
No dia seguinte, o Conde d'Eu visitava o Centro Urbano. Fez uma visita à
Câmara, a diversas escolas e casas comerciais, bem como à Sede Paroquial do Pe.
Jakobs. Por constatação pessoal, convenceu-se da necessidade urgente do novo
prédio escolar.
Na época, 124 alunos freqüentavam o Colégio. Sendo 66 do internato e, entre
eles, 3 órfãos. Havia 25 alunos sem condições de pagar; e 20, só podiam pagar a
metade. Os alunos externos pagavam 1$000 a 1$500 Rs por mês, e os pensionistas
pagantes: 20$000 Rs.
Assim que o Conde d’Eu viu o iniciado prédio novo do Colégio, encorajou o
Vigário a executar confiante a sua obra. Com espontaneidade, prometeu
colaboração. Por sua iniciativa, Pe. Jakobs recebeu, aos 4 de agosto de 1885, a
nomeação de Sócio Honorário da Sociedade para a Proteção da Juventude
Abandonada; e pelas suas realizações até agora efetuadas, recebeu um prêmio de 300$000 Rs, em benefício do Colégio.
De maneira cordial, o Conde passou o resto do dia em contatos com a
população blumenauense. À noite, houve iluminação festiva da Rua Principal, e
festa no Clube dos Atiradores. A 17 de dezembro, a Eminente Visita viajou para
Itajaí. Ao despedir-se, referiu-se aos seus conhecidos de Blumenau, declinado-lhes
o nome. Em todos deixou uma elevada impressão.
10. Lançamento Festivo da Pedra Fundamental do Novo
Colégio
Os fundamentos do novo Colégio já haviam sido lançados no terreno da Igreja
Católica, e as paredes já se erguiam até a altura das janelas. Mas para a festa
de lançamento, Pe. Jakobs marcou o dia 22 de fevereiro de 1885. Favorecido por
bom tempo, a cerimônia transcorreu maravilhosa.
Às 3 horas da tarde, a Banda de Música Schneider executou uma peça. O Coral
Germania cantou o Salmo 23, composto por Klein. A seguir, o Vigário Jakobs
mandou ler o Documento que acompanharia a Pedra Fundamental:
“No dia 22 de fevereiro de 1885 depois de Cristo, sob o Governo de Dom
Pedro II, com a presença do Conselheiro
Manoel Pinto de Souza Santos; do Exmo. Senhor Dr. José Lustosa da Cunha
Paranaguá, Presidente da Província; do Exmo. e Revmo. Sr. D. Pedro Maria de
Lacerda, Bispo desta Diocese: realizou-se, às 15hs, o solene ritual do
Lançamento da Pedra Fundamental do Colégio Central para a Formação Elementar e
Superior da Juventude. Sendo seu Fundador e Diretor o Pe. José Maria Jakobs,
Vigário; e Professores: os Senhores Johannes Pies, Hugo Joseph von Carnfeld,
Hermann von Koppy e Franz Demmer”.
Após a bênção da Pedra pelo Vigário, e na presença de numerosos
representantes das mais variadas Nações -, foi depositada a Pedra, juntamente
com um pequeno Cofre a conter a matrícula dos 126 alunos; e um exemplar dos
seguintes jornais:
Immigrant - Blumenauer Zeitung - Deutsche Volkszeitung (de S. Leopoldo) - Germania - Schwarzes Blatt - Apóstolo - Generação
Baltimorer Volkszeitung. E as seguintes moedas: uma de cobre (antiga, 20
Rs.); uma de cobre (nova, de 20 Rs.) uma de níquel (100 Rs.); uma de níquel
(200 Rs.); uma de prata (200 Rs.) e uma de prata (de 500 Rs.)
E afim de constar, para sempre, o quanto aqui se fez de melhor em benefício
da Religião Católico-Romana e pelo Ensino da Juventude, assim pobre como rica
-, junta-se este Documento, depois de assinado pelo Vigário, pelos Professores
e pelos Presentes.
Em prosseguimento, o Vigário depositou a Pedra no lugar indicado, e deu as
três marteladas, acompanhadas destas palavras:
“Oxalá as marteladas sobre a Pedra Fundamental possam anunciar a todos os
concidadãos de nosso grande Império, o que aqui em Blumenau se realiza em prol
da Educação da Mocidade, e incentivar outros para o mesmo ideal.
Oxalá esses golpes ecoem na velha Pátria, a testemunhar-lhe que também
aqui, na mata virgem, temos entusiasmo pela Educação. Assim antes como durante
a construção, correu muito suor, e muito ainda irá correr. Mas o Todo-Poderoso
não irá negar o seu auxílio, e deixará a obra prosperar: para a bênção das
gerações futuras e para a difusão da verdadeira Liberdade e Formação”.
A Sociedade de Canto encerrou a bênção solene com o Canto Dominical de Abt.
Ato contínuo, Dr. Antunes, o orador oficial, proferiu a sua alocução em língua
portuguesa, seguida de uma marcha alegre, executada pela Banda Musical.
Em terceiro lugar, fez uso da palavra o advogado Paulo Schwarzer. Declarou
ele que “a Escola é o fundamento sobre o qual se constroem as grandezas dos
Estados e dos Povos. Sem a sua atuação, nenhuma prosperidade será possível.
Multiplicai as instituições de ensino, e estareis lançando as Bases da
Felicidade Nacional, promovendo o Bem e diminuindo a criminalidade. É à Escola
que se deve, em primeiro lugar, o mérito da grandeza da Alemanha”.
A seguir, a Sociedade Coral apresentou, de Kollinroda, “0 Canto Alemão”
e durante um bom espaço de tempo, a Banda de Música foi animando o povo
com bem selecionadas peças.
A autoridade municipal de Blumenau omitiu-se: não mandou representante. Mas
a de Brusque se fez representar.
Do dinheiro até agora arrecadado, já não sobrava mais nada. Mas o jornal Der
Immigrant informa: "Pe. Jakobs espera conseguir o capital restante
mediante doações de particulares. E nós temos a certeza de que, graças à sua
singular energia, ele há-de alcançar o objetivo colimado".
11. O Novo Prédio do Colégio
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Um pavilhão central com porão, dois andares e cumeeira bem alta; a fachada
com três janelas; ao lado, uma escada com alpendre. Essa parte foi construída
por primeiro. À esquerda, foi anexado um pavilhão lateral de um andar, de tijolos,
com 6 janelas; ao lado direito, uma construção de madeira, com a entrada no
meio, tendo, de cada lado, três janelas.
No dia 4 de maio de 1885, 2ª feira, realizou-se, na ainda inacabada sala principal, o exame
escolar público. Foi motivo de grande alegria para todos os amigos da Escola.
Os atestados foram entregues, e 47 prêmios distribuídos aos alunos mais
aplicados. Em meio a isso, foram oferecidos entretenimentos aos convidados. Os
alunos encenaram a peça teatral “O Pequeno Limpa-Chaminés”; e
apresentaram poemas, cantos e peças musicais. João Bauer, de Brusque, foi o
melhor pianista.
A Festa da Ascensão do Senhor trouxe a Primeira Comunhão Solene das crianças.
Da sala escolar até a Igreja-Matriz, elas se dirigiram em procissão.
No dia 24 de dezembro de 1885, teve lugar a festa em redor da Árvore de
Natal, "plantada" no felizmente concluído prédio escolar, e ali
permaneceu até 6 de janeiro. Data em que as alegrias da festa belamente
se encerravam como festa das crianças.
12.
Reminiscências de Ex-Alunos
Sr. Dr.
Thiago de Castro – Advogado em Lages.
Em 1885, ainda menino, era aluno deste Colégio. Em 1927, ele escreve sobre
essa quadra de sua vida: “Pe. Jakobs era de real aparência varonil, de natureza
majestosa, grande e forte, de rosto oval e sempre bem escanhoado, um pouco
amorenado, devido às muitas viagens; os cabelos pretos, já um pouco grisalhos.
Tinha ele uma voz de barítono cheia e um olhar enérgico e dominador. Logo dava
para perceber que, em meio aos seus paroquianos, ele exercia poderosa influência;
e que era muito considerado pelas pessoas de outra religião. Apesar de sua
convicção clara e firme, não era agressivo. O interior de seu caráter
combinava com a aparência do seu exterior: pois não admitia fingimentos e
diplomacias.
Pregava com vigor arrebatador e harmonioso. No seu raio de ação, tudo
dirigia com autoridade e facilidade. No seu primeiro contato com uma visita,
logo era aceito por sua conversa ponderada e seu nobre caráter.
Tinha eu por ele um respeito filial. Teria sido fácil tornar-me seu aluno
predileto. Mas faltava-me dominar melhor o meu temperamento irrequieto, que dava
motivo a muitas advertências. Em duas ocasiões, Pe. Jakobs me deu uma atenção
especial. Na primeira, tive de acompanhá-lo numa visita ao Juiz de Direito
Arruda Câmara e ao comerciante Gustavo Salinger. Na ocasião seguinte, escolheu-me
para parceiro no jogo do bolão, contra Krämer e seu companheiro. Atencioso, ele
me deu um dos seus grandes charutos, e se admirava de eu o fumar com tanta
elegância. Eu contava 13 anos, e ainda hoje me lembro do muito que me senti
honrado com esse presente do Diretor.
Sentia-me, porém, mais inclinado para o nosso professor Kraemer. Todos
gostávamos do seu caráter descontraído e amigo. Era dono de um cavalo luzidio
e preto. De cavalgar, o professor entendia e gostava. O cavalo ficava aos
cuidados do meu bom colega Argolo. Era nosso divertimento: rapidinho,
atravessar o rio para, no pasto de lá, fazer uma cavalgada selvagem.
O rio também era o nosso banho público. Mas no inverno, suas águas eram
muito geladas. Eu então subia numa pedra do rio, e lá ficava de cócoras. Sem me
importar com o Pe. Steiner que, da margem, com gritos e pedradas, tentava
encorajar-me para o banho.
Na época, o nosso Colégio quase ficava na extremidade do Centro Urbano,
limitado pelo Rio Itajaí. Entre o Colégio e a margem do Rio estendia-se a Rua
principal. Do lado do Rio, ficava o depósito de lenha. Para a garotada, era um
divertimento, quais formigas carregadeiras, transportar lenha conventual até a
cozinha. Madame Murphy, que passava e arrumava a roupa, também controlava o
nosso trabalho fornecedor...
Mais tarde, passei para o Ginásio. Mas do "São Paulo", hoje
Colégio Santo Antônio, guardo, até hoje, grata recordação. Foi lá que eu fiz
boa amizade com Ernesto Neves, Trajano e Manfredo Leite; com Aníbal Pires e
Leopoldo Bauer. Já nem todos continuam entre os vivos.
Recordações!
O nosso espírito evoca o passado, e dele aspira o matinal aroma da infância
com suas esperanças côr de rosa, a fim de, no declínio da vida, novamente
alegrar-se com os tempos idos” (São José, 24-08-1927).
Reminiscências do Senhor Marcos Konder
No Jubileu de Ouro do Colégio (1927), fundado pelo Pe.
Jakobs -, o Senhor Marcos Konder, Superintendente de Itajaí e Deputado
Estadual, proferiu, na noite da Festa, uma conferência sobre os anos escolares
que aqui viveu. De suas considerações, vão aqui alguns tópicos.
“O Colégio destinava-se, em primeiro lugar, a filhos de
colonos. Adquiriam os conhecimentos necessários e, por algumas horas diárias,
se dedicavam a trabalhos agrícolas, sob a orientarão de um professor.
Alunos da 1ª classe, vindos de meios citadinos, eram
pouco numerosos. Não eram obrigados a trabalhos braçais. E recebiam aulas
especiais de música, desenho, línguas, etc. Também eu e meu irmão
Arno pertencíamos a essa classe, nos anos 1890 e 91.
A direção e a disciplina no Colégio era uma só, sem
diferença de classe. Pe. Jakobs, seu Diretor e Vigário, estava ausente por um
ou mais dias da semana. Nos recreios, Madame Mary Murphy, além dos seus
afazeres domésticos, tinha a vigilância dos alunos do internato. Repreendia,
quando necessário. E anotava as faltas maiores, para comunicá-las ao Diretor
quando voltasse. E este procurava tomar a atitude de justo juiz.
Madame Murphy era uma mulher virtuosa, incansável,
diligente e jeitosa no governo da casa. Era natural que na vigilância dos
alunos e das alunas do internato ocorressem problemas. Com eficazes remédios
caseiros, sabia combater doenças: o salamargo punha o estômago desarranjado novamente
em ordem; um suador eliminava resfriados e febres.
Naquele tempo, além do Diretor, havia o Pe. Ricardo
Drewitz que substituía o Pe. Vigário, notadamente em compromissos paroquiais.
Como professores, atuavam P. Steiner, Guilherme Murphy, Francisco Frankenberger
e Schönfelder.
O mais jovem e talentoso dos professores era o Murphy.
Lecionava línguas e matemática, e não poupava esforços.”
13. A Família Murphy
Nos relatórios sobre o Colégio São Paulo, encontram-se,
merecidamente, referências à Madame Murphy, a governanta dedicada do Pe.
Jakobs. Daí, darmos aqui algumas informações mais detalhadas.
Cornélio Murphy e Mary Anna Ó Brien eram irlandeses. Casaram-se no ano de 1854, em Londres[2]. Mais tarde, emigraram para o Brasil. De início, viveram no Rio de
Janeiro. A seguir, no Desterro e, em abril de 1879, vieram para Blumenau.
Ocuparam o seu lote colonial da mata, na Estrada da Itoupava, onde o caminho
dobra para Testo-Rega. O primeiro rancho era feito de alguns troncos de
palmitos, e esteiras de folhagem.
Próximo a seu lote, trabalhava, com o seu grupo, o
agrimensor Händchen. Algumas vezes, durante a noite, uma onça se aproximou do
acampamento e, por duas vezes, pegou um cão. Para melhor proteção, o pessoal
fez, a pequenos espaços, algumas fogueiras.
De modo que, na noite de 9 de novembro, a onça deu em
rodear a casa do Murphy, facilmente descobrindo o rudimentar leito. Através da
parede de folhas, agarrou o adormecido Cornélio Murphy e o puxou para fora.
Logo aplicou-lhe uma tremenda mordida no ombro e no pescoço.
Mas pelos gritos da esposa e dos filhos, o
animal foi posto em fuga. Dores cruéis sacudiam a vítima. Durante a longa
noite, perdeu muito sangue. Só pela manhã, foi possível levar o Cornélio a
Blumenau, onde morreu a 11 de novembro.
Nesse meio tempo, Guilherme Starke e Teodoro Rothers
resolveram perseguir a onça. Seguiram-lhe as pegadas até Putanga, onde
conseguiram matá-la. Antes disso, porém, a fera ainda lhes havia estraçalhado
dois bons cães de caça.
Pe. Jakobs acolheu a família Murphy. A mulher assumiu o
governo da casa; as crianças entraram no internato. Aqui elas exerceram
benéfica influência. Pois conheciam várias línguas: sua língua materna era o
inglês; no Rio de Janeiro e Desterro, aprenderam bem o português; na sua
convivência com alemães, também entendiam a sua linguagem cotidiana.
Pe. Jakobs gostava de entreter-se em inglês com os dois
filhos Cornélio e Guilherme. Dizia que ambos progrediam bem na escola. Mais
tarde, enviou-os ao Rio de Janeiro para continuarem os estudos. Bem quisera o
Padre encaminhá-los para o Sacerdócio. Mas não era a vontade de Deus.
Escrevia-lhes as cartas em inglês.
Cornélio Murphy permaceu na Capital, e era considerado
bom professor de línguas. Em 1888, Guilherme entrou como professor no Colégio
São Paulo, e tornou-se excelente apoio para o Diretor.
Em pouco tempo, era também conhecido e estimado fora do
Colégio. Muitos colonos pediam-lhe ajuda, oral ou por escrito, para resolver
negócios oficiais. Em Indayal, ele abriu uma casa comercial, e a Senhora sua
Mãe morava com ele. Em companhia de Henrique Reuter, Adão Heckmann e Antônio
Cunha -, foi ele o grande fundador das Comunidades Católicas no setor paroquial
e escolar.
A Capela Santa Inês e a bela construção da Igreja
Paroquial, devem-lhe substancial empenho.
Aos 12 de janeiro de 1897, contraiu matrimônio com
Catarina Baader. Tendo em vista o bem da Família e a Comunidade, morreu muito
cedo: aos 13 de abril de 1905. Sua Mãe alcançou idade provecta. Dona Murphy a
santificava pelo trabalho, pelo paciente suportar da enfermidade e pelas preces
devotas.
14. O Crescente Labor Paroquial
Os antigos Livros Paroquiais nos dão conta da sempre
crescente atividade que Pe. Jakobs devia desempenhar na Igreja Paroquial e nas
Capelas.
Crismas - Nos meses de novembro e dezembro
de 1879, o Padre Jesuíta João M. Cybeo, autorizado pelo Sr. Bispo, administrava
o Sacramento da Crisma. Nos dias 6 e 9 de novembro compareceram na
Igreja-Matriz 554 crismandos. 0s mais escolhidos para padrinhos foram: Pe.
Jakobs, Prof. João Pies, Miguel Schmitz e Catarina Schmitz, Augusto Sutter,
João Tillmann, Bugmann, Bucher Diem, Baader, Nicolau Alpen, Radke, Thomsen e
Margarida Mandel.
Na Capela São Bonifácio, houve, aos 30 de novembro, 52
crismandos. No Rio Morto, 541. Nos dois dias seguintes: em Rodeio, 629; no Rio
dos Cedros, 260. Nos dias 8 e 10 de dezembro, na Igreja-Matriz, mais 41
crismandos. Total: 2.077. Desses números, ressalta que a maioria dos católicos
morava, a partir do Rio Morto, em direção a oeste e norte: isto é, em
Aquidaban, Rodeio e Rio dos Cedros.
Ao final de novembro de 1887, retornou a Blumenau o Pe.
Cybeo sj, para administrar a Crisma. Aqui permaneceu por vários meses, e
auxiliava o Vigário. Até 20 de julho de 1888, chegou a crismar 2.120
candidatos: na Igreja-Matriz, 399; na Igreja São Bonifácio (Encano) 73; os
demais 1648 foram das Capelas de: Rio Morto, Aquidaban, Guaricanas, Rodeio e
Rio dos Cedros.
Na Igreja-Matriz, os mais escolhidos para padrinho foram:
Pe.Jakobs, Carlos Kraemer, Henrique Margarida Würges, Filipe Bornhofen, Regina
Weschenferder, Bauler, Zwang, Deschamps, Bechler, Emma Engelke, Vogel, Zog,
Heckmann, João Michels e Francisco Demmer.
15. A Primeira Comunhão
Como já anotado, Pe.
Jakobs fundou o Colégio tendo em vista, em primeiro lugar, uma
Instituição Preparatória para Neocomungantes. Dado que os alemães católicos
tinham sido tão dispersamente estabelecidos na Colônia, era necessário reunir as crianças, sobretudo no Colégio São Paulo.
Neocomungrantes de 1888: Pedro
Vogel, José Peyerl, José Heidrich, Jorge Hermann, Germano Vogel, Guilherme
Wirh, Bernardo Tarnowski, José Koser, Francisco Gerzy-bowsky, Francisco Theis,
Henrique Baader, Valentim Zog, Godofredo Herrmann, Joana Krämer, Carolina
Brückheimer, Ida Kretz, Berta Oechsler, Ana Vogel, Maria Kostetzer, Clara
Zimmermann, Emma Vogel, Catarina Kinern, Barbara Fähnrich, Emma Gruner, Ana
Köhler, Barbara Zog, Filipina Demmer, Maria Peyerl, Ema Bugmann, Ana Stein,
Maria Schlögel, Catarina Wirth, Maria Weege, Carolina Heckmann e Elisa Peters.
Neocomungantes de 1889:
Augusto Sutter, João Reuter, Carlos Weiss, Jacó Fuck, Felício Wirth, Matias
Kienen, Bernardo Janning, Cristiano Michels, Daniel Brühmüller, Nicolau
Bukardt, Luiz Koprowski, Pedro Rosvenski, Leo Tadnowski, Joana Gruner, Maria
Vogel, Maria Sellost, Clara Fähnrich, Clara Theis, Augusta Theisen, Elisabete
Rudolph, Estefância Engelke e Maria e Elisabete Anesi.
Neocomungantes de 1890:
Teodoro Herdt, Leopoldo Kluge, João Engelke, Francisco Wamser, Guilherme
Bauler, Matias Bornhofen, Guilherme Weinrich, Paulo Zoz, Henrique Vogel, José
Theis, Maria Heerdt, Ana Loes, Teresa Kienen, Rosa Rudolph, Rosa Löwen, Ana
Schaaf, Ana Bick, Maria Eberhardt, Luisa Fuck, Margarida Tillmann, Ana Zoz,
Matilde Dickmann e Maria Krug.
Neocomungantes de 1891: Manoel
Kluge, Jacó Theis, Matias Michels, Francisco Ziemlich, Henrique Fuck, José
Burkard, Pedro Belli, Carlos Gruner, Nicolau Kienen, João Eberhardt, Guilherme
Lemfers, Bernardo Radke, José Weiss, Germano Krug, Luiz Krämer, Pedro Schmidt,
Ana e Teresa Rudolph, Ana Fuck, 0tílio Zimmermann, Susana e Maria Kienen, Pedro
Reinert, João Oechsler, Ernesto Hees, Isabel Baron, Ana Riestler, Clara
Tanowska, Rosália Roscenska, Antônia Glinkowska, Maria Samulewska, Isabel
Lanzer, Elsa Schager, Tecla Baader, Inês Dickmann, Ana Kretzer, Helena Michels,
Carolina Weege, Maria Wirth, Gertrudes Theis, Gertrudes Felska, Luisa Theisen,
Genoveva Heiler, Maria Wamser, Alida de Zutter, Margarida Peyerl, Ana Haendchen
e Marta Vogel.
Os últimos Neocomungantes foram
preparados pelo Pe. Jakobs, em 1892. No que também foi auxiliado, desde 16 de
março, pelo primeiro Vigário Franciscano Padre Zeno Wallbröhl: Oto Abraham,
Pedro Zimmermann, Miguel Peyerl, João Hess, Oto Loes, Manoel Stein, Nicolau
Morph, Francisco Kluge, João Michels, Henrique Janning, Bernardo Wollick,
Antônio Koser, João Gruner, Valentim Sutter, Bárbara Demmer, Ana Loes, Regina
Kienen, Maria Zoz, Maria Kretzer, Maria Bornhofen, Clara Stein, Maria Zephan,
Emília Stenz, Madalena Kretz, Ana Kretz, Bárbara Koser, Helena Bukardt e Berta
Rudolph.
Deste último grupo, somente uma criança teve condições de
vir, desde a casa dos pais, para freqüentar a Escola Católica no Centro Urbano.
Sendo que as demais moravam entre 10 e 36km distantes, em lugares onde era
impossível fundar uma escola. Quase nas mesmas condições que reinavam nos
primeiros anos.
As crianças da 1ª Comunhão eram motivo de alegria e
preocupação para o Vigário. Procurava conhecê-las bem, e dar-lhes valiosos
conselhos para o seu futuro. Também lhes falava a respeito da vida sacerdotal e
religiosa. Nelas procurava despertar vocações. Como que esmagado pelo seu
esforço dedicado à salvação das almas, o Padre Vigário muito rezava a Deus:
“Senhor, mandai operários para a Vossa Messe"!
Quando achava que em alguma alma juvenil pudesse haver
condições para a vida sacerdotal ou religiosa, era todo empenho na educação e
doutrinação do possível candidato. Dava-lhe orientações práticas com relação às
virtudes necessárias a uma futura vida religiosa, tais como: castidade,
humildade, espírito de sacrifício, espírito de oração. Cada candidato por ele
assim escolhido, recebia conselhos por escrito, e de acordo com o seu caráter
individual.
Assim, as filhas do prof. Thompsen, por influência do
Padre, entraram no Convento do Rio de Janeiro. Catarina Schmitz, uma Irmã
Vicentina, também foi das primeiras postulantes que o Vigário encaminhara à
vida religiosa. Escrevendo-lhe aos 13 de outubro de 1888, comunicou- lhe que,
em breve, lhe enviaria mais duas candidatas para o seu Convento.
Em carta de 6 de junho de 1889, Pe. Jakobs comunicava ao
Pe. Sipolis, no Rio de Janeiro, que estava preparando três jovens para a
vocação sacerdotal. Em breve os encaminharia para o seu Seminário. E novamente
anunciava o propósito de encaminhar mais 5 candidatas importantes para as Irmãs
Vicentinas, no Rio de Janeiro.
Quanto aos Padres Giacomo Vincenzi, Richard Drewitz e
João Nicolau Alpen: Pe. Jakobs lhes deu o ensino em seu próprio Colégio de
Blumenau, encaminhou-os para os estudos superiores e lhes prestou auxílio na
Ordenação Sacerdotal. A respeito deles, algumas informações individuais: Richard Drewitz era
imigrante, mas não alemão católico. Em 1884, ele chegou a conhecer, no Rio de
Janeiro, ao Pe. Jakobs, com quem logo simpatizou, graças ao seu caráter aberto,
e lhe pediu auxílio no sentido de entrar na Igreja Católica. Diante disso, o
Padre o levou para Blumenau. Atendeu a seu pedido, e fez com ele uma
recapitulação do curso ginasial. Depois disso, Pe. Jakobs o enviou para a
Capital do País. No final de 1888, Richard recebeu, lá mesmo, a ordenação
sacerdotal. No ano seguinte, foi nomeado Coadjutor do seu Benfeitor.
Sucedeu, pois, que em data de 25 de janeiro de 1889, na
festa de São Paulo, celebrou a sua primeira missa solene na Igreja Paroquial de
Blumenau. No entanto, em março de 1890, retornou para o Rio de Janeiro, onde
faleceu após alguns anos.
Nicolau Alpen era filho de colono nascido em
Blumenau. Por ocasião do Natal de 1878, aos 20 anos, entrou na Igreja Católica.
Acompanhava o Pe. Jakobs em suas viagens paroquiais. E fazia seus estudos
preparatórios para entrar no Seminário. Para tanto, levou alguns anos. Mas
chegou lá. Quando Pe. Drewitz voltou para o Rio de Janeiro (1890), Alpen ainda
não havia concluído o seu curso de Teologia.
Aos 27 de agosto de 1890, Pe. Jakobs escreveu- lhe uma
carta muito comovida: "Meu caro Claus! Ainda que raramente me escrevas,
confio na bondade do teu coração, no sentido de não me recusares o seguinte
pedido: Tem compaixão para com o teu pai espiritual, e pede ao Sr. Bispo que te
ordene neste ano e te envie para cá. Podes concluir os teus estudos sob a minha
orientação e me prestar auxílio, sem o qual me será impossível continuar o meu
trabalho. Podes ter a certeza de aqui te sentires bem. Na esperança de uma
resposta para breve, abençoa-te quem muito te estima,
Pe. José M. Jakobs.
Este desejo, tão plenamente justificável, não foi
atendido. Verdade é que, após a sua ordenação sacerdotal, o Pe. João Nicolau
Alpen veio a Blumenau. Mas apenas como visita. Seu campo de ação ficava no Rio
de Janeiro, onde soube honrar o seu Benfeitor. Sob o nome de Padre João, era de
muito prestígio na Capital; e na Igreja de São João, no Botafogo, era um
confessor procurado. Em 1916, ele morreu. Era cura d’almas da Igreja do Sagrado
Coração de Jesus.
Giacomo Vincenzi, o 3º
sacerdote, ainda vive na Capital do País.
É cônego. Muito batalhou e se sacrificou pela Imprensa Católica.
Alguns Leigos. Pe. Jakobs enviou bom número de
jovens para o Rio de Janeiro, ou Caraça de Minas Gerais. Mas nem todos
alcançaram o seu ideal no Sacerdócio. Alguns voltaram para a Colônia, e graças
a seus estudos mais qualificados, tornaram-se elementos valiosos na vida da
Comunidade. Entre eles encontrava-se, por exemplo, José Sewagnani. Na
sua região, em Rodeio, exerceu o magistério: por longos anos, e com reconhecida
competência. Outro exemplo foi Henrique van de Kamg. De Blumenau,
dirigiu-se, via Rio de Janeiro, para Espírito Santo e Minas Gerais. Junto ao
Rio Doce (MG), manteve relações comerciais com os índios.
Era de todos sabido que Pe. Jakobs gostava de dar ajuda
aos imigrados alemães. Ora, havia aventureiros espertos que exploravam essa
beneficência. Humildemente, pediam-lhe admissão. Muitas vezes, manifestavam-lhe
o desejo de estudar e seguir a vocação sacerdotal. Se aceitos, teriam, por
várias semanas, alojamento gratuito. Geralmente, a piedade exterior e a
dedicação aos estudos eram de pouca duração, e logo seguidas de rápida
despedida.
Um desses aventureiros recebera do Pe. Jakobs, e de
graça, vários metros de bom tecido preto, o qual os professores haviam doado ao
Pe. Diretor, porque Madame Murphy, já desesperada, lhes havia mostrado a
batina, que ela já não mais conseguia remendar. Ora, num momento de descuido, o
Pe. Vigário havia doado o corte de tecido. E Madame a procurá-lo pela casa
toda. E ao almoço declarou que a peça havia sido roubada. Foi quando o Padre
teve de confessar a doação que fizera.
16. Excertos de Cartas e Informações
Carta de Padre Jakobs a seu
cunhado Jakop Gülpen, em Aachen, aos 14/02/1887. É com toda a franqueza que
falo o que penso. Toda palavra tem o sentido de amor fraterno, e não pretendo
machucar-te. Anos a fio, dei provas de que, para ti e minha querida irmã e
vossos queridos filhos - faço tudo quanto está ao meu alcance. No entanto,
segundo as leis de nossa Santa Igreja, é minha obrigação primeira ocupar-me da
salvação das almas do rebanho a mim confiado; e somente em
segundo lugar posso cuidar do bem temporal dos meus parentes.
Contraí dívidas com a construção do meu prédio escolar.
Dívidas que, segundo todas as leis divinas e humanas, devo pagar em primeiro
lugar, antes de pensar na prática de benefícios para outras finalidades.
Além do mais, em setembro último, o Governo cancelou a
subvenção escolar que, até agora, me havia concedido. Só me resta, pois,
mendigar, para evitar que a obra fracasse. E sem a Escola não posso salvar a
minha juventude.
Ainda estou saudável. No entanto, no dia 2 do corrente,
ainda no púlpito, contraí um mal físico. Segundo
o médico, somente poderei pregar e cantar, passados dois
meses, e com a condição de, até lá, ficar em completo repouso. Ainda assim,
enfrentei, no dia 6, uma viagem de 8 dias. Apesar do muito calor e das fortes
chuvas, visitei 4 regiões distantes, nas quais preguei em português, alemão,
italiano e inglês; atendi a 500 confissões, fiz 45 batizados e fiz visitas a
doentes. Ontem, todo fatigado, cheguei em casa. Mas hoje, estou novamente firme
no trabalho da Igreja e da Escola. O Doutor quer que eu tome vinho. Mas obtê-lo
onde? Minha batina está em trapos. Já não agüenta mais ponto nenhum, e não
tenho meios de arranjar uma nova.
Já me foram oferecidos vários cargos vantajosos: com vida
mansa e de ganhar bastante dinheiro. Mas não arredo pé, porque foi Deus, por
intermédio do Papa Pio IX, que me
mandou para cá, junto às mais abandonadas almas. E sem mim, o que será delas?
Só confio em Deus, porque a Ele me sacrifiquei. Permanecerei,
pois, no meu posto, até o chamado da obediência.
De uma Carta do Pe. Jakobs a um Neo-Sacerdote. Não se esqueça o Senhor deste princípio cristão: Não se vive na terra para
fazer a própria vontade, mas para cumprir a vontade de Deus, que nos é
comunicada mediante os Superiores. Na Igreja Católica, as decisões do
Sacerdote, no que respeita à sua atividade, dependem da obediência que juramos
ao Bispo.
Não almeje o convívio mais ilustrado e lisonjeador.
Porquanto, para nós vale, em primeiro lugar, o dever vocacional apostólico de
pregar o Evangelho aos pobres.
Deve ser do seu conhecimento que, segundo as
determinações dos Papas e dos Bispos do mundo inteiro, a Escola Católica,
em nossos dias, é mais importante para a salvação da alma do que a igreja.
Daí, ser necessário que os sacerdotes, cônscios do seu dever, se dêem ao
trabalho de fundar e dirigir escolas.
A um Sacerdote amigo, e mais idoso. O Governo cancelou a subvenção para a minha Escola. Estou disposto a
carregar a nova cruz que é colocada nos meus ombros, desde que somente a
atividade pastoral possa produzir frutos agradáveis a Deus.
Em obediência à minha missão sacerdotal no púlpito,
saberei defender a minha Santa Religião contra agressões e calúnias, e saberei
doutrinar o Povo sobre a Verdade. Eis o meu dever, do qual nenhum poder deste
mundo me poderá deter.
Ao Editor de um Jornal
(Imigrante), aos 17/02/1889. Desde 25 de janeiro de 1889, está em curso uma
furiosa investigação contra mim e a minha Escola. Em meu sermão fiz referência
aos sofrimentos físicos e espirituais ligados à vida sacerdotal. Também me
referi ao mal-estar que acomete o missionário, quando diante da deficiente
educação juvenil. Chamei a atenção de alguns católicos, por permitirem que seus
filhos andem pela Rua em companhia de rapazes protestantes já moralmente
corrompidos. Termo que meus adversários, maldosamente, generalizaram. Deus
sabe do mal tirar o bem. Se da maldade dos meus compatriotas contra mim puder
resultar o surgimento de uma 2ª Escola de valor, tanto melhor. Porque nestes
sagrados recintos não se conhece vingança.
Uma Publicação sua no “Imigrante", nos Dias de Carnaval (1889). A quantos possa interessar, e entendê-lo!
É perigoso
acordar o leão,
Pernicioso é o
dente do tigre.
Porém, o mais
terrível dos terrores
É o homem em sua
loucura!
E o leão não se
deixando acordar,
E faltando ao
tigre o dente,
Então reina o
terror de gente má,
Não raro também
de loucura vã.
Metade
de Schiller, Metade de Pe. José M. Jakobs (22/02/1889).
A Autoridade Pública - 12/05/1890. Sendo privado da Subvenção do Estado para a minha Escola, só me resta
despedir todos os alunos pobres e órfãos. Os quais na sua grande maioria, são
brasileiros, e que nada pagam para comida, vestuário e estudo. Quanto a mim,
não serei o prejudicado. Porquanto, neste caso, o meu ordenado, até agora todo
ele aplicado na Escola, poderei guardá-lo para mim. Mas o Estado terá maior
numero de analfabetos.
A Cientista Incrédulo
(15/03/1886). O Senhor afirma, a meu respeito, que tenho sangue quente e
temperamento irascível. Estou que essas objeções lhe fluíram da pena
impensadamente. Porquanto, já na idade de 55 anos e com mais de 30 anos em
atividade, não mais posso ser um garoto esquentado.
Quer-me parecer que o Senhor, único homem de profunda
ciência a viver nesta mata virgem, deveria, de preferência, apoiar a minha
atuação, representante que sou da Moral Cristã. E não freá-la nessa Colônia, onde
a leviandade, mais e mais, vai tomando conta.
As suas poéticas efusões sobre borboletas, primavera,
etc. caberiam melhor num poema de versos burlescos. Porque verdades espirituais
e lógicas, elas não contêm, não.
Nunca afirmei que os Conventos fossem os únicos lugares
de Escola e Cultura. Mas que eles foram, desde os primeiros séculos do
Cristianismo até os dias de hoje, os principais seminários de Formação Cristã,
de Arte e Ciência, e hoje ainda o continuam sendo -, só pode negar quem
desconheça a História do Mundo e do Cristianismo.
Mas para onde conduz a "soi-disant" Cultura sem
Deus e sem Cristianismo, bem pode aprender-se dos atuais nihilistas, comunistas
e anarquistas que, mais cedo ou mais tarde, hão de ensinar aos progressistas
ateus, e hão de abrir-lhes os olhos com sangue, ferro e petróleo. Os que
recomendam o roubo dos Conventos, igualmente devem conformar-se, quando também
a eles forem aplicadas as máximas: "Propriedade é Roubo" e "A
Violência precede o Direito”.
Ao Redator do "Imigrante" (15/08/1890) - No dia 15 de agosto de 1890, no Colégio São Paulo, e por
ordem do Senhor Bispo do Rio de Janeiro, constituiu-se o "Partido
Católico", ao qual logo aderiram 250 cidadãos.
O Senhor Pe. Jakobs fundamentou, em extenso discurso, a
necessidade da formação desse partido. Apresentou o Programa, e foi eleito o
Presidente, que assumiu a Direção. Depois disso, o Padre se retirou.
Blumenau, aos 16
de agosto de 1890.
Presidente:
Guilherme Engelke.
Vice-Presidente:
Henrique Reiter.
1º Secretário:
Sebastião Pinto da Luz.
2º Secretário:
Guilherme Murphy.
Tesoureiro: João
Hostert.
Assim que Pe. Jakobs terminou de precisar o ponto de
vista do Partido, concluiu-se pelas seguintes exigências: Na próxima eleição,
daremos os nossos votos, exclusivamente, aos candidatos para o Congresso que,
rigorosa e solenemente, se comprometerem com o seguinte programa:
1. “Total submissão ao Governo Republicano, isto é, em
tudo quanto não se oponha à nossa Fé e à nossa Consciência;
2. Doutrina Religiosa em todas as escolas para cada
Confissão Cristã;
3. Eliminação do Casamento Civil, mas severa punição pela
omissão do Registro Civil do Casamento;
4. Nenhuma secularização dos Cemitérios;
5. Direito de voto ativo e passivo para os Religiosos;
6. Isenção de Serviço Militar para Religiosos;
7. Existência e Direito de Propriedade para todas as
Ordens Religiosas;
8. Desimpedida Comemoração dos Dias Santos Cristãos”.
A recém-eleita Diretoria por-se-á em contato com a
Diretoria Central em Desterro, e com a Diretoria Geral no Rio de
Janeiro.
A nossa Divisa Permanente:
Com Deus, pela
Igreja e pela Pátria,
Pela Verdade,
pela liberdade e pelo Direito.
Ao Senhor Stutzer, na Alemanha (Blumenau, 19/10/1887).
Prezado Amigo!
Com alegria deparei no jornal "Imigrante" de
hoje o sumário de seu artigo sobre Blumenau. Logo o pedi a Scheidemantel, e
dele o recebi, para leitura. Com esse trabalho, o Senhor adquiriu méritos
extraordinários.
O que mais nele aprecio e aplaudo, é a sua geral
imparcialidade. E de modo especial, no que diz respeito ao Dr. Blumenau e à
minha pessoa. Por motivos óbvios, nem o Dr. Blumenau, nem eu como Padre
Católico poderíamos ser-lhe simpáticos. Por mais este motivo, receba os meus
cordiais agradecimentos pela maneira amiga com que se referiu à Igreja Católica
e ao Colégio São Paulo. Das objeções que tenho a fazer contra alguns pontos
referidos, apresento-as a seguir. E não me é possível omiti-las, porquanto,
dedicados amigos que somos, devo-lhe sinceridade.
Peço-lhe a gentileza de enviar um exemplar à minha irmã,
no seguinte endereço: Jacó Gülpen, Esquina Wall-e Mittelstrasse, em Aachen. A
conta, queira, por gentileza, enviá-la à Firma Brehm e Fontes, em Hamburgo,
onde ela será saldada.
Sendo que muito me interesso pelo bem-estar de sua
prezada família, teria muito prazer em o Senhor me honrar com uma
resposta, sobretudo quanto ao seu entendimento havido com Dr. Blumenau.
Guarde-me sempre em sua grata recordação, assim como
também eu não me esqueço do Senhor. Com alta estima e consideração, Seu Sincero
Amigo Pe. José M. Jakobs.
[sugestão para 2ª parte]
17. Sua Posição Honrosa
Em passado recente, um dos grandes comerciantes de
Blumenau assim falava a quem escreve estas linhas: "Pe. Jakobs, em geral,
realizou um grande bem à nossa Colônia. A ponto de fazer jus a um monumento”.
Para o Governo Imperial, ele era o seu Homem de Confiança
e, em geral, a sua palavra era a decisão. Era muito considerado nos meios do
Governo Provincial. Fato muitas vezes comprovado pelo Visconde Alfredo
Escragnolle Taunay.
Para as necessidades e interesses da Colônia, e
indiferente a diferenças de Religião -, ele sempre tinha os ouvidos atentos e
uma boa vontade decidida a auxiliar.
Foi assim que, em certa ocasião, Fernando Braatz veio ter
com ele. Encontrava-se em grandes apuros, pois devia pagar uma grande multa, e
sem ter como. Também achava que a Justiça não tinha sido muito correta com ele.
Apresentou o caso a Pe. Jakobs, que logo se dirigiu com ele à Câmara, e o caso
foi resolvido a contento para ambas as partes.
Por ocasião de uma Festa dos Atiradores, em Blumenau, Pe.
Jakobs perguntou ao Prof. Carlos Krämer: “Não seria interessante fazermos uma
rápida visita ao Clube?” Sem dúvida. Isso vai alegrar o pessoal", disse o
Professor. E para lá se foram eles. Dito e feito: a turma exultou, quando Pe.
Jakobs apareceu, e andava pelo jardim e, de mesa e mesa, cumprimentava os
conhecidos.
Ainda hoje, as pessoas mais antigas de Blumenau falam
entusiasmadas desse homem competente, ativo e desinteresseiro.
18. Seus
Problemas
O constante fardo de trabalho urgente é enervante. O
hábito de, por necessidade, resolver muita coisa em cima da hora, faz com que
a própria expressão da linguagem pareça lacônica e prepotente. Coisa que
alguns não podiam suportar.
O Inspetor Escolar, então conhecido como "Delegado
Literário": negou-se a dar ao Pe. Diretor o reconhecimento das listas de
alunos, exigido pelo Governo. Pois pretendia-se que o Colégio São Paulo
perdesse a subvenção anual. O então Deputado Estadual de Itajaí, A..., alcançou
o desiderato.
O jornal "Regeneração" (31/10/1886) assim
escreveu sobre o caso: "Para a nossa Província, era uma honra subvencionar
o Colégio do Pe. Jakobs, o qual já tanto benefício prestou à juventude. Mas os
conservadores odeiam-no: procuram contrariá-lo, e levar o seu Colégio à ruína.
Cortaram-lhe a subvenção, não alcançando, porém, o que pretendiam. Pe. Jakobs é
a tal ponto desinteresseiro que, não obstante os grandes sacrifícios, consegue
manter o seu Instituto. Não foi, pois, o espírito de poupança pública que negou
a subvenção, mas tão somente uma aversão perversa".
Aos 18 de junho de 1889, Pe. Jakobs escreveu ao Inspetor
Escolar de Blumenau em exercício: “Com a presente, comunico-lhe que ainda
continuo necessitado de seu certificado referente aos meses de fevereiro,
março, abril e maio do corrente ano. Já por três vezes enviei-lhe um dos meus
professores com o respectivo pedido. Mas o Senhor, toda vez, recusou-lhe
atendimento. Rogo-lhe, pois, remeter-me uma explicação oficial, por escrito,
sobre se o Senhor quer ou não quer dar-me o certificado referente ao magistério
do meu Colégio.
Acrescento, outrossim, que a Autoridade Provincial me
informou no sentido de que poderá efetuar o tal pagamento de subvenção, também
sem a assinatura do Inspetor Escolar; tal como já ocorreu no mês de janeiro.
Também lhe comunico o seguinte: a designação oficial do
meu Instituto não é "Escola Particular do Padre", mas "Colégio
S. Paulo, Blumenau".
Para seu conhecimento, transcrevo-lhe o artigo 27 das
Leis e Resoluções da Província de Santa Catarina de 1888, que reza: Foi
revogada a Lei 1132 de 22 de setembro de 1886 e, conseqüentemente, a subvenção
de 1:200$000 anuais para o Colégio São Paulo, Blumenau, dirigido pelo Pe. José
M. Jakobs, é novamente autorizada".
Posteriormente, o Inspetor Escolar foi substituído. Mas a
animosidade continuou a mesma. O novo Inspetor tinha os olhos vigilantes sobre
o Pe. Jakobs e seu Colégio. A República não mais respeitava os dias Santos da
Igreja Católica. Mas ao Pe. Jakobs cumpria-lhe guardá-los. De modo que, na
Festa da Anunciação de Nossa Senhora, o Vigário estava na sua Igreja. Às 8.30
horas, o Padre foi surpreendido com esta notícia: “O Inspetor Escolar está no
Colégio, e quer aplicar exames". Pe. Jakobs mandou avisar: "Só
poderei comparecer após a santa missa". Quando então chegou à Escola, o
Inspetor já desaparecera, fazia tempo, e esbravejando. De imediato, o Inspetor encaminhou queixa contra o Pe.
Jakobs.
A segunda reclamação ocorreu no 21 de abril, dia da morte
de Tiradentes. Pe. Jakobs somente recebeu à noite o respectivo Decreto de
feriado nacional. Mas o Inspetor Escolar enviou ao Governo Estadual a sua
queixa contra o Padre.
Também se formou um forte contraste entre o Superintendente do Município e
o Pe. Jakobs. Aquele era um médico bondoso, e benfeitor de pobres. Mas não
conseguia entender-se com o Vigário Católico. A razão residia na visão
divergente da Religiosidade.
O Superintendente iniciou um conflito por causa de uma faixa de terra da
Igreja, situada entre a Rua Principal e o Rio: que, mais acima, era estreita, e
se dirigia em declive para o leito do Rio. Mas que, sob o nº 53, pertencia, por
inteiro, ao terreno da Igreja. Ao lado deste terreno havia, a leste, uma
estrada, a qual, já perto do Rio, deveria alargar-se numa praça de porto. De
tal sorte, que uma destas linhas-limites seguiria obliqua, tocando e, em parte,
cortando o terreno da Igreja. Tudo ainda estava coberto de mata virgem.
Em 1885, Pe. Jakobs construiu o seu espaçoso Colégio. No lado
fluvial da Rua, ele mandou britar pedras. O Superintendente o multou em 20$000
Rs. O Padre logo pagou a multa, mas sob protesto.
Naquele tempo, ainda havia homens de valor que tomavam a defesa do Vigário.
Entre esses contava-se Henrique Reuter, de Indaial. Incumbido pelo Vigário,
viajou à Capital do Estado. No arquivo do Governo, encontrou esta confirmação:
o terreno sob nº 53 pertence inteiramente à Igreja Católica; também
aquela faixa de terra entre a Rua e o Rio. Sobre isso o Sr. Reuter providenciou
um certificado oficial, por ele entregue ao Pe. Jakobs. De modo que, aos 12 de
agosto de 1885, o Padre requereu e conseguiu a devolução daquela multa injusta.
Foi deplorável o conflito entre o Superintendente Dr. Bonifácio da
Cunha e o Padre Jakobs, em 1891. O Doutor mandou arrancar a cerca no
terreno da Igreja, situado à beira do Rio. O Padre logo mandou recolocar a
cerca. Esse jogo se repetiu algumas vezes. No dia 17 de outubro, apareceu o Dr.
Cunha com um policial, e mandou levar preso o trabalhador, a quem o Padre
encarregara de consertar a cerca. Pe. Jakobs estava presente, e se opôs à
prisão do seu empregado. Naturalmente, deve ter havido uma troca de palavras
pouco amenas.
Assim que, aos 19 de outubro, o Promotor Público, Francisco Antônio
Oliveira Margarida, encaminhou um processo contra o Vigário, e
determinou fosse aplicada a penalidade média contra o desacato à dignidade do
Intendente Municipal. Para a primeira audiência, foram convocadas as seguintes
testemunhas: Germano Baumgarten, Guilherme Murphy, Gustavo Baumgarten,
Frederico Rabe e Henrique e João Steinert.
Entrementes, porém, Pe. Jakobs encaminhou um requerimento seu para melhor
saber como defender-se. Também anexou um documento, pelo qual o Coletor
Estadual declarava que todo o terreno nº 53 pertence à Igreja. Além disso, o
Padre exigiu a convocação de 15 testemunhas. Inclusive o conhecido e competente
agrimensor Emílio Odebrecht, que afirmou o seguinte: "Eu pessoalmente medi
o terreno, e fixei os seus limites; e a faixa de terra entre a Rua e o e o Rio sempre dele fizeram parte”.
O mesmo testemunharam o arquiteto Henrique Krohberger, Guilherme Engelke,
Henrique Reuter e outros 11. De suas informações não foi possível deduzir que
Pe. Jakobs tivesse desacatado grosseiramente ao Superintendente.
De sorte que o Promotor e o Juiz tiveram que formular a absolvição do Pe.
Jakobs. Tal ocorreu aos 30 de outubro de 1891. Mas obrigaram o Vigário a pagar
as despesas exigidas pela ampla defesa.
Há exatamente um ano atrás, corria um processo de injúria, que Domênico
Adami, de Rodeio, movera contra Pe. Jakobs. Eis a situação então reinante. As
primeiras eleições republicanas estavam marcadas para 15 de setembro de 1890.
Na Carta Pastoral de 19 de março de 1890, os Bispos Brasileiros haviam
alertado os católicos para os seus deveres. No Rio de Janeiro, o Diretório
Geral do Partido Católico promovia uma forte propaganda no sentido de, olhos
fitos na Constituinte, fossem votados Deputados Católicos para o Congresso. No
Desterro, já havia um Diretório Central. E no dia 15 de agosto, Pe. Jakobs
fundou o Partido Católico em Blumenau. A essa lª Reunião compareceram 250
cidadãos. Todo entusiasmo, o Padre Vigário pronunciou o discurso de
esclarecimento. A seguir, conduziu a eleição do Diretório, que se constituiu
assim:
Presidente: Guilherme
Engelke.
Vice-Presidente:
Henrique Reuter.
1º Secretário: Elesbão
Pinto da Luz.
2º Secretário: Guilherme
Murphy.
Tesoureiro: João
Hostert.
Na manhã do mesmo dia, espalhou-se, com presteza, um
panfleto com a epígrafe:
Em cima da Hora,
ao Partido Católico.
O autor escondeu-se no anonimato. E assim se refere à Reunião Católica:
“O autor tentou, mediante colossal folha de papel, capturar patetas. Sua
conclamação serviu apenas para o geral divertimento".
A Fundação do Partido Católico, aliás, por ordem do Senhor Bispo, só provocou
inimizades contra o Vigário.
Um cara insolente compôs uma sátira, que foi cantada segundo a melodia do
“A ti, na Coroa da Vitória". Eis a 1ª estrofe:
“Maria da Assunção.
Está fundado um partido.
A Igreja em perigo,
Basta esclarecer os
bobos,
Eis o clamor da cleresia
Que faz barulhão".
A partir da Queda do Império, os novos dirigentes da Política temiam a
influência do Pe. Jakobs na grande massa popular. E espreitavam o momento asado
para enfrentar o Padre. Lamentavelmente, essa oportunidade lhes foi
proporcionada aos 14 de outubro de 1890, por ocasião da Festa de Nossa Senhora
das Dores, presidida pelo Padre Jakobs, no assentamento de Rodeio. Na sua
pregação, o Padre referia-se à obrigação de os católicos aceitarem as
exortações da Igreja, inclusive quanto ao direito de votar.
A seguir, o Vigário mencionou o caso de um colono que, na última eleição,
combatera vigoroso contra o Partido Católico, e que, há mais tempo, vivia
afastado da Igreja. Separando-se da Comunidade Eclesial, teria votado com a
Maçonaria, com a qual, observou, não deveriam manter relações.
Ao término da santa missa, Pe. Jakobs rezou, com a Comunidade, pela Conversão
desse extraviado.
Uma pregação que, certamente, não foi feliz. O referido colono, sem perda
de tempo, foi a Blumenau, e procurou o advogado Filipe Doerck contra o Pe.
Jakobs. No dia 27 de outubro, o Advogado já encaminhava o processo ao Juiz. No
dia 31, já ocorreu a 1ª audiência. Pe. Jakobs e seu advogado Paulo Schwarzer a
ela assistiram. Apresentaram-se três testemunhas adversárias, e que ainda falavam
a sua língua materna, o italiano. A ponto de ser necessário, a toda hora, um
intérprete intervir em perguntas e respostas.
A 2ª audiência teve lugar no dia 7 de novembro. E mais um adversário do Pe.
Jakobs veio como testemunha. A seguir, apresentaram-se 4 testemunhas de defesa.
Já no dia 13 de novembro, o Juiz Municipal, Dr. Manoel Cavalcanti de Arruda
Câmara, pronunciou a sentença segundo a máxima severidade permitida. Isto é:
três meses de detenção; multa, a ser paga depois da metade do prazo; e o
pagamento dos custos judiciários. A detenção prisional em Blumenau foi indicada
para expiar a pena.
Era natural que o Condenado não poderia concordar com tal sentença
judicial. O advogado Paulo Schwarzer encaminhou a apelação ao Juiz de Direito,
Dr. Pedro Celestino Felício de Araújo. E no dia 6 de dezembro, fez uma
excelente defesa. A partir dos autos presentes, ele provou claramente, que o
desacato, no sentido da acusação, não ocorrera. E que não constava um mínimo de
testemunhas para uma condenação.
O Juiz de Direito deu a sua sentença no dia 30 de dezembro de 1890. Em 11
extensas laudas, homologou a 1ª sentença, e obrigou o Pe. Jakobs a pagar,
inclusive, os custos judiciários da apelação, num total de 186$700 Rs. Sentença
que, somente aos 10 de fevereiro de 1891, foi comunicada aos advogados das duas
partes, por intermédio do Escrivão de Justiça, Fides Deeke.
Depois disso, parece que tudo foi sumindo na areia do esquecimento. Em todo
o caso, sabe-se, com certeza, que Pe. Jakobs não foi parar na prisão. Ainda
vive o advogado Filipe Doerck. Conta este que o condenado nem sequer pagou os
custos judiciários; e que ele, o advogado, em amigável encontro num jogo de
bolão, lhe chamou, gracejando, de "homem-pão-duro".
O 3º Processo contra o Padre causou-lhe muito desgosto. Mas acabou
num grande benefício para a vida da Igreja em geral. Tratava-se do seguinte:
“Pode o casamento religioso preceder o contrato civil?” O Estado de Santa
Catarina havia incluído em sua legislação a seguinte determinação: “O contrato
civil deve preceder o casamento religioso”. A Constituição Federal,
porém, deixava aos noivos a opção de quando ou em qual seqüência realizar
o casamento religioso e o contrato civil. De sorte que, aos 15 de abri de 1891,
o Ministro da Justiça dava um aviso claro sobre o cumprimento das leis.
Mas os juízes de Blumenau não aceitaram a referida explicação
oficial, e ameaçavam o Pe. Vigário com penalidades. Experiências desagradáveis
que o Padre tratou de comunicar à sua Autoridade Eclesiástica no Rio de
Janeiro, a qual entrou em contato com o Ministro da Justiça.
Aos 20 de junho de 1891, o Ministro enviou ao Governo de Santa Catarina um
ofício do seguinte teor: "Recomendo-vos que faça o Juiz de Direito de
Blumenau entender que o Casamento Religioso, de qualquer Religião, pode
realizar-se antes ou depois do Contrato Civil, de acordo com a opção dos noivos, sendo que o mesmo
já foi assim determinado pelo Aviso Circular de 15 de abril de
1891.”
(ass) Antônio L. Affonso de Carvalho.
Aos 8 de julho, o Governador do Estado, por sua vez, enviou o seguinte
comunicado ao Juiz de Paz de Blumenau: “Na presente data, faço saber ao
Juiz de Paz da Paróquia de Blumenau, que não lhe é permitido proibir o
Casamento Religioso antes do Contrato Civil”.
Aos 29 de julho de 1891, Pe. Jakobs recebeu do Governador o mesmo comunicado,
com a seguinte observação: "De igual modo, o Ministro da Justiça lhe assegura
que não precisa temer perseguição devido a casamentos religiosos".
Mas o Juiz de Blumenau não sossegava. Enviou o seu protesto ao Ministro da
Justiça no Rio de Janeiro. Argumentava no sentido de que um Ministro não tem
poder para alterar a Constituição de um Estado, que seria da atribuição do
Congresso. Então o Ministro, aos 28 de agosto de 1891, remeteu o referido
protesto, acompanhado de explicações, ao Congresso para resolver o caso.
Enquanto
isso, no dia 12/07/1891, a Autoridade Eclesiástica do Rio de Janeiro escreveu
ao Pe. Jakobs: "Vossa Revma. erra por consciência escrupulosa ou por
timidez. Nossa Constituição eliminou a cláusula segundo a qual o Contrato Civil
devia preceder o Casamento Religioso. Eis a razão de todos os Vigários
realizarem os Casamentos Religiosos de seus paroquianos, ainda que não haja
precedido o Contrato Civil. Ademais, o Ministro da Justiça,
aos 15 de abril, deu liberdade total aos noivos de escolherem quando fazer o
Casamento Religioso e o Contrato Civil. Com um Juiz como o de Blumenau, seria
o caso de V. Revma. nem mais falar com ele nenhuma palavra sequer”.
Numa situação como esta, seria de supor-se que Pe. Jakobs pudesse,
despreocupadamente, realizar casamentos religiosos em sua Paróquia. Ledo
engano. O Promotor e o Juiz de Direito se prendiam a este fio de segurança: o
Estado de Santa Catarina ainda não havia revogado a sua prescrição.
Já no fim de novembro de 1891, Pe. Jakobs visitou as Capelas de Ascurra e
de São Paulo, voltando aos 2 de dezembro. Mas tão esgotado, que lhe foi impossível,
no dia seguinte, rezar a santa missa.
Enquanto isso, o Promotor Francisco Margarida vigiava o Padre. Resultado:
haviam sido realizados dois casamentos sem anterior Contrato Civil.
Notadamente: no dia 11 de agosto, o casamento de Augusto Radke; e no dia 23 de
novembro, o de Henrique Baader. De sorte que, no dia 5 de dezembro, entregava
ao Juiz de Direito a sua acusação sobre o caso. E alvitrou aplicar ao Vigário a
pena máxima que o caso facultasse.
Dentro em pouco, seguiu-se o interrogatório das testemunhas. Miguel Schmitz
ainda acrescentou que o Pe. Jakobs teria falado no púlpito, por duas vezes, que
os noivos fizessem, primeiro, o Contrato Civil.
Augusto Radke esclareceu o seu caso assim: Com o Juiz de Paz, ele tinha
acertado o Contrato Civil para o dia 9 de agosto de 1891; e o Casamento
Religioso para 11 de agosto, às 6.30h. da manhã. No dia 9, ele se apresentou ao
Juiz de Paz com a noiva e as testemunhas. Mas a autoridade estava ausente. Então
o casamento foi adiado para 11 de agosto, às 6.30 hs. Pontualmente, os noivos
compareceram. Mas faltava o Escrivão. De maneira que, um pouco antes das
6.30 hs., o noivo Radke dirigiu-se à Paróquia, explicando ao Juiz de Paz: “Não
quero fazer o Vigário esperar. Faremos, pois, o Contrato Civil depois". E
o Juiz de Paz concordou.
Henrique Bocader confirmou: no dia 23 de novembro ele se casou no religioso,
e iria fazer o Contrato Civil em futuro próximo, caso dispusesse dos meios.
Aos 11 de dezembro de 1891, Pe. Jakobs foi intimado para a audiência, e
três testemunhas tiveram que entregar as suas declarações.
No dia 18 de dezembro, apareceram mais três testemunhas. A principal
audiência para o Padre teria lugar no dia 23 de dezembro. No dia seguinte, Pe.
Jakobs entregou a sua defesa por escrito. Nesta ele aduziu o Aviso do Ministro
da Justiça e a explicação do Presidente do Estado, bem como uma lista de nomes dos
noivos que haviam, todos eles, realizado o Contrato Civil antes do
Casamento Religioso. Mas nada disso tinha valor para o Promotor
Margarida. Daí a razão de ele, no dia 14 de janeiro de 1892, entregar o seu
parecer, e exigia, para o Vigário, a pena máxima que o caso permitisse.
O Juiz Dr. Manoel Cavalcanti de Arruda Câmara pronunciou a sua sentença aos
9 de fevereiro de 1892. Determinava pena de prisão carcerária, mas que
poderia ser comutada pelo pagamento de 1:200$000 Rs. Aos 10 de fevereiro de
1892, o escrivão de Justiça, Fides Deeke, recebeu do Juiz ordem de intimar o
Vigário ao pagamento da pena, e de levá-lo preso de imediato, caso não
efetuasse o pagamento. Acompanhado de um soldado, o Escrivão se dirigiu à Casa
Paroquial. Encontrou o Padre, e mostrou-lhe a incumbência do Juiz.
“Eu não pago”! respondeu Pe. Jakobs. “E não me entrego livremente. Só dominado
e amarrado, poderão arrastar-me para a prisão"! Desolado, Fides foi à
procura de três soldados corajosos e fortes. Com estes voltou à Casa Paroquial,
mas sem encontrar o Vigário. Pois ao Escrivão de Justiça, ele havia claramente
expresso o seu protesto, quando este lhe comunicou a ordem de prisão, ou de
pagamento exigido pelo Juiz. O Padre imediatamente saiu do Centro Urbano e se
dirigiu à Indaial. À noite, encontrou-se com Henrique Reuter. Como sempre, foi
por ele bem recebido. Na manhã seguinte, cedinho, Reuter o conduziu pelo
Córrego da Pedra à casa de Alexandre Tarnowsky, na Estrada da Areia. Pe. Jakobs
estava sem batina. Chapéu grande, e lenço vermelho ao pescoço, tornava-se um
tanto irreconhecível.
Chegado à Estrada da Areia, o Padre mandou um estafeta a alguns tiroleses e
italianos de Rodeio e de São Paulo, com o recado de que, no sábado, dia 13 de
fevereiro, lá chegaria em busca de segurança pessoal.
João Buzzi, Valentim Fruel, Antônio Moser, Carlos
Depiné e outros 9 homens vieram ao seu encontro em Warnow, e o conduziram à
espaçosa casa de Buzzi, em São Paulo.
Nesta casa, o Vigário permaneceu até o dia 1º de março. Dia e noite, 90 a
120 homens montavam guarda. A grande pastagem pertencente à família Buzzi virou
um pequeno acampamento. Na casa, um quarto foi transformado em Capela. Diariamente,
Pe. Jakobs aí celebrava a santa missa, pregava e administrava os santos
Sacramentos. No Livro de Batizados constam 40 crianças, por ele então batizadas
entre 18 e 28 de fevereiro.
No Centro Urbano de Blumenau, logo deram pelo desaparecimento do Vigário,
mas sem descobrir-lhe o rastro. Um comerciário, que viajava pela Colônia para
comprar milho por atacado, de Gilsá, foi quem por primeiro trouxe para Blumenau
a notícia certa do seu paradeiro. Em Blumenau, muita agitação. Faziam-se
deliberações sobre a melhor estratégia de capturar o Padre. Foram convocadas
pessoas da Colônia e, no dia 28 de fevereiro, tiveram de viajar para Ascurra -
São Paulo.
Em meio a esses "caçadores” havia anti-clericais de diversas nações. E
um número de Suecos: imigrados não fazia muito, e dos quais a maioria nem
conhecia o Padre. Mas foi-lhes descrito como um desprezador da Lei e perturbador
da Ordem. De modo que a muitos o arrazoado convencia. Também lhes prometeram um
pagamento diário de 5$000 Rs.
Por sua vez, também Pe. Jakobs queria descobrir como andavam as coisas.
Enviou Tranqüilo, filho de Buzzi, com uma carta a Blumenau, a ser
entregue a seu amigo Elesbão Pinto da Luz. Pelas 8 horas da noite, o garoto
chegou em Indaial, e queria dar trato ao cavalo. Mas Gustavo Bürger o
reconheceu, e o ameaçou, aos gritos, que deveria ser preso. O jeito foi o
estafeta montar o cavalo e prosseguir viagem. Pela meia noite, chegou lá.
Elesbão logo escreveu uma carta ao Padre, e o garoto, são e salvo, lhe fez a entrega.
A família Reuter mandou, por duas vezes, durante a noite, o seu filho
Francisco a São Paulo para transmitir ao Padre cartas e notícias.
Enquanto isso, aos 28 de fevereiro, o Juiz de Blumenau havia redigido uma
nova ordem de prisão, a qual entregou ao Serventuário da Justiça Werner. Este
levou consigo seu colega Jahn. Seu carro-chefe puxava 28 carroças, que
transportavam mais de 100 homens empenhados no singular empreendimento
"venatório".
Para um descanso ao meio dia, a excursão chegara a Indaial. Todos de
comportamento bem sério e mudo, nada revelavam do objetivo da viagem. Mas a
chegada de tantas carroças chamava a atenção. O jovem Francisco Reuter, de 16
anos, levado pela curiosidade, foi lá e contou as carroças. Isso despertou a
suspeita no pessoal. O garoto foi preso e metido na cadeia até tarde da noite.
A viagem prosseguiu até Warnow. Na travessia do Rio, o pessoal teve a
grande ajuda de Fernando Braatz. Os Senhores Dr. Hercílio Luz e Promotor
Margarida acompanharam a "tropa" a fim de evitar excessos. Mas
ficaram do lado de cá do Rio.
Na propriedade de Fernando Braatz ocorreu o "conselho de guerra".
Resolveram o seguinte: Um dos participantes, melhor versado em polonês do que
em alemão, iria sozinho até a casa dos Buzzi, e fazer de conta que viera
trazer ao Padre uma notícia de seu mui prezado amigo Guilherme Engelke. Traição
que lhe renderia 50$000 Rs. Braatz partiu. E chegou, já perto da noite, no
"acampamento" dos Buzzi. "Queria falar com o Padre", disse
ele à sentinela.
O traidor foi conduzido à casa, e logo recebido amigavelmente pelo Padre. O
"amigo" lhe disse o seguinte: A esposa de Gruilherme Engelke, falando
em polonês, o tinha encarregado de comunicar ao Padre que não havia perigo
algum para ele. E que em Blumenau, ninguém pensa em persegui-lo. Guilherme
Engelke não lhe queria escrever uma carta, porque seria perigoso, até podendo
cair em poder da polícia.
Alegremente, Pe. Jakobs abriu a janela e exclamou: "Gente amiga, aproximem-se!
Todos podem ir para casa. Não é mais necessário ficarem de plantão"!
- Alguns perguntaram: "Como o Senhor ficou sabendo"?
- "Da parte de um fiel amigo, Guilherme Engelke".
- "Ainda permaneceremos aqui até amanhã cedo. Pois agora já é quase
noite. E uma guarda-noturna a mais não nos faz diferença".
- "Não! respondeu o Vigário. "Vocês já agüentaram aqui fielmente
durante 16 dias e 16 noites. Isto é o bastante. Eu agradeço a vocês de todo o
coração. E dou-lhes, neste instante, a minha bênção sacerdotal".
O pessoal se ajoelhou, e o Vigário rezou emocionado: "Desça sobre vós
a bênção de Deus Todo-Poderoso: do Pai, do Filho e do Espírito Santo”!
A seguir, todos se aproximaram e estenderam a mão ao Padre. A maioria
chegou a dizer-lhe: "Assim que, novamente, precisar de nós, estaremos a postos. É só nos avisar".
Pe. Jakobs acompanhava com o olhar os homens que se retiravam. Também eles,
quando já mais distantes, olhavam para trás e acenavam.
Depois dessa despedida, o Vigário pediu à Senhora Buzzi que preparasse um
jantar para o mensageiro. Isso foi prá já. Pe. Jakobs, em conversa com o
Braatz, soube que ele mora na Nova Picada do Ipiranga. E fez-lhe a proposta de
pernoitar na casa dos Buzzi. No dia seguinte, um dos filhos Buzzi poderia
indicar-lhe um caminho mais curto, pelo mato, até Ipiranga. "Não",
respondeu ele. "Isso eu não posso fazer. Ainda hoje preciso chegar até o
Grande Rio, porque lá deixei a minha bagagem".
O Padre nele acreditou. E dele se despediu com sinceras palavras de agradecimento.
Com a família Buzzi, ainda passou uma agradável hora da noite. Depois, todos se
recolheram.
Era natural que a quadrilha anticlerical, alojada na serraria de Fernando
Braatz, no Tamandoá, aguardasse ansiosa a volta do estafeta. Finalmente, o
ansiosamente esperado apareceu, e trouxe a tão almejada notícia, que a todos
deixou eufóricos.
Chegara, pois, o momento do 2º "conselho de guerra". Foi
resolvido que, após a meia noite, sob a chefia de Fernando Braatz, e o mais
silenciosamente possível, fossem até a casa dos Buzzi, e a cercassem. Alguns
homens formaram a vanguarda, e tinham por tarefa afugentar os cachorros. E tudo
deu certo. Pelas 2 da madrugada, os destemidos heróis haviam alcançado o
objetivo. Eles se mantinham bem silenciosos, armas em punho, prontos para abrir
fogo.
Eram 4 horas da madrugada. A filha maior do Buzzi foi à cozinha. Pretendia
ir ao pasto e tocar as vacas para a estrebaria e tirar leite. Mas à porta da
casa dirigiam-se alguns canos de espingarda para o seu peito. E o Auxiliar de
Justiça Werner lhe falou assim: "Ninguém sai de casa. Nós viemos prender
o Pe. Jakobs". A moça correu para os seus pais e disse-lhes: "A nossa
casa está cercada".
Todos da casa se levantaram apressados. Os filhos maiores olharam do andar
de cima para os lados, e descobriram um numeroso poder policial que controlava
fortemente os acessos da casa. Impossível qualquer fuga.
Falaram com o pai dela, que foi falar com o Pe. Jakobs, a quem expôs a
situação. "Como Deus quiser!” respondeu ele. Vestiu-se às pressas, abriu a
janela e gritou para fora: "Fariseus! Escrevei o meu crime na minha testa,
se algum conheceis”!
O Servente da Justiça Werner se aproximou, mostrou-lhe a ordem do Juiz, e
acrescentou: "O Senhor não tem condições de fugir. Por isso, não nos crie
problemas”.
O Padre, vendo-se numa situação sem saída, veio até a porta da casa. Nisso
apareceu um negociador de gado, preparado para laçar o Padre. Mas assim que o
atrevido começou a girar o laço, assomaram à janela do andar de cima os
dois filhos do Buzzi, de espingarda na mão, e gritando com ele: “Homem, abaixa
o laço! Do contrário, tu não sairás vivo deste pasto!" O laçador olhou
para cima, encarou os rostos ameaçadores dos dois moços, e achou melhor
desistir.
Apressado, Pe. Jakobs foi-se despedindo da boa família Buzzi, e lhe
agradecia com lágrimas nos olhos.
A Sra. Buzzi, que viveu até 1929, assim falou ao Padre na hora da
despedida: "Nosso Bom Deus não vai abandoná-lo. Nós rezaremos pelo
Senhor". Já no terreiro, o Padre deveria andar a pé entre os dois
Serventuários da Justiça: Werner e Jahn. Mas o velho Buzzi não o permitiu.
Chamou um de seus filhos, mandou que depressa fosse ao pasto, pegasse um
cavalo, o selasse, e o pusesse à disposição do Padre; e mandou que seu filho o
acompanhasse até a travessia do Itajaí.
Na casa de Schultz, já na margem direita do Itajaí, o bando vitorioso tomou
café. Aqui se associaram a eles os senhores Hercílio Luz e o Promotor
Margarida, dizendo ao Padre que acompanhavam a expedição para proteção dele. A
seguir, foram atrelados os cavalos. A viagem de retorno para Blumenau começou
com grande algazarra da “tropa”. Também durante o trajeto o vozerio se repetiu
mais vezes. E chegou a ser tanto, que Dr. Hercílio Luz teve de chamar à ordem a
barulhenta gentalha. O Padre viajava na 5ª carroça.
Pelas 11 horas, a “tropa” aproximava-se de Indayal. Próximo à ponte, estava,
de pé, a Sra. Heinrich Reuter que, por palavras e gestos, fez parar os
"expedicionários". Ela se referiu à "horda covarde", e
exigiu que Pe. Jakobs pudesse entrar em sua casa, onde ela queria oferecer-lhe
comida e bebida. Isto lhe foi concedido. Também os "covardes" de
Blumenau mataram a fome em Indayal.
Às 4 horas da tarde, havia chegado o momento importante para Blumenau: o da
ruidosa entrada dos anticlericais com o seu tão procurado Prisioneiro.
Na ocasião, Francisco Frankenberg, professor do Colégio São Paulo -, viajou a
cavalo até Altona. Quando Gustavo Bünger o avistou, largou o seu cavalo na
direção do Professor, com o propósito de barrar-lhe o caminho a Blumenau. Mas o
Professor logo atinou com o propósito do "muy amigo", e dirigiu o seu
cavalo para outra direção. Deu-se então uma corrida hippica, da qual saiu
vitorioso Frankenberger. O Professor logo se dirigiu à Câmara. Podendo, pois,
em companhia de muitos outros, ser testemunha da mais ignominiosa cena jamais
presenciada por Blumenau.
Na Câmara, o Juiz Dr. Manoel Cavalcanti de Arruda Câmara aguardava a quem
ele havia condenado. Aliás, contra o Aviso do Presidente do Estado e contra
o Ministro da Justiça. Pe. Jakobs foi realmente conduzido à presença dele.
E o Serventuário da Justiça Werner declarou oficialmente a condenação do
Vigário. O qual teve de assinar que lhe fôra apresentada a sentença condenatória.
Quando o Juiz o interrogou sobre o que pensava a respeito da sentença, o
Padre respondeu: “Eu lanço o meu protesto contra o Processo, contra a
Sentença e contra a Condenação: E dirijo-me agora ao Telégrafo, e farei
denúncias no Rio e no Desterro!”
E sem dar satisfação a ninguém, saiu da Câmara. E ninguém da irada multidão
tentou barrar-lhe o caminho. Entrementes, numerosos católicos entraram na
Câmara. Os suecos reclamavam, em voz alta, o reconhecimento de seu empenho
nessa captura, e que o Padre fosse levado à cadeia. Os católicos responderam:
"Isto lhes custará caro! Não deixaremos encarcerar o nosso Padre”!
Esta linguagem o Promotor a entendeu bem, e a sua coragem sumiu de todo. Na
sua acusação, ele propusera a penalidade máxima contra o Padre. No debate entre
os amigos e inimigos do Vigário, fizeram-se ouvir sugestões diversas. Entre
outras, também esta: "Matem o Margarida"! Esta, sem dúvida, lhe
chamou a atenção. Sabia ele que sofreria na pele alguns arranhões ou galos. Era
só começar o ataque dos católicos. Por isso, o Margarida escreveu nas atas
judiciais: "Sou de parecer que se omita a pena carcerária; exigindo somente
a pena pecuniária".
Logo após, Pe. Jakobs voltou do Telégrafo. E o Juiz lhe formulou a
pergunta, se ele “Concordaria em pagar a soma de 1:200$000 Rs. E o Padre
respondeu: "Nunca, jamais!"
Agora os apuros se agravaram. Cresciam ameaçadoras as divergências entre os
dois partidos. Era de bom conselho providenciar o encerramento da sessão.
Ao Senhor Pedro Cristiano Feddersen, a perseguição do Pe. Jakobs sempre lhe
pareceu injusta e infame. Por isso, escogitou uma saída. Juntamente com Dr.
Hercílio Luz, ofereceu, em consignação, a soma exigida. Pois tinha a certeza de
que, nas instâncias superiores, o Processo seria anulado.
Neste sentido, Feddersen dialogou com Pe. Jakobs. E o Padre acabou
aceitando a proposta. De imediato, foram assinados os documentos, e o Padre foi
declarado livre, e levado de trole à Casa Paroquial. Aos anticlericais desta
cena, alegou-se o seguinte: "Amanhã é Quarta-Feira de Cinzas. E o Vigário
tem a obrigação de estar na sua Igreja. Fomos obrigados a agir deste
modo".
Lá fora, diante da Câmara, muitos davam largas aos seus sentimentos. Os
suecos e outros indivíduos xingavam. Alguns partiram para provocações. Nos Holetz,
o caso teria chegado a uma verdadeira pancadaria. Também andou-se à procura de
quem prometera 5$000 Rs. por dia, mas tudo em vão.
Famintos, cansados, contrariados, com uma farpa no coração e, em parte, com
galos na cabeça -, lá se iam embora os anticlericais. Tais foram, em 1892, os
acontecimentos da terça-feira de carnaval em Blumenau.
Tarde da noite, Pe. Jakobs ainda estava em seu quarto. De repente, um
tímido bater na sua porta. O Padre levantou-se,e foi atender. Era Fernando
Braatz. Aquele que, com tanto destaque, tomara parte na sua prisão. Todo
contrito, qual pobre pecador, lá estava ele a gemer:
- Senhor Padre, eu tenho medo.
- De quem?
- Dos meus vizinhos. Dos italianos de São Paulo. Quando eu chegar em casa,
os italianos, furiosos, me vão matar a pauladas.
- Não, disse o Padre. Isso não vai acontecer. Eu conheço o meu povo.
Dou-lhe uma carta, e poderá estar tranqüilo.
Realmente, o Padre escreveu uma carta ao João Buzzi, esclarecendo que
Fernando Braatz: sua pessoa e sua propriedade -, estavam sob a sua proteção. E
que ele, Buzzi, desse o aviso a todas os vizinhos. E ao homem angustiado, assim
falou: "Agora pode ir em paz. Ninguém lhe fará mal”.
Envergonhado, o homem desapareceu na escuridão da noite.
Duas testemunhas oculares da vergonhosa audiência havida no edifício da
Câmara de Blumenau, em data de 1º de março de 1892 -, redigiram, mais tarde, um
relatório para o Arquivo do Convento Santo Antônio. No qual I.de N. escreveu:
“Pe. Jakobs estava cercado de inimigos furiosos. Mas ele os dominou a todos por
sua bravura de homem. Não se comportou como prisioneiro. Destemido, dirigiu-se
ao Telégrafo. A agitada multidão abriu-lhe passagem, e assim também retornou”.
A outra testemunha escreveu: "Da parte dos antigos colonos, que conheciam
Pe. Jakobs, ninguém se prestou a ir contra ele. Em compensação, e mediante
mentiras e calúnias, foram instigados contra o Padre os recém-imigrados suecos.
Vários blumenauenses detestaram e criticaram essas ações escandalosas contra um
homem que eles aprenderam a estimar.
Na Sala da Câmara, realizou-se uma discussão muito agitada. Os suecos
exigiram que Pe. Jakobs fosse mantido na prisão. Os brasileiros protestaram.
Foi difícil acalmar os ânimos.
Durante todo esse tumulto, Pe. Jakobs manteve-se inteiramente calmo e destemido.
Não tivesse estado em jogo uma descomunal humilhação nessa repugnante cena -,
e dir-se-ia tratar-se de uma palhaçada carnavalesca”.
Posteriormente, os participantes mais destacados do aprisionamento do Padre
não mais foram bem sucedidos. Fernando Braatz sofreu vários prejuízos. A morte
ceifou cruelmente na família dele. Pouco depois, morreu a mulher. Casou-se
novamente, e muito em breve faleceu a 2ª mulher. Casou-se mais quatro vezes.
Entristecido e amargurado, vendeu a sua propriedade, já muito endividada. Ele
teria emigrado para o Chile, via Argentina. E desapareceu.
19. Conseqüências do Processo
No dia 2 de março de 1892, Pe. Jakobs trabalhava na sua Igreja Paroquial.
Muitos fiéis vieram à Igreja, pois era Quarta-Feira de Cinzas. Havia também os
que desejavam vê-lo, depois de tantos sofrimentos. Antes da Santa Missa, o
Padre realizou a Bênção das Cinzas. Também em si mesmo fez esse sinal de
penitência. Será que ele pressentia ser esta a sua última celebração das
Cinzas? Creio que sim. Pela manhã cedo, sentiu mais vezes um acesso de
fraqueza. Mas conseguia vencê-lo com sua singular energia. Deu início à santa
missa e, após o Evangelho, fez uma breve pregação. Todos os olhares voltavam-se
para ele. Apreensivos, os fiéis notaram quão pálida se tornara a sua
fisionomia, e quanto a sua voz, sempre melodiosa e forte, agora tremia fraca e
insonora.
Quando quis iniciar o ofertório, teve de fazer uma parada. Sobreveio-lhe
uma indizível fraqueza. Teve que apoiar-se no altar. O rosto, marcado de uma
palidez mortal. A seguir, a boca vertia sangue. Sem forças, desmaiou diante do
altar: a significar um sermão de grande poder. Foi conduzido para a sacristia,
e desparamentado. Carregaram-no para a Casa Paroquial, e alguém chamou o
médico.
Alguns fiéis faziam na igreja piedosas orações pelo seu Pastor gravemente
enfermo. Outros, que haviam tomado parte nas injúrias contra ele, sentiam-se
profundamente envergonhados. Seus perseguidores levaram um grande susto,
andavam confusos, de um lado para outro, e não tinham mais adeptos. De maneira
que, até a sua partida de "Blumenau, os inimigos deixaram o Padre em paz.
Foi este o primeiro resultado positivo do inglório processo.
O segundo resultado positivo estendeu-se ao Brasil todo: a
condenação e a prisão do Pe. Jakobs despertou geral indignação. No dia 8 de
março de 1892, o Presidente da Justiça de Apelação do Desterro, Desembargador
José Roberto Vianna Guilhon, em extenso documento, declarou o Processo
contra o Pe. Jakobs nulo, sem efeito algum; e a sua prisão ilegal.
Documento que foi assinado pelo Presidente, Dr. Elysio Couto e pelo Dr. Beltrão
Pacheco d’Ávila.
O Documento sobre a imediata libertação do Padre foi lavrado aos 11 de
março de 1892, pelo Escrivão Leonardo Jorge de Campos, e assinado pelo
Presidente. Aos 12 de março, a Decisão foi remetida ao Juiz de Direito da
Comarca de Blumenau, com a ordem de execução imediata.
Exatamente uma semana após, aos 19 de março de 1892, o Juiz Municipal, Dr.
Manoel Cavalcante de Arruda Câmara, teve de lançar em suas Atas Processuais o Cumpra-se
o Alvará.
Os Senhores Cristiano Feddersen e Dr. Hercílio Luz puderam reaver o seu
dinheiro deixado em consignação. Coube ao Município pagar os custos judiciais.
A explicação do Supremo Tribunal do Desterro foi publicada em todos os jornais
oficiais, livrando, pois, o mundo de muitas polêmicas inúteis.
Depois disso, reinava, em toda parte, a seguinte clareza: O Casamento
Religioso e o Contrato Civil podem realizar-se segundo a opção dos
Noivos.
O terceiro resultado positivo deu-se em benefício pessoal
do Pe. Jakobs. Notadamente, assim: Doravante, ele era um homem alquebrado.
Suas forças sumiam a olhos vistos. Um homem que caminhava para a
sepultura. A esse respeito, assim se expressou o Jornal de Blumenau de 20 de
agasto de 1892:
“Nos últimos tempos de sua permanência em Blumenau, Pe Jakobs foi vítima
de muitas perseguições e insultos. Segundo toda a probabilidade, reside
aí a causa de sua morte”.
20. Pe. Jakobs e os Franciscanos
No Rio de Janeiro residia o alemão lazarista Pe. Hehn -, um fiel amigo do
Vigário de Blumenau. Ambos mantinham seguidas correspondências epistolares. Foi
por seu intermédio que Pe. Jakobs, em 1891, logo soube da chegada dos primeiros
franciscanos alemães, dos quais Pe. Hehn fôra o orientador e conselheiro na Capital
da Nação.
Por solicitação do Pe. Francisco Topp, vieram os seguintes Religiosos: Pe.
Amandus Bahlmann (agora Bispo de Santarém, no Pará), Pe.Zeno Wallbröhl, Pe.
Lucinius Korte, Pe. Fistus Meiwes e os Irmãos Hubertus Themanns e Mauritius
Schmalohr. Dirigiram-se eles para Teresópolis (SC). Naquela pequena Casa
Paroquial, fundaram a sua primeira Comunidade. Dentro em pouco, estenderam as
suas atividades para Lages.
Pe. Jakobs enviou ao Pe. Amandus uma extensa carta, descrevendo-lhe a sua
Paróquia e seus trabalhos escolares; e fez-lhe um pedido insistente, no sentido
de uma ajuda. A qual veio no exato momento em que mais dela necessitava.
Foi num domingo, no dia 13 de março de 1892, um pouco antes da 2ª missa -,
quando chegaram três Franciscanos: Pe. Amandus (o Superior da Missão), Pe. Zeno
e Pe. Lucinio. “Madame Murphy" nunca dantes tinha visto monges dessa
espécie. Apressada, correu ao Vigário e lhe anunciou em seu dialeto: “Tua
visita lá. Três gente. Não sei se homens ou mulheres". O Padre correu os olhos,
e logo reconheceu os aguardados missionários. Agora ele podia respirar
aliviado. Já no dia 14 de março. Pe. Amando visitou a Capela do Encano. Pe.
Lucínio esteve no Rodeio I e no Rodeio II, nos dias 16 e 17 de março. Pe. Zeno permaneceu com o Vigário na Sede
Paroquial, e assumiu os trabalhos da Igreja e da Escola. O esgotado Vigário
tinha agora condições de, com tranqüilidade, preparar a sua viagem de
despedida. Da autoridade eclesiástica do Rio de Janeiro, logo obteve a
necessária autorização.
Somente uma viagem, o Vigário ainda fez pelo interior mais distante. No dia
12 de maio, na Capela de Rodeio II; no dia
13, em Rodeio I. Visitou
também a família Buzzi, agradecendo, uma vez mais, os seus fiéis amigos. Deles
se despediu até o reencontro no céu.
No dia 14 de maio, esteve na Capela do Rio Morto. No dia 15, na Capela de
São Bonifácio, no Encano. Muitos fiéis acorreram para, pela última vez, ouvirem
a palavra do seu zeloso Vigário. Que pregava sobre o valor da Fé e a
importância da educação religiosa dos filhos. Ao que a Comunidade respondeu com
o vibrante canto: “Fiel guardarei minha aliança batismal, quero seguir a
Igreja”.
No final da santa missa, o Padre ainda falou assim: “Que todos possam viver
na santa Fé Católica, ter sua morte feliz e alcançar no céu a recompensa
eterna”.
- Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!
E os fiéis responderam:
- Para sempre seja louvado!
No dia 22 de maio, domingo, a Igreja-Matriz estava apinhada de fiéis. Todos
sabiam que, neste dia, Pe. Jakobs faria “o sermão de despedida”. Pela última
vez, subiu ao púlpito. Primeiro, proclamou o Evangelho do “amigo importuno” (Lc
11,5-13). Em especial, salientou as palavras: "Pedi, e recebereis; buscai,
e achareis; batei, e abrir-se-vos-á (...). O Pai celestial dará o Espírito Santo
aos que lhO pedirem”.
Em seguida, relatou-lhes como, a
1º de fevereiro de 1876, em Roma, ele pedira ao Representante de Cristo, a
bênção para si e a sua Paróquia de Blumenau. E como ele, daí por diante, nunca
deixou de pedir, diariamente, a Proteção Divina. E Deus ouviu a sua prece. Nos
16 anos que viveu em Blumenau, foi-lhe necessário trilhar o caminho da cruz e
do trabalho. Sinal evidente da benevolência divina. Não lhe faltou a bênção do
Céu. O Colégio São Paulo surgiu em meio a grandes dificuldades, e comprovou-se
como um viveiro da Fé. Dele já surgiram sacerdotes e religiosos.
Muitas vezes, em suas orações e meditações, o Vigário suplicou a Deus: “Enviai,
Senhor, operários à Vossa Messe”. Pedido esse que Deus atendeu. E justo na hora
em que ele sossobrara sob o peso do trabalho. Pois Deus lhe enviou os Religiosos
Franciscanos, que assumiram a sua obra e, com forças redobradas poderiam
dar-lhe continuidade. Por isso, agradece a Deus de todo o coração, e parte, com
confiança, para o futuro.
Depois disso, pediu aos fiéis que praticassem a oração cotidiana, e se mostrassem
dignos dos benefícios divinos. A prática fiel da Religião no seio da Família
seria uma rica fonte de bênçãos. Que evitassem o casamento misto, pois que ele,
lenta, mas certamente, levaria à extinção da luz da Fé, e à total perda da Fé.
Nem seria necessário aduzir exemplos. Porquanto, devido ao casamento misto,
alguns nomes de famílias desapareceram por inteiro dos Livros Paroquiais. No
final, passou a tratar da renovação solene das Promessas do Batismo, falando
com ênfase: Eu, como Vigário de vocês, responsável por vocês ante o Trono Deus,
dirijo-lhes, em nome de Deus, estas perguntas:
- Vocês crêem em Jesus Cristo, que é a 2ª Pessoa da Santíssima Trindade, e
nosso Salvador?
- Vocês crêem na Santa Igreja Católica, na condição de Coluna da Verdade
Divina e Dispensadora de Graças Divinas, através dos Santos Sete Sacramentos?
- Vocês querem viver e morrer na Santa Fé Católica? Enternecida, séria e
solenemente, a Comunidade respondeu:
- Sim! Nós queremos!
- Essa boa vontade, eu a recomendo ao Pai Celestial, a quem o Evangelho de
hoje se refere. Que Ele nô-la conserve, e nos conceda a Alegria de todos nos
revermos ante o Trono de Deus. Neste sentido, faço a prece: “A benção de Deus
Todo-Poderoso, do Pai, do Filho e do Espírito Santo desça sobre vocês e
permaneça com vocês para sempre!”
Os dias seguintes foram reservados à preparação próxima da viagem
definitiva. Com os Fransciscanos ele ordenava a transferência de tudo quanto
considerava propriedade pessoal. Tendo agora muito tempo disponível: podia
perceber, com crescente nitidez, a decadência de suas forças e a sua muito
debilitada saúde. Anteriormente, pressionado pelo trabalho, não lhe era
possível dar-se a essas observações, ou pelo menos não a contento.
Nessas últimas semanas, seu amigo, o médico Dr. Wigang Engelke, visitava-o
com assiduidade, dando-lhe seus conselhos médicos. Reconheceu ele não ser
aconselhável o estimado Pastor viajar sozinho. Daí, determinar que seu filho
Leopoldo fosse companheiro de viagem do Padre. Pelo menos, até o Rio de
Janeiro.
Na Festa de Corpus Christi, 16 de junho de 1892, Pe. Jakobs pegou o barco a
vapor. Seus vizinhos, Gustavo Baumgart e Grewsmühl, haviam chegado à Casa
Paroquial e tinham-se despedido. Francisco Scheidemantel acompanhou-o até o
barco. Ninguém mais do Centro Urbano.
Foram muitos os católicos que vieram para a Festa de Corpus Christi, e todos
acompanharam o Padre até o porto. Amigavelmente, cumprimentou-os a todos pela
última vez, e embarcou.
Olhava para a multidão de seus ex-paroquianos. Prestava atenção ao tocar
dos sinos, que convidavam para a missa cantada. E foi dominado pela emoção. O
homem forte chorou, quando o barco se pôs em movimento, separando-o, para sempre,
do seu campo de apostolado. Lugar onde vinha de deixar o melhor de sua energia
de homem, do seu zelo pelas almas e da bondade do seu coração. A sua despedida
foi qual pôr-de-sol, com seu clarão continuado pelo vasto firmamento.
Quarenta anos já são passados, e a sua lembrança continua viva. Queira Deus
que não se extinga jamais.
A 1º de agosto de 1892, Pe. Jakobs faleceu no Hospital da Gamboa, no Rio de
Janeiro. Suas últimas palavras teriam sido "Blumenau! Blumenau!”
Assim que notícias mais completas aparecerem sobre o falecimento desse
Sacerdote de tanto zelo missionário -, elas serão publicadas neste Indicador
de Rumo. Provavelmente, a administração do Cemitério terá guardado os seus
restos mortais numa urna do Necrotério. Se assim for confirmado, caberá aos
católicos de Blumenau providenciar o seu jazigo nesta Sede Paroquial[3].
Homenagens ao Falecido Pe. Jakobs
Aos 16 de janeiro de 1927, o Colégio Fundado pelo Pe. Jakobs completou 50
anos de existência. Acontecimento que tinha de ser comemorado. Mas janeiro, o
mês de férias, não seria apropriado. Daí, os dias de festa escolhidos terem
sido os de 14 e 15 de agosto.
Às 6 horas da noite de 13 de agosto de 1927, chegou Sua Exa. Revma. Dom
Joaquim Domingues de Oliveira, e que teve uma recepção grandiosa.
Às 8,30h. da noite, a saudação aos convidados no Teatro Frohsinn[4] com representações artísticas do Clube Musical.
Aos 14 de agosto, domingo, às 9 horas da manhã, Solene Missa Pontifical de
Exmo. Senhor Arcebispo de Florianópolis; o Coral da Escola cantou a Missa
Orquestrada de Thielen; Sermão Festivo pelo Revmo. Pe. Zartmann, sj - que
versou, na 1ª parte, sobre os 50 Anos de Atividades do Colégio, por ele
comparado a um Viveiro do Saber, da Religião e da Virtude; na 2ª parte,
fez considerações sobre o Fundador do Colégio em suas marcantes qualidades
pessoais.
Às 11 horas, Sessão Solene no Salão Nobre do Colégio, sob a
presidência do Exmo. Sr. Arcebispo:
- Abertura e Saudação;
- Leitura dos Telegramas recebidos;
- Descrição das atividades e da vida do Pe. Jakobs em sua importância para
o Município e o Estado;
A partir desse dia, o seu quadro ocupa o lugar de honra no salão nobre e na
Entrada do Colégio.
À tarde, compareceu o Presidente do Estado, Dr. Adolfo Konder, acompanhado
de seu Secretário e de muitos Deputados do Estado.
À noite, às 8 horas, o Ministro dos Transportes, Dr. Victor Konder, transmitiu,
do Rio de Janeiro, uma Saudação pelo Rádio.
No dia 15 de agosto, às 9 horas da manhã. Missa Comemorativa pelos
falecidos Professores, Alunos e Benfeitores do Colégio. Na pregação, o
Fundador e seus Colaboradores foram todos alvo das devidas considerações.
À noite, o Senhor Deputado Estadual e Superintendente Marcos Konder
proferiu uma conferência interessante sobre Pe. Jakobs, seu Colégio e seus
Sucessores.
Reunindo estas sinceras expressões de alta Estima e de Gratidão referentes
ao Pe. Jakobs, força é convir com o Comerciante Blumenauense, ainda entre os
vivos:
PE. JAKOBS BEM QUE MERECEU,
LHE FOSSE ERGUIDO
UM MONUMENTO.
[1] Pe.
Estanislau Schätte, o autor do texto alemão, era franciscano. Nasceu na
Alemanha (1872). Ordenou-se sacerdote no Brasil (1902). Uma longa e meritória
vida consagrada à educação: por exemplo, no Colégio S. Antônio de Blumenau,
onde foi professor por 20 anos, e 3 como diretor (1912-32). Conhecido
pesquisador da História de Teresópolis (RJ) e de várias colônias
teuto-catarinenses. Faleceu em Petrópolis (RJ), aos 12/07/1960 (Cf. REB, set.
1960, p.844).
- O artigo foi publicado na
Revista mensal Der Wegweiser (Indicador de Rumo), pelos Padres
Dehonianos SCJ de Brusque, nos meses de Junho, Julho e Agosto de 1930.
- O Tradutor tem doutorado
em Educação pela USP, na área de Filosofia e História; e Diretor do Arquivo
Provincial Padre Lux (Appal – Brusque).
- Digitação da Historiadora
e Secretária do Appal: Karina Santos Vieira.
[2] São os
bisavós do já falecido Prof. Dr. Pe. Orlando Maria Murphy scj, que foi
Reitor da FURB, Fundador da FEBE e Vice-Presidente do “Conselho Estadual de
Cultura”. (N.doTrad.).
[3]
Para complementação desta biografia, será útil o livro Padre José
Maria Jacobs e o Catolicismo em Blumenau, do Pe. Antônio Francisco Bohn,
prefaciado pela historiadora Sueli Vanzita Petry, Diretora do Arquivo Histórico
José Ferreira da Silva, de Blumenau -, Gráfica e Editora 3 de Maio Ltda,
Blumenau, 03/05/2001, 124p. (N. do Trad.).
Para melhor entendimento
contextual dos problemas de ordem político-religiosa havidos em Blumenau,
poderá servir a leitura do livro Formação Histórica do Brasil, Companhia
Editora Nacional, S. Paulo, 1972, de J. Pandiá Calógeras, pp. 159-315. (N. do
Trad.).
[4]
Termo alemão que, em português, poderia significar “jovialidade”. Mas a
ditadura vargas rebatizou o Teatro com o nome de “Carlos Gomes”. Coisa normal.
Assim, o rio Itajaí do Norte já passara para “Rio Hercílio”. Em nosso Estado,
numerosas localidades sofreram deshistorização toponímica. (N. do Trad.).
[5] O qual
se encontra no Convento S. Antônio. Sua cópia, neste artigo, é autêntica e
atual. (N.do Trad.).
Boa noite.
ResponderExcluirEstou lendo essa página, incrível que encontrei algo sobre minha família, ( Família Wartha )
Abraço
Helena Wartha.