110 anos da presença Dehoniana no Brasil Meridional
Como em 2013 comemora-se os 110 anos da presença Dehoniana no Sul do Brasil, posto aqui um artigo de 2003, do Centenário Dehoniano no Sul do Brasil. Creio que é muito válido.
2013:
170 anos de nascimento do fundador Padre Leão Dehon.
135 anos de fundação da Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus.
120 anos de presença dehoniana no nordeste do Brasil.
110 anos de presença dehoniana no sul do Brasil.
10 anos de criação das províncias Brasil Meridional e Brasil São Paulo.
CELEBRAÇÃO DO CENTENÁRIO DA PROVÍNCIA BRASILEIRA MERIDIONAL
José Francisco Schmitt, scj
BREVE HISTÓRICO
Introdução
O ano de 2003 foi um ano muito rico em celebrações e acontecimentos históricos na Congregação e nas duas novas províncias: a Província Brasileira Meridional (BM) e a Província Brasileira Central (BC).
Celebramos os 125 anos de Fundação da Congregação no dia 28 de junho do mesmo ano. Neste arco centenário, eventos marcantes para nossa vida congregacional foram a criação das novas províncias brasileiras, a realização do XXI Capítulo Geral, em Roma, a eleição do novo superior geral, padre José Ornelas Carvalho (da Província Portuguesa) e seu vice padre Cláudio Weber (da Província Brasileira Meridional), as instalações das novas províncias e a celebração do centenário. Feitos estes rápidos acenos e, para contextualizar melhor o evento dos 100 anos, passamos a assinalar alguns tópicos e realizações históricos mais significativos da Província Brasileira Meridional.
Os primeiros pioneiros
Quando em julho de 1903 os padres José Foxius e Gabriel Lux desembarcaram na ilha do Desterro, hoje Florianópolis, no Estado de Santa Catarina, ninguém podia imaginar que com a sua chegada estava nascendo uma florescente província que no ano centenário exigiria uma divisão em duas devido ao grande número de membros e à grande expansão de sua atividade pastoral. Os dois pioneiros, em consonância com o desejo dos padres alemães, foram enviados pelo Fundador, Padre Leão João Dehon. Em janeiro de 1904 vieram mais dois padres e um irmão religioso da Alemanha para se ajuntarem aos dois pioneiros. Logo em seguida deixaram a capital e foram para o interior, onde se haviam estabelecido colônias alemãs. Dom Duarte Leopoldo e Silva, bispo de Curitiba, por um decreto, confiou à Congregação as primeiras paróquias de São Luiz Gonzaga, em Brusque, SC, (criada em 1873) e do Puríssimo Coração de Maria (criada em 1901), em São Bento do Sul, SC.
Visita do Fundador (1906)
Padre Dehon, aos sessenta e três anos de idade, e após ter enviado duas levas de missionários para o Brasil: Nordeste e Sul, entusiasmou-se, sobremaneira, pelo Brasil, a ponto de empreender uma viagem de visita aos seus missionários, a fim de conhecer pessoalmente o nosso país e encorajar o ânimo apostólico de seus padres. Esta histórica viagem valeu-nos um livro, que é um interessante diário: “Mille Lieues dans l'Amérique du Sud” (Mil léguas através da América do Sul). Padre Dehon, neste seu livro, fez um completo relato de sua visita ao Brasil, sobretudo às casas e membros de sua Congregação. Esteve durante um mês em Santa Catarina (25.10 a 26.11.1906), visitando as paróquias de Parati, hoje Araquari, São Bento do Sul, Itajaí e Brusque. Em Brusque fez uma importante reunião com os padres, tratando das linhas mestras do futuro desenvolvimento da Região Missionária.
A expansão e a criação da Província
Em 1908, com os reforços de novos religiosos da Alemanha, o contingente de dehonianos já era de dezassete membros. Além das paróquias de Brusque e São Bento do Sul, os dehonianos já estavam atuando em diversas paróquias do litoral do Estado de Santa Catarina, como: Itajaí, Penha, Barra Velha, Camboriú, Tijucas, Porto Velho, Parati. Logo assumiram outras paróquias em Jaraguá do Sul, Botuverá, Joinville e Tubarão. Em dezembro de 1919, os padres Guilherme Thoneick, Fernando Baumhoff e irmão Luís Cronenbroeck já estavam em Taubaté, SP, para assumir a direção dos seminários Maior e Menor; logo em 1921, dois dehonianos estavam na cidade de Rio de Janeiro (em São Benedito dos Pilares, por pouco tempo); no ano seguinte, em Cunha (interior de São Paulo, de 1922 a 1927) e em Minas Gerais.
Nos primeiros anos da história da Região Missionária Brasileira da Província Alemã, além do sério trabalho de formação nos seminários de Taubaté, Brusque e Corupá, foram marcados por um acelerado ritmo de expansão da atividade paroquial e criação do noviciado em Taubaté (em 1928) e, logo em seguida, a transferência do noviciado de Taubaté para Brusque (1932) com a transferência do seminário menor de Brusque para Corupá, SC, e em 1933 a criação da Filosofia em Brusque. E, assim, no dia 25 de abril de 1934, a jovem Região Missionária Alemã foi elevada à categoria de Província Brasileira Meridional.
Com a criação da Província BM, a Congregação abriu novas frentes nos Estados de Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e, a partir da década de 60 (1960), Paraná (Curitiba e no interior) e assumindo novas paróquias nos Estados onde já estavam. A Missão do Maranhão começou no ano de 1968 e a do Mato Grosso em 1983. No ano seguinte, partiram os primeiros brasileiros para o Congo. Hoje, a província colabora também, nas Filipinas, na Índia, Alemanha, Moçambique e Uruguai. Além dessas novas frentes, a Província BM sempre investiu nas casas de formação, nos seminários, nas pastorais da Comunicação, Vocacional, da Educação, Social, Missionária e Leigos dehonianos. Hoje, através das atividades de magistério em Taubaté e Brusque, certamente com rosto diferente, continua com a atuação da Faculdade Dehoniana, com seu conceituado Curso de Bacharelado e Teologia e Filosofia. Na Pastoral da Formação presbiteral, o Curso de Teologia, no Convento SCJ de Taubaté, durante os seus oitenta anos de magistério teológico (1924 até o final de 2002), formou, para a Igreja no Brasil, 384 padres dehonianos e 332 do clero diocesano e de outros institutos religiosos, totalizando o expressivo número de 716 sacerdotes.
O crescimento sugere mudança de estruturas
A idéia de uma administração mais autônoma entre os padres alemães da Missão Brasileira Regional, já era bem antiga. Segundo os arquivos da Congregação, em Roma, existem correspondências enviadas por padre Inácio Burrichter (+ 1966), no ano de 1926, nas quais ele falava em criar aqui uma província, ou então pelo menos, que houvesse um vice-provincial residindo no Brasil. Mais tarde, desde os anos de 1940, quando já era província e vinha crescendo, vez e outra, levantavam-se vozes isoladas, sugerindo a divisão em duas. Em 1960, já em fim de vida, padre Burrichter, aos setenta e um anos de idade, enviou outra carta ao governo geral, pedindo a divisão do Brasil em três províncias. Sérias ou não, mas alguém pensou em mudanças de estruturas.
Necessidade de novas estruturas mais ágeis
Na preparação ao IX Capítulo Provincial, em 1987, diante da grande extensão territorial da província e da sua difícil animação da vida religiosa, provincial e administrativa, voltou a idéia de criar novas estruturas administrativas. No último dia deste IX Capítulo, na segunda fase, no dia 18.3.1988, foi aprovada uma moção no sentido de que o governo provincial constituísse uma equipe de estudos para examinar, até o próximo Capítulo Provincial a viabilidade da divisão da Província BM, após consulta a todos os seus membros. O teor da Ata documentava assim: “Trinta capitulares manifestaram-se a favor da moção, onze contra e um se absteve” .
A reflexão foi levada aos setores, fez-se consulta a todos os membros, na qual uma ampla maioria se manifestou a favor da divisão, embora houvesse opiniões divergentes quanto à modalidade: uns queriam, simplesmente, duas províncias, outros, duas províncias e uma região, outros ainda falavam de regiões ou vicariatos equiparados ou não, à província .
Criação das Regiões
A) A criação da Região do Maranhão (MAR)
O debate prosseguiu e constou na pauta do X capítulo Provincial, 8 a 12 de outubro de 1990. No dia 12 foram votadas várias propostas. A idéia de modificação da estrutura da BM foi aprovada por unanimidade; a criação de uma nova província desmembrada da BM recebeu aprovação de quarenta e três votantes sobre quarenta e nove; pelo mesmo número foi aprovada a constituição de uma comissão encarregada de elaborar o projeto da nova província, no prazo de dezoito meses; e por quarenta e cinco votos a favor, foi aprovada a criação da Região MAR .
B) A Região Brasileira Meridional (RBM)
Em 1993 realizou-se o XI Capítulo Provincial (extraordinário), cujo tema central foi a questão da nova província ou outra nova estrutura. O assunto havia sido estudado nos anos anteriores e foi amplamente debatido nas sessões capitulares, em que estiveram presentes o Superior geral, padre Virginio Bressanelli e o Conselheiro geral, padre Silvino Kunz. O Capítulo votou em primeiro lugar a proposta da criação imediata de nova província, que não recebeu a votação necessária. A seguir foram votadas várias outras moções e foram aprovadas estas quatro: 1. “que se crie nova Região”; 2. “que se crie duas novas Regiões”; 3. “que se crie uma Região que englobe os territórios de Rio Grande do Sul, Santa Catarina e a grande Curitiba”; 4. “que se crie uma Região que englobe o território de Minas Gerais” .
O governo geral, por sua vez, aprovou as moções 1 e 3 e não aprovou as moções 2 e 4. A partir desse Capítulo extraordinário, o governo provincial encaminhou o processo de criação da RBM. Esta, de fato, veio a se concretizar na data de 12 de outubro de 1994 e instalada em 14 de março de 1995.
A experiência e a retomada do processo de divisão
Os sete anos de efetiva experiência da Região da RBM, indicaram a viabilidade da criação da nova província. Para concretizar este passo, os governos provincial e regional retomaram o processo de reflexão sobre o assunto na reunião conjunta dos conselhos da BM e RBM, em maio do ano 2000. Esse assunto foi apresentado em junho de 2000, na assembléia da BM, em Varginha, bem como na assembléia Regional da RBM, em julho de 2000.
Nas sessões dos conselhos regional e provincial, em 20 a 22 de novembro, foi aprovada por unanimidade a decisão de encaminhar ao superior geral e seu conselho o pedido de criação de uma nova província.
Enviado o pedido ao governo geral, que respondeu por meio de carta de padre Carlos Alberto da Costa Silva, com orientações, em 7 de abril de 2001. O governo geral, em cartas, apresentou os requisitos e condições para ereção de província e esclarecendo que não se tratava de desmembrar uma província de outra, mas, de criar duas novas províncias.
Após o encaminhamento de toda a documenta do XIII Capítulo Geral e as moções da criação das províncias ao governo geral e a aprovação deste, dia 2 de fevereiro de 2003, Festa da Apresentação do Senhor, a então Província Brasileira Meridional foi dividida em as Províncias: a Província Brasileira Meridional e a Província Brasileira Central.
O CENTENÁRIO
A idéia da primeira semente
No decorrer da história da província da antiga Província Brasileira Meridional (BM), em seus momentos mais importantes de sua vida, principalmente, quando se tratava de estudar e assumir novos projetos, bem como em eventos de inaugurações de novas obras e abertura de novas frentes a serviço da missão, esteve sempre bem presente a idéia da pequena semente lançada pelos padres alemães, vindos para o Sul do Brasil (1903), o que deu a origem à Missão Brasileira Meridional. Enquanto a BM se preparava para a nova realidade de duas novas províncias, estava nos horizontes dos religiosos, a idéia da celebração do centenário da província.
Para tanto, em março de 1999, numa reunião conjunta dos conselhos da BM e da RBM, em São Paulo, em vista do primeiro centenário de presença dehoniana no Sul do Brasil, foi constituída uma Comissão de Pesquisa Histórica para coordenar, elaborar uma série de proposta de subsídios para ajudar a província a viver esse primeiro centenário.
O Ano dehoniano
Enquanto a BM preparava a celebração do centenário, por uma feliz coincidência, foi publicada a carta do superior geral, padre Virginio D. Bressanelli, abrindo oficialmente o Ano dehoniano, de 14 de fevereiro de 2002 a 28 de junho de 2003. Este ano jubilar veio coincidir com a celebração do nosso primeiro centenário.
O Ano dehoniano, teve por finalidade dar graças a Deus pela vida do Padre Fundador, pelos dons que Deus lhe concedeu e pela fidelidade de sua reposta; ser um tempo de reavivamento espiritual dos membros da Congregação; oração por novas vocações e pela perseverança dos religiosos. O conteúdo dessa carta, tornou-se precioso subsídio para retiros e para as celebrações comunitárias e para o centenário.
Assim, em sintonia com o espírito do Ano dehoniano, a província celebrou o seu primeiro centenário em suas comunidades e paróquias, utilizando os vários subsídios que foram preparados e aprovados pelo governo provincial, e ao mesmo tempo foi dada liberdade para as comunidades organizarem suas celebrações mais concretas e com eventos locais.
Como a nossa história da província teve seu início com a vinda dos padres missionários da Província Alemã e para vincular essa efeméride do nosso primeiro centenário com a Província Mãe, foi pedida e prontamente doada por ela uma imagem peregrina do Bom Pastor.
Foi escolhida esta imagem do Bom Pastor para caracterizar o trabalho pastoral que a nossa província vem fazendo até hoje: O empenho pela formação de religiosos e padres pastores, trabalhos em paróquias, missões, apostolado social, educação, comunicação... Uma segunda razão para a escolha dessa imagem, está ligada à pessoa do próprio Padre Dehon, que ao refletir sobre a figura do Bom Pastor no Evangelho de São João (10,14), concluiu que “esta é uma das páginas do Evangelho que melhor nos revela o Sagrado Coração” . Realmente é isto que a imagem nos quer mostrar. O bom Pastor se apresenta como porta. Nele, as ovelhas encontram abrigo e vida.
Para compreender a origem e sentido dessa imagem, passamos para a seguinte descrição.
Esta imagem do Bom Pastor, talhada em madeira de pinho branco pelo padre Herman Falke, sacerdote dehoniano holandês, que trabalha em Otawa, Canadá, retrata um pastor da região fronteiriça entre a Alemanha e a Holanda, terra natal dos primeiros padres alemães, Gabriel Lux e José Foxius, que vieram ao Brasil, em 1903, para estabelecer aqui a Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus.
A obra representa um pastor simples, humilde e bondoso, que ao encontro das ovelhas e as acolhe em seu redil. Está diante da porta do abrigo; com a mão direita, mantém a porta aberta e na esquerda traz uma ovelhinha recém-nascida. O telhado do abrigo é de palha, como era costume na Holanda, pátria do padre Falke, e na vizinha região do Ems onde fica Handrup, à época em que os padres alemães vieram ao Brasil.
Esta imagem foi doada pela Província Alemã dos Padres do SCJ à Província Brasileira Meridional para celebrar o centenário da vinda dos primeiros padres alemães SCJ ao Sul do Brasil.
Foi benta por João Paulo II, em 29 de maio de 2002. No dia 10 de junho, foi recebida no provincialado, em São Paulo.
Com esta imagem peregrina queremos expressar a nossa gratidão aos missionários alemães que vieram ao Brasil. Gratidão à Província Alemã por todo o apoio que nos deu, ao longo dos cem anos. Gratidão pela doação da imagem-símbolo, que quer ligar a origem dos fundadores da província com nossa missão de cem anos depois. Que sejamos, como os pioneiros quiseram ser, pessoas de coração aberto e solidário, à semelhança de Jesus, o Bom Pastor.
Assim, esta imagem do Bom Pastor iniciou a peregrinação por Florianópolis no dia 13 de julho de 2002, mais exatamente, na igreja de São Francisco, primeiro lugar trabalho de nossos pioneiros, passando para Brusque, de onde se irradiou a Congregação SCJ, pelo Sul e centro Sul do Brasil.
A partir dessa data, a imagem percorreu todas as comunidades e paróquias da RBM (esteve exposta durante o XIII Capítulo Provincial, em Jaraguá do Sul, de 22 a 26 de julho) e foi recebida, em São Paulo, pelos Leigos Dehonianos, reunidos em assembléia, nos dias 21 e 22 de setembro. Seguiu para o Norte do Paraná, a partir do Setor 7, de 27 de setembro de 2002 até às instalações das duas províncias, a imagem peregrina do Bom Pastor percorreu todas outras as paróquias e comunidades dehonianas dos outros Estados do Brasil. Além desses gestos celebrativos, foram realizados programas na Televisão alusivos ao evento centenário. Foram realizadas sessões solenes nas câmaras legislativas de deputados e vereadores em algumas cidades do país, com destaque de algumas figuras dehonianas. Ainda no contexto do centenários, foram publicados alguns livros, como Dehonianos no Sul do Brasil – 100 anos de presença e missão, 1903-2003 (de autoria de padre José Francisco Schmitt), Cem Anos da Presença dos Dehonianos em Brusque (padre Roque José Schmitt), Leão Dehon – Pioneiro Social (autoria de padre Gervário Palermo, tradução de padre Raulino Busarello, como contribuição para o centenário), reorganização do Arquivo Provincial Padre Lux (APPAL), Brusque, SC, pelo padre Dorvalino Eloy Koch, criação do Museu Paroquial Padre Remaclo Foxius em Formiga, MG, e por fim, leigos de paróquias dehonianas (Brusque e São Bento do Sul) publicaram obras alusivas ao evento do centenário da Província BM.
O ponto alto do Centenário, a instalação das províncias BM e BC
A) Ação de graças pela criação das províncias em São Paulo
Desde o início da idéia da celebração do Ano dehoniano (125º da aniversário da fundação da Congregação) e o Centenário da vinda dos primeiros padres do Sagrado Coração de Jesus ao Brasil era de fazer coincidir a criação das novas províncias. Para celebrar o importante evento histórico da criação das novas províncias Brasileira Central e Brasileira Meridional, na respectiva data de ereção canônica, dia 2 de fevereiro de 2003, o governo provincial antecipou a celebração de ações de graças, e com orações, este evento para o dia 31 de janeiro, no Santuário de São Judas Tadeu em São Paulo. Cerca de cinqüenta confrades estiveram presentes, nesse ato celebrativo. Antes da santa Missa, foi lida a carta do superior geral, padre Virginio Bressanelli, dirigida aos superiores padres Cláudio Weber e Osnildo Klann das duas novas províncias e aos seus membros. Para a memória histórica, eis o texto do superior geral, P. Virginio D. Bressanelli, scj:
“Estimados confrades: Em nome de todo o Governo Geral da Congregação quero expressar nossa alegria e os votos de vida interminável e de fecundidade no serviço do Reino, às duas novas províncias BM e BC e a todos os seus religiosos.
Hoje vocês atingem a meta que iluminou a caminhada de toda a antiga BM por cerca de 13 anos. Não foi somente um caminho de busca e de empenho em definir estas novas realidades, mas também um caminho de renovação espiritual, comunitária e apostólica de vocês, como pessoas e como unidade congregacional. Desta forma, graças a Deus, o fruto não se limita à nova organização administrativa, mas que se manifesta numa recuperada identidade carismática e apostólica de nossa presença dehoniana no Sul do Brasil. Nestes anos, vocês cresceram na compreensão da dehonianidade e em significação na Igreja e na realidade geográfica, social e cultural em que vivem e dão testemunho do amor do Coração de Jesus para com todos, especialmente os excluídos e marginalizados por qualquer motivo.
Esta é uma forma privilegiada de celebrar os 100 anos de presença SCJ num lugar concreto. Por isso rendemos graças ao Senhor, junto com vocês, e pedimos que Ele continue os abençoando para que cresçam sempre mais em qualidade de vida religiosa dehoniana e em número, a fim de que o Reino do Coração de Jesus se enraíze nas pessoas e nas sociedades.
Desejamos também que prossigam aprofundando as formas de comunhão existentes entre vocês, sem distinção resultante da nova pertença (BM e BC). Sejam fiéis à colaboração na formação, na atenção às missões internas (MAR e MT) e à abertura aos serviços e missões internacionais.
Acolham com prazer a simpatia e a esperança que toda a Congregação deposita em vocês.
Queremos também agradecer aqueles que, nesta longa caminhada de 100 anos, contribuíram para que a BM fosse um lugar de vida e de crescimento da Congregação. Ao recordar os seus pioneiros, P. Gabriel Lux e P. José Foxius, queremos englobar todos os missionários alemães, um dos quais ainda vive. Queremos agradecer a Província Mãe, GE, pois soube colocar bons alicerces nesta obra, que ela pode considerar como a maior de suas filhas.
Queremos agradecer a todos os religiosos brasileiros deste amplo período, e o fazemos nomeando os que, a partir de hoje, são os superiores administradores da BC, P. Cláudio Weber, e da BM, P. Osnildo Klann, enquanto se aguarda a nomeação e a eleição dos respectivos superiores provinciais. Eles, junto com muitos outros religiosos da BM e da RBM, souberam incentivar esse caminho com sabedoria, discrição e coragem.
Permitam-nos desejar a todos vocês o melhor, enquanto consagramos as duas novas províncias ao Coração de Jesus pelo Coração de Maria. Que nunca lhes falte nem a graça nem a palavra oportuna e que os ajude a ser generosos e fiéis ao dom da vocação e missão que receberam. Nossa Senhora Aparecida, na humildade do Ecce Ancilla , forme em vocês as virtudes e sentimentos que caracterizaram P. Dehon para serem seus filhos fiéis e generosos em toda a parte.
Nossa bênção e saudação fraterna,
Após a leitura dessa carta, foi lido o decreto do superior geral, criando as duas novas províncias BC e BM e a nomeação do Administrador Provincial “ad interim” da nova Província Brasileira Central.
B) Ação de graças pela criação das províncias em Santa Catarina
A ação de graças do ato histórico da criação da nova Província Brasileira Meridional foi celebrada solenemente na casa do Noviciado Nossa Senhora de Fátima, a 2 de fevereiro, em Rio Cerro, Jaraguá do Sul. Antes do início da santa Missa, padre Carlos Alberto da Costa Silva leu o decreto do superior geral, que criou as duas nova províncias BM e BC, nascidas da mesma Província-Mãe, a antiga BM, desejou-lhes êxito e alegria na missão, e manifestou sua satisfação pela conclusão de um processo que vinha acompanhando com grande interesse. Padre Osnildo Carlos Klann, nomeado Administrador Provincial, apresentou e inaugurou placa comemorativa afixada na entrada do Noviciado.
Para coincidir a inauguração oficial da criação das duas novas províncias com o encerramento do Ano Centenário, foi marcada a data da posse do primeiro governo da Província Brasileira Central, para 8 de agosto do ano em curso, Taubaté, SP. Na Província Brasileira Meridional, foi no dia 12 de agosto, em Brusque, SC, berço da Congregação no Sul do Brasil. Data também muito significativa, pois é aniversário de morte de Padre Dehon.
No dia 16 de agosto, na Matriz São Sebastião, de Jaraguá do Sul, SC, foi ordenado bispo o padre Wilson Tadeu Jönck. Foi mais uma acontecimento histórico-religioso que nos deu um realce ainda maior a todas celebrações da instalação da Província e o encerramento do ano centenário.
No dia seguinte, houve-se por bem também fazer uma celebração festiva popular para marcar o encerramento desse ano centenário no seminário de Corupá, SC, a 17 de agosto.
Em todos os eventos dos atos de instalações das novas províncias e o encerramento do ano do centenário fomos honrados com ilustres visitas do exterior. Como registro histórico, estiveram presentes o superior geral, padre José Ornelas Carvalho, o superior provincial da Alemanha, padre August Hülsmann e os padres da Argentina e do Chile e a presença de quase todos os bispos dehonianos.
CONCLUSÃO
A comemoração do centenário da Província Brasileira Meridional, mediante pesquisas, celebrações junto às casas religiosas e com o povo de nossas paróquias, nos mostrou, muito claramente, que tudo o que aconteceu e foi realizado durante estes 100 anos, começou sob o signo da Missão, sempre alimentada de uma esperança realista, daqueles que não mediram sacrifícios através do espírito de pobreza, de sofrimentos e incompreensões, e até às expulsões, cujas convicções pela causa do Reino, prevalecendo sobre os grandes desafios que tiveram que enfrentar. Tudo o que temos hoje, teve sua origem no ardor missionário e na doação.
Olhando para esta história de cem anos de vida dehoniana que acabamos de celebrar, sem nos prender ao passado, portador de distinta conjuntura (diversidade de desafios e perspectivas de sua época), hoje, somos chamados para refletir sobre a experiência que eles nos deixaram. Com certeza, esta celebração do centenário foi uma oportunidade de muitas graças, para rever e continuar qualificando a nossa vida religioso-apostólica dehoniana, nos planos, pessoal, comunitário e provincial ou regional. Somos, hoje, chamados a prosseguir definindo a nossa fisionomia de províncias, através das opções apostólicas mais específicas, atuais e significativas para a vida dehoniana do terceiro milênio.
Agora, sob o signo do novo, a partir de 2 de fevereiro de 2003, somos chamados para estar abertos para o futuro. Isto nos urge a pensar sobre o novo. Este novo, este futuro deve ser projetado a partir da dehonianidade e da consciência do “Nós Congregação, a serviço da Missão”. Pois foi através dessa paixão pela Missão que nasceram as obras importantes da Congregação e a nossa província alcançou a graça de poder celebrar o seu primeiro centenário. E mais! A história de uma província está sempre ligada com a vida e o projeto de toda a Congregação, que vem sempre animada pela Missão. O futuro de nossas duas províncias, necessariamente deverá passar pela fidelidade dinâmica do carisma do Fundador e em plena comunhão congregacional.
Com este olhar para o futuro, somos, hoje, chamados a compreender o nosso carisma de maneira mais viva e lúcida, para estarmos abertos aos grandes eventos da Igreja e do mundo. Sobre estes tão elevados propósitos do nosso porvir, invocamos, aqui as animadoras palavras de João Paulo II:
“Vós não tendes apenas uma história gloriosa para recordar e narrar, mas uma grande história a construir! Olhai o futuro, para o qual vos projeta o Espírito a fim de realizar convosco ainda grandes coisas” .
Por fim, ao terminarmos esta matéria, na qual recordamos a memória dos nossos pioneiros e a trajetória que a Província fez mediante sucessivos marcos e acontecimentos especiais, e por tantos dons que recebemos de Deus Pai através de seu Filho, feito homem, que se apresentou como MANSO E HUMILDE DE CORAÇÃO, como encerramento do nosso primeiro centenário dehoniano, podemos concluir com a ORAÇÃO DO CENTENÁRIO:
Bendito sejais, Pai de Bondade,
Fonte de todo bem e graça!
Celebrando 100 anos de história
e serviço ao povo que nos confiastes,
elevamos a vós esta prece de louvor e gratidão.
Fonte de todo bem e graça!
Celebrando 100 anos de história
e serviço ao povo que nos confiastes,
elevamos a vós esta prece de louvor e gratidão.
Reconhecemos o amor que tendes para conosco,
Visível em tantos sinais:
no carisma concedido a Padre Dehon,
na disponibilidade de nossos primeiros missionários,
nos frutos de nosso apostolado,
na dedicação de nossos religiosos,
no dom de muitas vocações,
na partilha do carisma com leigos e leigas,
na vitalidade de nossas Províncias.
Visível em tantos sinais:
no carisma concedido a Padre Dehon,
na disponibilidade de nossos primeiros missionários,
nos frutos de nosso apostolado,
na dedicação de nossos religiosos,
no dom de muitas vocações,
na partilha do carisma com leigos e leigas,
na vitalidade de nossas Províncias.
Tocados por vossa misericórdia,
Queremos superar nossas limitações
para crescer em santidade, justiça e comunhão.
Queremos superar nossas limitações
para crescer em santidade, justiça e comunhão.
Renovai em nós as disposições do coração de vosso Filho
e abençoai toda a Família Dehoniana.
Dóceis à ação de vosso Espírito,
Possamos responder aos apelos de nossa missão
por uma renovada adesão ao Evangelho.
e abençoai toda a Família Dehoniana.
Dóceis à ação de vosso Espírito,
Possamos responder aos apelos de nossa missão
por uma renovada adesão ao Evangelho.
A vós seja a glória e o louvor,
por Cristo, nosso Senhor,
na unidade do Espírito Santo.
por Cristo, nosso Senhor,
na unidade do Espírito Santo.
Amém.
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P. José Francisco Schmitt scj (Província BC), nasceu em 1942, professou em 2.02.1966, foi ordenado sacerdote em 1971. Trabalhou em paróquias, especializou-se em Teologia Pastoral, foi Professor de Pastoral em Taubaté, Reitor-Superior da Comunidade de Taubaté, publicou vários livros de pesquisa histórica, foi conselheiro e vice-provincial na Província BM, atualmente trabalha como formador no Postulantado das Províncias BM e BC em Jaraguá do Sul. - jfschmittscj@hotmail.com
Fonte do artigo: http://win.dehon.it/scj_dehon/cuore/dehoniana/2004/2-2004-08-typ.htm
Sobre a Fundação Missionária
dos Padres Dehonianos SCJ no Brasil Meridional
Vejo que o Senhor pretende saber algo a respeito dos primeiros entendimentos havidos em torno desta Missão e de seus Primórdios. Escrevo em forma epistolar. Peço que o senhor torne o texto mais palatável aos leitores.
Naquela época, já missionávamos em Regiões Estrangeiras, tal como sucedeu no Congo e no Brasil Setentrional. No entanto, pelo fato de a Congregação ainda não estar dividida em Províncias, às mencionadas Regiões foram enviados membros procedentes de todas as Nações. Mas a partir de 1902, manifestava-se um movimento favorável à separação da Província Alemã, bem como o seu desejo de uma Região Missionária para os alemães.
Pe. José Thoss, então Reitor da pequena Comunidade Sacerdotal em Münstergensen e, a seguir, Reitor da Escola Apostólica de Sittard (Holanda) -, escreveu-me uma carta a Bonn, onde eu residia. Pedia-me que eu procurasse um apropriado campo de apostolado para os Padres Alemães.
A seguir, fomos convocados para uma conferência a realizar-se em Sittard. Nela propus nos instalássemos numa destas Regiões: ou no Chile Meridional, ou na Argentina, ou no Brasil Meridional. Venceu esta última opção.
Pe. Germano José Schmitz foi incumbido destas sondagens. E uma vez bem sucedidas, Pe. José Foxius e eu fomos, em Junho (ou Julho) de 1903, como pioneiros, para a nossa Região Missionária. Na ocasião, Santa Catarina e Paraná constituíam uma só Diocese. Era Bispo de Curitiba: Dom José de Camargo Barros.
Chegados a Paranaguá, nos separamos: Pe. Foxius viajou antes, com destino a Florianópolis, ao encontro do Pe. Francisco Topp; e eu, a Curitiba, para me apresentar ao Bispo. Foi com ele acertado que os dois missionários nos fixássemos em Santa Catarina, e nos puséssemos à disposição do Pe. Topp. De modo que também eu viajei para Florianópolis.
Não obstante a preferência dos nossos confrades d’além-mar ser pela atividade pastoral -, eu achava que devia aceitar a proposta do Pe. Topp: a Escola Paroquial. Porquanto, assim eu poderia ganhar tempo e, com calma, tomar conhecimento das condições do país e do povo, evitando, pois, desacertos, ao aceitar Paróquias; e prevenir fiascos perante olhares, de algum modo, sempre desconfiados ante as primeiras iniciativas missionárias de alemães.
A situação escolar daquele tempo era lamentável. Segundo eu saiba, ainda não havia, em Florianópolis, nenhuma escola do governo. Com exceção do bem dirigido Colégio das Irmãs da Divina Providência, havia somente certo número de Escolas Particulares apoiadas pelo Município, e que, de modo algum, correspondiam às verdadeiras exigências. Também não era melhor a Escola Paroquial do Pe. Topp.
Em 1903, também chegaram os padres Henrique Meller e João Stolte. De modo que, em 1904, abrimos a escola nas laterais da Igreja de São Francisco. A escola foi logo freqüentada, e simultaneamente, por crianças de classe média e por aquelas de classe alta da cidade.
Além de, em primeiro lugar, nos dedicarmos ao ensino -, nossos padres tiveram de pedir auxílio a vários senhores da cidade, tais como: P. J. B. Peters e o Prof. Bueno de Gouveia, da Escola Normal.
Além do nosso magistério na Escola Paroquial, dávamos atendimento pastoral na Igreja de São Francisco. Um pouco antes do Pe. Topp, a vida-de-igreja estava tão para baixo, que raramente alguém vinha à igreja ou freqüentava os Sacramentos. Com o seu zelo total pelos fiéis, e por longos anos, a Igreja tomou um forte impulso. É que faltavam operários na Vinha do Senhor para devolvê-la a uma florescente cidade católica. Pe. Topp era quase o único Sacerdote para aquelas 12 a 15.000 almas.
Quando lá chegamos, só estava representada uma Congregação Religiosa: a das Irmãs da Divina Providência. Também na Igreja de São Francisco, então inteiramente abandonada, e pertencente a uma antiquada Ordem Terceira -, brotava, revigorada, a vida católica. Mais e mais, aumentavam a assistência à santa missa e a recepção dos Sacramentos.
Havia muito que fazer em termos de limpeza e arrumação. Quando assumimos a Igreja, ninguém, até então, se havia importado com o melhoramento do seu ambiente. Só em certas ocasiões, lá era celebrada a santa missa. Devido à umidade, os paramentos ficaram manchados, e roídos pelas traças. O interior do templo, notadamente o altar, estavam abandonados e imundos.
Mas com a ajuda de alguns piedosos e zelosos membros da Ordem Terceira, houve muito escovar e lavar, muitos remendos e novas costuras. De maneira que, em breve, a tão abandonada Casa de Deus brilhava em trajes novos e mais dignos. Tornando-se, aos poucos, uma Igreja alegremente freqüentada por todas as camadas da sociedade.
Nesses trabalhos de faxina, também nos cabia levar em conta as muitas urnas de restos mortais, que se encontravam acomodadas em toda parte nas laterais da Igreja, bem como embaixo e atrás do altar-mor.
O que revela um gesto de veneração para com os parentes falecidos. Como o senhor sabe, junto aos povos latino-americanos é uso não enterrar os defuntos, mas depositá-los em catafalcos construídos no rés-do-chão.
E os membros da Ordem Terceira desejavam, pois, depositar seus falecidos na Igreja da Ordem. Neste sentido, passados alguns anos, retiravam os corpos dos esquifes, e os depositavam em urnas de mármore, a seguir, colocadas nas laterais da Igreja.
Pessoas mais pobres, sem condições de providenciar urnas dispendiosas, contentavam-se com qualquer nicho ou desvão atrás ou debaixo do altar-mor, onde, sem qualquer invólucro, ajeitavam os restos mortais. Alguns iam ao extremo de colocá-los no vão do pedestal duplo das imagens dos santos. Sendo que assim podiam ser conduzidos em procissão pela cidade.
Bem pode o senhor imaginar quanto trabalho deu essa faxina. As bem fechadas urnas até que davam pouco trabalho desagradável. Muito, porém, os inúmeros crânios e ossos escondidos por toda parte, em todo canto, em cada nicho do altar.
Uma vez que as repetidas solicitações pelo jornal não obtinham respostas, resolvi fossem as urnas enterradas debaixo de uma das torres da Igreja. Em meio à crendice popular, ainda correu, por muito tempo, o rumor de que, naquela torre, aparecia uma alma penada: a “mulher seca”.
Aproveitei o primeiro ano para fazer algumas excursões pelo interior do Estado, com o objetivo de melhor conhecer as suas condições. Uma após outra, fomos assumindo as Paróquias de Brusque, São Bento e Itajaí.
Com o correr do tempo, a Escola Paroquial era insustentável. O povo desejava a ampliação da Escola para a Fundação de um Curso Ginasial. Para tanto, porém, faltavam-nos condições financeiras e professores.
Nesta situação, o povo decidiu apelar para os Padres Jesuítas do Rio Grande do Sul. Estes, no entanto, rejeitaram o pedido, pois não queriam fazer-nos concorrência.
A fim de contornar a situação, e também para corresponder à insistência dos nossos Padres, que queriam trabalhar na Pastoral -, eu dirigi, pessoalmente, aquele pedido aos Padres SJ, isto é, no sentido de eles fundarem o Ginásio. Com a sua anuência, deixei esmorecer a Escola, e fui enviando os nossos Padres para várias Paróquias.
Creio, prezado P. Peters, que o relato será o bastante, para o Senhor formar um quadro aproximativo da época para a qual deseja informações.
Caso o senhor desejar algo a mais, é só me comunicar. [...]
Tradução: Pe. Eloy Dorvalino Koch scj
Digitação: Karina Santos Vieira
NOTAS EXPLICATIVAS
Encontram-se na Pasta Individual
do Padre Gabriel Lux scj:
1- Carta original, em alemão e manuscrita -
uma doação de Beatriz Kormann
ao Diretor do Appal, em 1983;
2- O texto em alemão
foi digitado por Úrsula Rombach, 03-06-2007
Provinciais da Província Brasil Meridional
Padre Dehon em Brusque
Padre Gabriel Lux
Padre José Foxius
Padre Jean León Gustave Dehon SCJ
O que mudou de 2003 até 2013?
As províncias mudaram de sigla e algumas de nome. Assim sendo, temos no Brasil a BRM-Brasil Meridional, a BSP-Brasil São Paulo e a BRE-Brasil Recife, mais os distritos BSL-Brasil São Luiz e BCU-Brasil Cuiabá.
Especial
Missão Dehoniana
Missão Dehoniana
http://www.dehonbrasil.com/dehonianos/missoes.htm
PADRE DEHON E AS MISSÕES
A Igreja peregrina é, por sua natureza, missionária, porque tem a sua origem, segundo o desígnio de Deus Pai, na MISSÃO do Filho e do Espírito Santo.
Este desígnio brota da caridade do Pai que, sendo o princípio de quem é gerado o Filho e de quem procede o Espírito Santo pelo Filho, quis derramar e não cessa de derramar ainda a bondade divina, criando-nos livremente pela sua extraordinária e misericordiosa benignidade, e depois chamando-nos gratuitamente a partilhar da sua própria vida e glória.
Quis ser, assim, não só o Criador de todas as coisas, mas, também, “tudo em todas as coisas” (I Cor 15,28), conseguindo, simultaneamente a sua glória e a nossa felicidade.
No entanto, Deus quis chamar os homens a esta participação na sua vida, não só de modo individual e sem qualquer solidariedade mútua, mas constituindo-os num povo em que os seus filhos, que estavam dispersos, se congregassem em unidade (AG 2).
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Como o Filho foi enviado pelo Pai, assim também ele enviou os apóstolos (cf. Jo 20,21), dizendo: “Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos prescrevi” (Mt 28,19-20).
A Igreja recebeu dos apóstolos este mandato solene de Cristo, de anunciar a verdade da salvação e de a levar até os confins da terra (cf. At 1,8). Faz, portanto, suas as palavras do Apóstolo: “Ai de mim, se não prego o Evangelho” (1 Cor 9,16), e, por isso, continua a mandar incessantemente os seus missionários, até que as novas igrejas se formem plenamente e prossigam, por sua vez, a obra da evangelização (LG 17).
A Igreja, enviada por Deus a todas as gentes, para ser sacramento universal de salvação, por íntima exigência da própria catolicidade, obedecendo a um mandato de Cristo, procura anunciar o Evangelho a todos os povos.
Já, os próprios apóstolos, em quem a Igreja se alicerça, seguindo o exemplo de Jesus Cristo, ‘pregaram a palavra da verdade e geraram igrejas’.
Aos seus sucessores compete perpetuar esta obra, para que ‘a palavra de Deus se propague e seja glorificada’ (2 Tes 3,1), e o Reino de Deus seja pregado e estabelecido em toda a terra (AG 1 cf tb. AG 5).
E, esta missão, a Igreja a realiza mediante a atividade missionária, obedecendo ao mandato de Cristo, movida pela graça e pela caridade do Espírito Santo. Assim, a Igreja se torna presente a todos os homens ou povos para os conduzir à fé, à liberdade e à paz de Cristo, pelo exemplo de vida * pela pregação * pelos sacramentos e outros meios da graça, para conduzi-los, por um caminho seguro, a participarem plenamente no mistério de Cristo (cf. AG 5).
É, portanto, por um especial mandato do Senhor (‘ide e pregai o Evangelho a toda criatura’) que a Igreja procura dedicar-se com muito zelo às missões (LG 16).
2. O que entendemos por missões?
O nome de MISSÕES dá-se, geralmente, àquelas atividades características com que os anunciadores do Evangelho, indo pelo mundo inteiro, enviados pela Igreja, realizam o encargo de pregar o Evangelho e de implantar a mesma Igreja entre os povos que ainda não crêem no Cristo. Essas MISSÕES são levadas a efeito pela atividade missionária e exercem-se, ordinariamente, em certos territórios reconhecidos pela Santa Sé.
O FIM DA ATIVIDADE MISSIONÁRIA é a evangelização e a implantação da Igreja nos povos e grupos em que ainda não está radicada.
Assim, a partir da semente da palavra de Deus, é necessário que se desenvolvam, por toda parte, igrejas autóctones particulares, dotadas de forças próprias e maturidade, com hierarquia própria, unida ao povo fiel e suficientemente providas de meios proporcionados a uma vida cristã plena, contribuindo para a vida e o bem da Igreja Universal (não a do Edir Macedo).
O MEIO PRINCIPAL DESTA IMPLANTAÇÃO é a pregação do Evangelho de Jesus Cristo. Para o anunciar, o Senhor enviou pelo mundo todo os seus discípulos, a fim de que os homens, uma vez renascidos pela Palavra de Deus, fossem agregados pelo Batismo à Igreja a qual, como Corpo do Verbo Encarnado, se nutre e vive da Palavra de Deus e do Pão Eucarístico (At 2,42).
3. Situações diversas em que se pode exercer a atividade missionária
Na atividade missionária dão-se, por vezes, situações diversas: a do começo ou implantação, e a do crescimento ou juventude, depois.
Ultrapassadas essas etapas não acaba, contudo, a ação missionária da Igreja, mas é às igrejas particulares já constituídas que incumbe o dever de continuar pregando o Evangelho a todos os que tinham ficado de fora.
Devemos lembrar ainda que, por diversos motivos, as sociedades entre as quais a Igreja vive, podem sofrer mudanças radicais, podendo, assim, surgir condições inteiramente novas (progresso e bem-estar e materialismo europeu, mudanças de regimes, ideologias...).
Então, a Igreja deve ponderar se estas novas condições não exigem de novo a sua atividade missionária (Nova Evangelização da América Latina, da Europa...).
Além disso, podem ocorrer circunstâncias que não possibilitem, por algum tempo, a proclamação direta e imediata da mensagem evangélica. Nesse caso, com paciência e prudência e, ao mesmo tempo, com grande confiança, os missionários (ao menos) podem testemunhar a caridade e a beneficência de Cristo e, assim, preparar os caminhos do Senhor e torná-lo de algum modo presente (alguns países da Ásia, África, entre os muçulmanos, comunistas, em Estados Laicos...) Exemplo: Teresa de Calcutá no Iêmen do Sul
Outro problema que dificulta o trabalho missionário é a divisão entre nós e as muitas igrejas cristãs que vivem se combatendo em nome de Cristo. É preciso tentar superar isto sempre mais. Se ainda não pudermos dar um testemunho de completo acordo, o testemunho de uma só fé, precisamos, ao menos, estar animados de mútua estima e caridade (pelo menos estar animados da mesma caridade se ainda não podemos professar a mesma fé).
O PADRE DEHON E AS MISSÕES
Desde os inícios da Congregação, as missões eram consideradas pelo Padre Dehon como um campo vastíssimo, onde se poderia realizar o espírito característico dos Sacerdotes do Coração de Jesus, ou seja, o AMOR A DEUS E AO PRÓXIMO; a reparação, levando os homens à salvação; o apostolado praticado com a máxima generosidade, dando a vida, pouco a pouco, dia após dia; um apostolado vivido, o mais possível, comunitariamente.
Em 1882, o Padre Dehon entregou a D. Thibaudier, de partida para Roma, uma carta, endereçada a Leão XIII. Toda a comunidade da Casa Sagrado Coração, de São Quintino, havia assinado esta carta. O Padre Fundador escrevia: “Haurindo do Coração de Jesus o espírito de sacrifício, sentir-nos-emos felizes de estar, em breve, presentes nas missões” (Projet p. 50).
Numa carta aos seminaristas (filósofos e teólogos) de Lille, o Padre Dehon escreve que para corresponder ao amor de Cristo é necessário, entre outras coisas, escolher aquelas ‘formas de apostolado que exigem maior sacrifício, como a assistência aos operários, o cuidado dos pobres e as longínquas missões’.
Esta exigência de generosidade absoluta recorda o belo testemunho que o Vaticano II deu dos Institutos religiosos que se dedicam ao apostolado missionário: “Há séculos, estes Institutos suportam o peso do dia e do calor, devotando-se ao trabalho missionário... Muitas vezes, a Santa Sé lhes confiou a evangelização de imensos territórios, nos quais eles souberam reunir para o Senhor um novo povo, a igreja local, obediente aos seus pastores próprios... A estas igrejas, que eles fundaram com o seu suor e mesmo com o próprio sangue, eles prestarão serviço válido baseado no seu zelo apostólico e na sua experiência, colaborando fraternalmente no trabalho pastoral e em todas as iniciativas que visem o bem comum destes povos” (AG 27).
A história da atividade missionária da Congregação e de tantos outros prova a exatidão deste testemunho do Vaticano II. (Cf, tb. Mensagem XX Capítulo Geral – 1997).
O DESEJO DAS MISSÕES (PADRE DEHON)
Para despertar ou aumentar em nós o espírito missionário, talvez seja interessante relembrar os esforços do Padre Dehon para obter uma missão da Santa Sé.
A Congregação mal saíra da tempestade da supressão (dezembro de 1883 a março de 1884) e já o Padre Dehon escreve a D. Thibaudier (dez. de 1885): “Entre nós se cultiva sempre o desejo das missões. Poderíeis, talvez, falar sobre isto em Roma? De fato, as Congregações que pedem missões são muito bem vistas em Roma” (NHV, XV, p.43-44).
A 07 de novembro de 1886, escreve a D. Thibaudier: “Ainda que as missões não sejam o nosso fim específico, muitos de nossos confrades estão ansiosos por levar o amor do divino Coração às terras pagãs que a Santa Sé nos confiará”.
Antes da fracassada experiência do Equador (1888-1896), o Padre Dehon recebera uma oferta de uma missão em Nova Guiné (outubro de 1887). Era uma colônia alemã e pediram missionários alemães. Mas, o Padre Dehon só tinha SEMINARISTAS alemães.
No dia 03 de dezembro de 1887, escreve no seu Diário: “Peço a São Francisco Xavier que nos ajude em todos os nossos projetos missionários”(NQT IV, 5v).
E, no dia 19.02.1888, anota: “Hoje mandei a Roma um pedido para obter uma missão no exterior” (NQT IV, 22v). Cf. Suplemento da apostila História da Congregação.
Dois dias depois chega a proposta do P. Júlio Mantovelle, do Equador (Oblatos do Divino Amor), de fundir a sua Congregação com a nossa. O Padre Dehon, que pensava numa missão, aceita. Depois, essa fusão não se realizou, apesar de os nossos padres terem ido ao Equador. Lá trabalharam alguns anos, com muitas dificuldades, e acabaram sendo expulsos (maçonaria – P. Blanc – carta do P. Lux).
Depois da expulsão do Equador (1896), o Padre Dehon não sossegou até conseguir uma missão (Congo – 25.03.1897). Foi, de início, confiada às Províncias Belgo-Luxemburguesa e Holandesa.
E, o Padre Dehon continuou mandando seus missionários:
- 1893: Nordeste do Brasil (já antes do Congo).
- 1898: Tunísia (abandonada em 1900)
- 1903: Sul do Brasil
- 1904: Tchecoslováquia (não deu certo)
- 1907: Finlândia
- 1910: Canadá
- 1911: Suécia (depois abandonada)
- 1923: Estados Unidos (peles vermelhas de Dakota do Sul)
- 1923: Missão de Gariep (África do Sul)
UMA SITUAÇÃO MUITO DIFERENTE
A situação missionária atual é muito diferente da situação do tempo do Padre Dehon (+ 1925).
O colonialismo (ao menos político) é já uma recordação longínqua. Os países do 3º Mundo conquistaram a sua independência, têm consciência de suas culturas típicas, querem valorizá-las e vivê-las; têm uma personalidade própria e exigem o respeito dos seus direitos; vão adquirindo um peso sempre maior na história do mundo.
Também diante do cristianismo a sua posição é muito variada: vai desde a oposição ou perseguição à tolerância, à convivência, à aceitação.
Há algum tempo, partiam para as missões somente os religiosos e religiosas. Hoje, vão também os padres diocesanos, leigos, casais...
Há alguns anos os missionários (religiosos) tinham em suas mãos tudo o que de algum modo estava ligado às missões: catequese, escolas, dispensários e até as plantações e criação de gado.
Agora, não só a parte material e administrativa passou para as mãos dos leigos cristãos, mas é sempre maior a participação ativa na própria evangelização do povo, no seu ambiente político, econômico, social, e se procura salvaguardar os valores culturais próprios de cada povo.
Cada um pode imaginar como a evangelização se tornou hoje muito mais complexa em relação ao tempo do Padre Dehon. Basta ler os documentos do sínodo dos bispos de 1974: “Evangelização e mundo contemporâneo” e a esplêndida encíclica de Paulo VI, ‘Evangelii Nuntiandi’ (08.12.1975). Cf. também a Redemptoris Missio , Comla 5, etc.
Surgem sempre novos problemas e eles devem ser resolvidos, ao menos em grande parte, pelas próprias igrejas locais.
Fala-se muito, hoje, em nova evangelização, novos areópagos...
Há muitos Cursos de Missiologia, reciclagens para missionários em férias...
O PADRE DEHON, MISSIONÁRIO E MÁRTIR
Com 81 anos completos, o Padre Dehon começa o 45º caderno de seu Diário: “Este é o último caderno e, talvez, o último ano. Fiat! A minha carreira chega ao fim, é o crepúsculo da minha vida” (p. 1).
Estamos em janeiro de 1925. É, de fato, o último ano de sua vida. Morrerá, em Bruxelas, no dia 12 de agosto de 1925.
E, ele faz um balanço de sua longa existência, iniciando exatamente pela sua vocação missionária: “O ideal da minha vida, o voto que formulava desde a minha juventude, era o de ser missionário e mártir. Parece-me que este voto se cumpriu. Sou missionário com os cem e mais missionários que tenho em todas as partes do mundo” (pp. 1-2). Mártir, ele o foi através de suas provas dolorosas, algumas mesmo heróicas, de sua longa vida.
Embora ele se considere ‘o menor e o mais indigno de todos os fundadores’ (p. 2), cada dia une-se aos grandes santos, especialmente aos fundadores de Ordens e Congregações Religiosas porque, de uma certa forma, se sente unido ao seu ideal grandioso: “Conquistar o mundo para Jesus Cristo... Cada dia uno-me a todas estas almas. Gostaria de elevar o meu ideal a altura do deles. Amo ardentemente a Nosso Senhor e gostaria de promover o Reino do Sagrado Coração” (pp. 2-3).
Lembra, a seguir, aqueles que fundaram a Procura das Missões de Bruxelas; lembra Mons. Grison e outros missionários ‘vários dos quais deram generosamente a vida pelas missões. E lembra que só o fato de ir ao Congo mereceria já a honra do martírio’ (L.C. 381). Congo: O caminho da morte.
Durante a longa viagem ao redor do mundo (1910-1911), o Padre Dehon se interessa, de modo especial, pelo trabalho missionário. Na audiência particular de 11.04.1911 (Pio X), apresenta ao Papa um longo relatório, ressaltando vários problemas do apostolado missionário. Ele fala dos problemas do Canadá, Estados Unidos, China, Coréia, Manchúria, Filipinas, Ceilão (Sri Lança) e Índia (cf. Projet p. 311).
No final do último caderno do seu Diário (julho de 1925) encontramos ainda uma nota que recorda as missões: “No dia 06 de julho de 1897 partiam os primeiros missionários para o Congo. Esta missão foi a obra mais importante da Congregação, entre todas as obras de nosso apostolado” (p. 64).
Padre Dehon morreu como tinha vivido: “Por ele (Cristo) vivi, por ele eu morro. É meu tudo, a minha vida, a minha morte e a minha eternidade”.
Nosso Fundador cultivou o ideal missionário desde a juventude. Teve uma verdadeira vocação missionária, que não pôde realizar pessoalmente, mas a realizou nos muitos missionários de sua Congregação.
Já, como menino, costumava ler os Anais da Propagação da Fé e da Santa Infância. Ele escreve: “Sentia-me atraído para a missão com Nosso Senhor e pelo zelo para a salvação das almas... Desejava doar-me completamente; queria ser religioso e missionário” (NHV, I, p. 29).
Como jovem turista (21 anos), em sua viagem pelo Oriente, alegra-se com a abertura do Canal de Suez (1865), porque ‘ assim será mais fácil chegar às missões da Ásia’ (NHV, III, p.138).
Como Fundador tem uma grande predileção pelas missões, especialmente naqueles países onde o clima é mais desfavorável (por ex. o Congo), para realizar melhor o espírito da vocação dehoniana: ‘a profissão da imolação’. Carregando a Cruz de Jesus, salvam-se as almas (cf. Projet, pp. 273-274; 362; 415).
“É evidente que o Sagrado Coração de Jesus será honrado de forma mais perfeita, se o zelo pela sua glória se exercita em condições difíceis, como nas longínquas missões. Pratica-se, então, um ato de abnegação que é uma grande prova de amor para com Nosso Senhor” (LC, p. 163).
Duas formas de apostolado terminam por prevalecer na Congregação: as missões na própria pátria e no exterior. O Padre Dehon as aceita e confirma como uma indicação da Providência (cf. Projet, p.303).
Daí o empenho do Padre Dehon em cultivar muitas vocações missionárias. Em dezembro de 1910, escreve ao P. Adriano Guillaume: “Poderíamos fazer muito mais para a alegria de Nosso Senhor, se tivéssemos mais missionários no Congo, no Canadá, etc... Procurai muitas vocações, fazei os nossos jovens rezar muito para esta finalidade” (Projet, p. 448).
E, um ano antes (setembro de 1909), pensando nas exigências de pessoal para incrementar a missão no Congo, anota em seu Diário: “Seriam necessários vinte sacerdotes a mais” (hoje faltam muito mais).
Em julho de 1919, o Padre Dehon publica um noticiário, no qual exprime o seu grande sofrimento pela penúria das vocações missionárias, devido à primeira Guerra Mundial. Ressalta, no entanto, que a vocação missionária é muito viva na Congregação: “Um bom número dos nossos deseja levar o amor do divino Coração às terras de missão” (Projet, p. 395).
E, ele faz também todos os sacrifícios possíveis para enviar missionários ao Congo e Camarões.
Numa carta de junho de 1922, ele volta a falar da exigência de pessoal qualificado para as missões: “Rezai pelo nosso recrutamento. As nossas missões exigem tanto pessoal. Não queremos apenas o número mas, sobretudo, o fervor e a generosidade” (LC, p. 279).
E, em dezembro de 1923, repetia ainda: “Trabalhemos corajosamente pelas nossas missões e recrutemos muitos missionários” (LC, p. 285).
É a mesma preocupação de Cristo, e a mesma recomendação que fazia aos seus discípulos: “Então disse aos seus discípulos: A colheita é grande, mas os operários são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie operários para a sua colheita” (Mt 9, 37-38).
P. Francisco Sehnem, scj.
OS PRIMEIROS MISSIONÁRIOS DEHONIANOS NO BRASIL
Olá amigos(as) missionários(as), talvez vocês já estejam pensando: “esta é mais uma daquelas matérias chatas cheias de datas”. Pode até ser que seja, mais o objetivo da mesma é fazer com que todos aqueles que se interessam em conhecer ou, já são apaixonados (as) pela Missão Dehoniana Juvenil, conheçam também o cerne com que foi feito a cruz que vocês carregam no peito como missionários e missionárias, ou seja, as raízes e a história de nossa congregação, nossa Missão e seus primeiros missionários. É claro que todo esse conhecimento não estava gravado em minha bela memória, ele é fruto de pesquisa.
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Como diria o velho “sábio”: “começo, pelo começo.” Por aquele que contemplando o Coração de Jesus e ouvindo o pulsar deste mesmo Coração fundou a nossa Congregação. Padre João Leão Dehonnasceu em 14 de março de 1843 em La Capelle na França e ordenado sacerdote no dia 19 de dezembro de 1868. Após 10 anos de sua ordenação, depois de muitas inquietações e orações, fundou a Congregação dos Oblatos do Coração de Jesus, hoje, Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus isso em junho de 1878.
Era o século das luzes, o século XIX, o século da imigração porque foi neste século que cerca 60 milhões de pessoas emigraram para a América, sendo, aproximadamente, 6 milhões de alemães e destes, cerca de 150 mil emigraram para o Brasil. Após uma reunião do conselho consultivo junto com Padre Dehon em Bruxelas, decidiram assumir o projeto da Missão no sul do Brasil. Isso em 12 de março de 1903. Onde? Na Ilha do Desterro, hoje Florianópolis, Estado de Santa Catarina, cujo a diocese era a de Curitiba - Paraná. Um dos objetivos dessa missão era que os padres Alemães amparassem e orientassem os imigrantes em sua fé.
O padre Gabriel Jacó Lux (1869 – 1943) apresentado por padre Dehon ao seu conselho como um nome a ser o superior desta Missão, foi o escolhido, tendo como coadjutor o padre José Fidelis Foxius(1874 – 1931) recém ordenado. Com uma missa solene na casa missionária de Sittard, Holanda, após a costumeira sessão missionária, o padre Lux relatou as condições de vida, o clima e o povo que ele e o padre Foxius iriam encontrar , se despediram da Escola Apostólica e partiram para o Brasil.
Amigos (as) missionários (as), agora convido vocês para juntos acompanharmos um pouco da trajetória desses dois pioneiros. É uma Quarta feira, 17 de junho de 1903 às 6h da manhã; o navio é o Maceió.
Após quase trinta dias de travessia atlântica, a voz do missionário ecoou em terras Brasileiras: “hoje, domingo, 12 de julho de 1903, está prevista, diz a mensagem, a nossa chegada a Paranaguá. Daqui seguimos viagem com navio costeiro até Desterro. Realmente, lá embaixo, contra os longínquos azuis, observamos, através da luneta, os contornos sombreados do planalto paranaense. Lá situa-se Curitiba, a sede do bispado. Lá se encontra, pois a terra dos nossos anseios e de nosso destino. O vasto campo de nossas atividades. É de coração que te saudamos, ó Terra Brasileira! Nova Pátria dos Padres do Coração de Jesus!”[1]
O que sentiram esses missionários? O que se passava em seus corações? Para mim é grande emoção escrever sobre a saga desses homens de Deus é como se eu estivesse com eles nesta Missão. Nós que participamos da MDJ, sabemos da emoção que é ao chegarmos pela primeira vez a terra a ser missionada. O coração bate mais forte no peito, o sorriso arrebenta nosso rosto e os olhos se afogam nas lágrimas do sonho missionário se realizando mesmo com toda comodidade que temos hoje. Imaginem pois a emoção e sentimentos desses pioneiros à 101 anos atrás.
No dia 20 de janeiro de 1904 chegam ao Brasil mais três missionários para se juntar a padre Lux e Foxius, são eles: padre Timóteo Henrique Meller, padre João Basílio Stolte e irmão José Rafael Küppers. Em 31 dezembro deste mesmo ano chegaram os padres: Herinque Canísio Lindgens, Francisco Damasceno Schüler e Antonio Amando Wollmeiner. Meu Deus! como deveria ser bom e ao mesmo tempo desafiante, difícil! Desbravar as matas, conhecer a língua, organizar as colônias e criar comunidades. Só o Coração de Jesus poderia impulsionar esses homens e ao mesmo tempo lhes conferir a paz do repouso nas noites em meios a bicharada e enxugar as lágrimas que rolavam devido a saudade dos parentes, dos confrades, dos amigos e da pátria amada.
No ano seguinte, 1905 no dia 29 de novembro chegaram os missionários professores vindo de Sittard – Holanda. São eles: padre Bernardo Wilibaldo Jonkmanm, padre José Apolonário Rogmanm,padre Guilherme Thoneick e irmão João Eusébio Kamphausen. Todos os missionários citados neste artigo, assumiram os mais diversas frentes de trabalho como: educação (escolas), pastoral (paróquias, capelas), construção cívil e administração (seminários, hospital e igrejas). Pode ser coincidência, mas são 12 o número dos primeiros missionários dehonianos que vieram nesta época para o Brasil. Todos inspirados e enviados pelo nosso fundador padre João Leão Dehon.
No dia 4 de julho de 1906 a Santa Sé aprovou definitivamente a Congregação e suas constituições. Neste mesmo ano padre Dehon realizou seu sonho de visitar seus filhos missionários no nordeste e no sul do Brasil. Esta viaje, que com certeza não foi tão fácil, devido os meios de locomoção que bem sabemos eram os mais rústicos e desconfortáveis, ficou gravada na mente do padre Dehon. Imaginem ter que andar vários dias a cavalo ou em carroças, em estradas todas esburacadas. Sobre isso, ele escreveu: “a estrada Dona Francisca ficará por muito tempo gravada em minha memória. Necessito de vários dias de repouso...estou moído da viagem e me arrasto com dificuldade durante alguns dias.”[2] Com sua obra já bem desenvolvida e solidificada morreu no dia 12 de agosto de 1925 em Bruxelas – Bélgica.
Ao padre Dehon e a todos esses corajosos pioneiros rendemos nossas homenagens e pedimos que olhem por nós pequenos missionários dehonianos do Brasil e do mundo. Alegremo-nos queridos (as) missionários (as) pois em breve veremos nosso pai fundador beatificado e não tardará muito, como santo. Para que isto aconteça, mobilizemos nossos grupos missionários, nossas paróquias e comunidades com eventos, celebrações e muita oração.
Um cordial e fraterno abraço no Coração de Jesus,
Fr. Simão Pedro dos Santos, scj
Fonte:
Schmitt, José Francisco, Dehonianos no Sul do Brasil, 100 anos de presença e missão 1903 – 2003.
Dehonianos. São Paulo, 2003
Schmitt, José Francisco, Dehonianos no Sul do Brasil, 100 anos de presença e missão 1903 – 2003.
Dehonianos. São Paulo, 2003
O RELIGIOSO DEHONIANO DA AMÉRICA LATINA Nas origens do cristianismo da América Latina temos a presença e a dedicação de muitos religiosos que fizeram da evangelização dos novos povos o sentido de suas vidas. Foram numerosos os que dedicaram toda a sua vida – e muitos de forma heróica – para conquistar para a fé de Cristo as terras de América Latina, entre os quais devemos recordar de modo particular S. Francisco Solano, S. Pedro Claver, S. Luís Beltrán e o Beato José de Anchieta. |
Foram outros tempos e talvez outros os métodos de evangelização. Mas a vida consagrada esteve presente desde o início da evangelização com sua entrega e fidelidade ao Evangelho. A América Latina deve muito de sua fé a tantos e tantas consagrados/as que deram a sua vida a serviço do Evangelho. A maioria de seus nomes permanece no anonimato, mas continuar e completar sua obra hoje e no futuro é continuar uma história que é de Deus e que convoca a todos nós.
Temos que reconhecer também, com toda simplicidade e coragem, que a vida consagrada, na América Latina esteve por vezes unida a elementos que obscureceram a sua presença: falta de inculturação com a conseqüente imposição de mentalidades e estilos de outras latitudes, proximidade, em alguns casos , dos poderosos, mais transmissão de ritos e devoções do que da fé que adora a Deus em espírito e verdade, mais um grande esforço de boa vontade do que análise profunda, a partir do Evangelho para transformar a realidade em busca de um mundo mais justo e fraterno.
Contudo, devemos reconhecer a presença, em geral positiva,dos religiosos em toda a história da América Latina. Os frutos de seus trabalhos são visíveis em todos os lugares e durante estes já mais de 500 anos de história. É de justiça reconhecer a presença e o dinamismo de tantas pessoas consagradas que na América Latina dedicaram e ainda dedicam sua vida a missão evangelizadora. Podemos dizer com Paulo VI: “Encontramo-los, não raras vezes, na vanguarda da missão e enfrentando os mais graves riscos para a sua santidade e sua própria vida. Sim, é verdade, a Igreja lhes deve muito, muitíssimo” (EN 69).
Nós chegamos um pouco mais tarde, em 1888. Mas também já fizemos uma longa caminhada com a Igreja da América Latina, ao lado de tantos irmãos e irmãs consagrados/as.
Nos últimos anos, vários acontecimentos levaram os dehonianos da América Latina a refletir sobre o passado, o trabalho realizado e, principalmente a buscar novos caminhos de evangelização, juntamente com toda a Igreja da América Latina. Lembramos o centenário da Congregação, o centenário da vinda dos primeiros missionários à América Latina, o centenário da vinda dos nossos padres ao norte do Brasil e agora ao sul do Brasil. Aconteceram tantas coisas e foram muitas as oportunidades de reflexão e revisão, como a Conferência Geral de Brusque, o Seminário “Ir ao Povo”, no Chile, o Seminário Latinoamericano de Inculturação do Carisma Dehoniano, em Luján (Argentina), A Conferência Geral do Recife...
Devemos recordar ainda as reuniões anuais dos Superiores da América Latina, vários encontros de Formação Permanente, encontros de Pastoral Vocacional, encontros dos formadores, dos responsáveis por Justiça e Paz, etc. Temos ainda muita literatura (livros, revistas, folhetos), trabalhos realmente bons de nossas comissões de espiritualidade e outras, como também de vários de nossos religiosos (P. Primo Corbelli, P. Egídio Driedonkx). O Centro Generale Studi SCJ de Roma publicou todo o conteúdo do Seminário de Luján (STD 42).
Temos já um longo caminho feito. Agora a Congregação nos convida a uma nova reflexão, em preparação ao próximo Capítulo Geral. A partir de nossas reflexões sobre o Padre Dehon, sobre a história da Congregação e, de modo especial, a partir de nossa história latinoamericana e da mística da solidariedade, somos levados a perguntar-nos como o Carisma e a Espiritualidade Dehoniana deveriam ser vivenciados na América Latina, ou seja, poderíamos tentar descobrir quem é o religioso dehoniano da América Latina.
A AMÉRICA LATINA PEDE-NOS UM NOVO MODO DE SER
A GS, que nos diz que Cristo amou com coração de homem, começa com estas palavras: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens do nosso tempo, sobretudo dos pobres e daqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo, e nada há de verdadeiramente humano que não encontre eco em seu coração”.
Na linha da GS e a partir da nossa realidade latinoamericana, tentaremos perguntar-nos sobre a nossa fidelidade dinâmica à graça especial recebida por Padre Dehon. Cabe-nos, hoje, encarnar e personificar a misericórdia do Pai e fazer com que todos os homens e mulheres, sobretudo os que sofrem e vivem ameaçados, sintam o seu Deus muito próximo.
Com Leão Dehon somos convidados a voltar o nosso olhar para o Cristo transpassado na Cruz. Ele é o símbolo máximo da doação até o fim. “Crer no Cristo Crucificado significa crer que o amor está presente no mundo e que este amor é mais forte do que toda a espécie de mal em que o homem, a humanidade e o mundo estão envolvidos” (DM, 7).
Com Leão dehon, queremos também voltar o nosso olhar para a Igreja e o homem da América Latina. É uma questão de fidelidade. Leão Dehon tinha o olhar voltado para o Coração de Cristo e para a Igreja e os homens do seu tempo (sobretudo da França – onde vivia e exercia o seu apostolado). Nós dehonianos da América latina somos convidados a ter um olhar voltado para o Coração de Cristo e um olhar para este mundo concreto em que vivemos.
Assim, a contemplação de Cristo, para nós revelação e personificação do amor misericordioso do Pai, deve levar-nos, não mais, a tornar-nos estranhos neste mundo ferido pela injustiça, mas a mergulhar neste mundo de maneira empenhativa, sabendo, porém, que toda tentativa de transformação deste mundo ficará estéril ou pelo menos superficial e efêmera, até que o coração do mundo não tiver sido re-curado mediante a descoberta do Coração de nosso Deus.
Por isso, uma de nossas preocupações será levar aos homens e às mulheres da América Latina a nossa espiritualidade centrada no Coração de Cristo. Não podemos ignorar o papel que o Magistério da Igreja sempre atribuíu à “devoção ao Sagrado Coração” na renovação espiritual e social, a qual não será alcançada sem tocar o coração do homem, se quisermos pensar numa mudança de mentalidade e de sentimentos que leve à reconstrução de um autêntico relacionamento inspirado no mandamento do amor a Deus e ao próximo.
E nós, religiosos dehonianos da América Latina, não podemos esquecer que o momento atual é muito sensível à ligação entre evangelização e promoção humana, também por uma questão de fidelidade ao modo de ser e de agir do Padre Dehon. Além disso, o tema da libertação e da solidariedade fraterna guia as iniciativas da América Latina, inclusive fora do mundo cristão. Tudo isso parece indicar um caminho a seguir, um estilo de vida e de pastoral. E nós, religiosos da América Latina, seremos aqueles homens que acreditam no amor, que acreditam realmente que o Coração de Cristo foi plasmado para chegar a ser o Coração do mundo, isto é, para recriar as atitudes profundas (que o coração reclama) de abertura, de encontro, de doação recíproca, que é o caminho da reconciliação e da comunhão.
Tudo isso será possível, na medida em que nós formos sinais evidentes das atitudes do Coração de Cristo. A misericórdia deverá tornar-se o critério fundamental e único na pregação, na administração dos sacramentos, no diálogo pessoal, na orientação da comunidade e, de modo especial, no Sacramento da Reconciliação. A misericórdia rejeita as sentenças sumárias e apressadas, não permite que rejeitemos um irmão/ã que se aproxima de nós, mesmo que ele (ela) tenha suas falhas ou esteja numa caminhada diferente da nossa.
A nós, dehonianos, pede-se, dia após dia, um suplemento de paciência e de compreensão, porque o nosso povo, sofrido e pecador, tem direito de receber de nós uma imagem transparente do Pai, o qual “faz nascer o sol sobre os bons e os maus e faz chover sobre os justos e os injustos” (Mt 5, 25).
Essa é a nossa maravilhosa vocação e é disso que têm necessidade – sobretudo hoje – aqueles que vêm a nós para buscar aquilo que o mundo não conhece e nem pode dar-lhes: o amor, o perdão, a reconciliação, a justiça e a misericórdia, a paz e a alegria.
Jesus continua a nos mandar “como ovelhas entre os lobos” (Mt 10, 16), mas proíbe-nos (não combina com a nossa espiritualidade) descer ao nível dos lobos e combater com as suas armas de poder, de força e de vingança. Nossa espiritualidade pede-nos total disponibilidade aos irmãos e solidariedade efetiva com nossos irmãos sofredores e pecadores. Mas, na luta pela justiça, na luta em favor dos pobres, a nossa força será a fraqueza da pobreza, da mansidão e do amor. Poderíamos dizer que o religioso dehoniano da América Latina vive em profundidade o abandono e a oblação, por uma vida de total disponibilidade e solidariedade; é um homem enamorado pela pobreza, que luta pela justiça com mansidão e amor.
É nessa maravilhosa aventura que o Senhor nos envolve. É sobre esse caminho que somos convidados a prosseguir, porque é o mesmo caminho que Jesus “manso e humilde” percorreu.
Nossa missão, na América Latina, será testemunhar a misericórdia para construir a comunidade, o Reino do Coração de Cristo, lá onde o amor e a justiça estão mais ausentes: lá onde se sentem mais as conseqüências do ódio, da injustiça e da opressão.
UM MODO DE SER DEHONIANO QUE NOS LEVA A AGIR
A partir das orientações apostólicas do Carisma Dehoniano, da realidade latinoamericana e das tendências da vida consagrada na América Latina, tentaremos entender melhor a nossa missão.
A consagração religiosa, enquanto tal, é já missão em relação aos homens. Ela tem por si mesma uma fecundidade apostólica. Como todo carisma, também o nosso carisma de profetas do amor de Cristo põe-nos a serviço da missão salvífica do povo de Deus, no mundo de hoje, lá onde nós vivemos (América Latina > cf. LG 12 e Cst 27).
Parece-nos, por isso, conveniente retomar os principais aspectos de nossa espiritualidade SCJ, para saber de que maneira poderemos concretizar, em nossa vida de cada dia, nosso compromisso apostólico.
a) Um apostolado de amor e de reparação. Sabemos que a caraterística mais profunda do pecado é a falta de amor, que impede o nosso relacionamento com o Pai e com os irmãos.
Assim, entendemos a reparação, antes de tudo, como uma acolhida do Espírito do Amor (1 Ts 4, 8), como resposta ao amor de Cristo por nós, comunhão ao seu amor pelo Pai e pelos irmãos e, ainda, a cooperação com a sua obra redentora no mundo em que vivemos (cf Cst 23). Neste sentido, é necessário – na América Latina – associá-la estreitamente aos valores da libertação e da solidariedade que têm uma repercussão social muito forte e uma carga profética muito intensa sobre o nosso continente.
b) Um apostolado do Ecce Venio – da disponibilidade total. O Ecce Venio define a atitude fundamental de Cristo e deverá definir também a atitude fundamental de nossa vida; faz da obediência um ato de oblação, configura a nossa existência com a de Cristo, para a redenção do mundo e para a glória do Pai (cf. Cst 58; Hb 10,7).
Lembramos ainda que o nosso povo (especialmente os pobres) é muito disponível e também sensível à atenção e à disponibilidade dos seus pastores. Além disso, a disponibilidade é absolutamente necessária para que possa haver solidariedade.
c) Apostolado do Sint Unum. Para corresponder à nossa vocação, deixamo-nos invadir pelo amor de Cristo e atendemos ao seu pedido: “Pai, que todos sejam um” (Jo 17, 21 > cf. Cst 63).
Nossas comunidades tornar-se-ão autênticos “lares” de vida evangélica, especialmente pelo acolhimento, pela partilha e pela hospitalidade (não só com os de fora – também e em primeiro lugar – pela acolhida, partilha de vida e de bens, de fé, hospitalidade em relação aos irmãos de comunidade. Nossos irmãos de Congregação, de comunidade devem sentir que nós os acolhemos e amamos).
Este será o nosso testemunho numa América Latina com tantas divisões, explorações, sofrimentos, ausência de amor, de fraternidade, de partilha. Aqui fica mais claro que a nossa vida comunitária é já missão.
Ao ver nosso testemunho, nossos irmãos e irmãs latinoamericanos poderão crer no seu Deus e Pai; crer num Deus que os ama e está muito próximo deles, que sofre com eles, que caminha com eles. “Pai, que todos sejam um, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo 17, 21).
d) Um apotolado eucarístico. “Por nossa celebração eucarística, unidos a toda a Igreja, na memória e na presença do Senhor, acolhemos Aquele que é a razão de nossa vida comum, Aquele que nos consagra a Deus e nos envia, sem cessar, pelas estradas do mundo, a serviço do Evangelho” (Cst 82).
Na adoração, intimamente ligada à celebração eucarística, meditamos as riquezas deste mistério da nossa fé, para que a carne e o sangue de Cristo, alimento de vida eterna, possa penetrar em nós e transformar profundamente as nossas vidas.
Queremos, assim, corresponder também a uma exigência de nossa vocação reparadora e desejamos alcançar uma união mais profunda com o sacrifício de Cristo, para podermos ser, com Ele, os servidores da reconciliação dos homens entre si e com o Pai (cf. Cst 83).
Sabemos que a espiritualidade do Padre Dehon, principalmente sua espiritualidade reparadora, esteve sempre centralizada na Eucaristia. Essa é também o nosso ponto de partida e de chegada, nossa força, nosso alimento. No encontro com o amor de Cristo, na Eucaristia, acontecerá a transformação do nosso coração. Na Eucaristia nós somos transformados. Aos poucos, nosso coração será um coração novo, um coração aberto, semelhante ao Coração de Cristo. E a sua abertura se manifestará na silenciosa e discreta ajuda aos nossos irmãos; levar-nos-á a servir os irmãos, ao trabalho nas organizações de assistência, de promoção humana, de conscientização e de libertação.
A Eucaristia é a mensagem mais perigosa, mais revolucionária da Igreja. Aquele que entende a Eucaristia e, assim mesmo, decide tomar parte nela, não pode mais ficar parado. A Eucaristia nos compromete. Aqui Cristo deixou-nos toda a sua redenção (a obra de restauração do homem), e Ele mesmo quis ficar para esse encontro fraterno. Aqui nos tornamos irmãos, formamos comunidade porque, em Cristo, nos encontramos e nos tornamos um.
Na Eucaristia se forma o apóstolo do Coração de Jesus. Nós que participamos do banquete da vida eterna, em meio a nossos irmãos e irmãs latinoamericanos, precisamos perguntar-nos sobre as conseqüências desta nossa participação, deste nosso encontro com Cristo, presença do amor misericordioso na Eucaristia.
É possível encontrar Cristo e não encontrar os irmãos? Nós que participamos do mesmo pão, podemos deixar alguém fora do banquete da vida, do banquete do amor? Que estilo de vida deve ter alguém que se diz profeta do amor e ministro da reconciliação, após o encontro com o Senhor e os irmãos/ãs na Eucaristia?
e) Um apostolado solidário. A resposta às perguntas acima talvez seja uma solidariedade efetiva com os irmãos/ãs. “A exemplo de Cristo, também devemos viver em solidariedade efetiva com os homens. Sensíveis ao que, no mundo de hoje, constitui obstáculo ao amor do Senhor, queremos testemunhar que o esforço humano, para chegar a plenitude do Reino, deve ser incessantemente purificado e transfigurado pela Cruz e Ressurreição do Cristo” (Cst. 29).
A solidariedade será o desdobramento da vida de oblação, uma forma concreta de viver a nossa oblação no relacionamento com esse mundo em que vivemos e com os nossos irmãos latinoamericanos (sempre na e pela união à oblação de Cristo, presente na vida dos homens). Pensando em nossa realidade concreta, essa solidariedade significa presença, atenção, partilha, colaboração, participação, corresponsabilidade e comunhão de vida e de destino.
Nossa vida de oblação (disponibilidade na solidariedade e solidariedade na disponibilidade) será, para nós, o estímulo que nos manterá sempre ativos e interessados na recriação, na restauração do homem latinoamericano e do nosso continente, de toda a sociedade, das relações segundo o Coração de Cristo.
Leão Dehon queria construir o Reino do Coração de Cristo nas almas e nas sociedades. E, bem antes dele, Leão magno já dizia que Deus vem restaurar o homem, em sua misericórdia e bondade salvíficas. Deus quer restaurar, quer re-criar o homem, e isto porque é misericordioso. E essa misericórdia se revelou em Cristo que se encarnou, veio participar de nossa sorte, fez-se solidário conosco. E, hoje, nós somos chamados a ser essa encarnação do amor misericordioso para os nossos irmãos/ãs da América Latina.
Hoje, quando afirmamos que misericórdia é o novo nome do Coração de Cristo, quando afirmamos que, no Coração de Cristo, o amor misericordioso do Pai se torna objeto de nossa experiência, nós que decidimos jogar toda a nossa vida numa espiritualidade do Coração de Cristo, somos convidados a unir o nosso destino ao dele - e, junto com Ele, ser presença da misericórdia do Pai para nossos irmãos todos, pricipalmente para aqueles que mais precisam: os marginalizados, os empobrecidos, os pecadores, os doentes, os índios, os negros, os desempregados, os analfabetos, todos os que sofrem, os que não encontram mais um sentido para a sua vida. Em todos eles, junto com Cristo, tentaremos reconstruir a imagem de Deus (o projeto original de Deus).
Aqui todas as nossas discussões teológicas tornam-se secundárias e vão adquirindo novo sentido certas palavras antigas, como amor, reparação, oblação, abandono, ecce venio, ecce ancilla, fiat, sint unum, profetas do amor, ministros da reconciliação, disponibilidade, hospitalidade, solidariedade...
f) O apostolado do “Adveniat Regnum Tuum. Pela nossa maneira de ser e de agir, pela nossa participação na construção da cidade terrestre e na edificação do Corpo de Cristo, devemos manifestar que é preciso procurar, antes de tudo, o Reino de Deus e a sua justiça” (Cst 38).
g) Um apostolado mariano. Maria, a Mãe de Jesus, está intimamente associada à vida e à obra redentora de seu Filho. Mãe da Igreja, por sua maternal intercessão, assiste a todos aqueles que, empenhados numa missão apostólica, trabalham para a regeneração dos homens (cf. LG 65). “Pelo seu ecce ancilla, estimula a nossa disponibilidade na fé e é modelo perfeito de nossa vida religiosa” (Cst 85).
Para ser fiéis à herança do Padre Dehon e ao povo latinoamericano, é preciso que Maria esteja fortemente presente em nossa vida e em nosso apostolado.
A Dives in Misericordia apresenta Maria como a Mãe da Misericórdia (DM 9). E, para nós, misericórdia é o novo nome e o nome mais apropriado para o Coração de Jesus, em nossos dias e na realidade da América Latina. João Paulo II fala da misericórdia (DM) como de um mistério que deve ser acolhido e que está aberto à participação. Parece-me que aqui poderemos reencontrar a nossa vocação e missão na América Latina. E, nesta perspectiva, nossa vida e nosso apostolado deverão ser profundamente marianos, já que ela mostra de maneira luminosa o caráter cordial (cor) do acolhimento e da participação exigidos por este mistério (cf. DM 9).
UM AGIR DEHONIANO DECORRENTE DE NOSSO MODO DE SER
O apostolado do amor e da reparação, do ecce venio, do sint unum, eucarístico, solidário, do adveniat regnum tuum e mariano, nascido da essência mesma do Carisma Dehoniano, deverá informar toda a nossa ação apostólica na Igreja e no mundo (para nós, no mundo e na Igreja da América Latina).
A essa missão, dentro do espírito de amor e de oblação, pertencem a adoração eucarística, o ministério entre os pequenos e os humildes, entre os operários e os pobres, para anunciar-lhes a riqueza insondável que é Cristo, para sermos realmente solidários com eles e conduzi-los a uma libertação integral.
Junto com o Padre Dehon, a seu exemplo, ajudaremos os pobres, os pequenos e humildes, os operários a tomar em suas mãos o seu destino e lutar por uma libertação total (cf. Cst 31 e Bartolomeu Sorge, SJ, in “Incontro SCJ”, jan. 1978).
Com relação a este ministério, Padre Dehon sempre deu uma grande importância à formação do clero e dos religiosos. A atividade missionária foi para ele uma forma privilegiada de serviço apostólico. Isso parece importante também para nós. Para transformarmos a América Latina, talvez nós dehonianos devêssemos ajudar na formação e santificação do clero e dos religiosos/as para que sejam capazes de presidir essa transformação. A herança do Padre Dehon é também um convite muito claro a criar um verdadeiro espírito missionário e encontrar novos caminhos para as missões, em nossos países da América Latina e como América Latina.
EM BUSCA DE UMA IDENTIDADE
Para traçar um “perfil” do religioso dehoniano da América Latina e “definir” o seu modo de agir, precisamos – além de uma séria reflexão sobre nós mesmos e nosso Carisma – levar em consideração as tendências da vida consagrada na América Latina.
Como início de reflexão e como provocação para um maior aprofundamento do tema (neste tempo em que estamos a caminho de um Capítulo Geral), parece-me necessário lembrar que o nosso Carisma Dehoniano e as tendências da vida consagrada na América Latina pedem de nós: